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    Manifesto dos Povos e Lideranças Indígenas do Brasil – Mais pajés, menos intolerância

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    Mais pajés, mais Céu, mais espíritos, mais floresta, mais vida. Menos ódio. Menos intolerância. Menos racismo. Precisamos superar a impossibilidade de conviver em igualdade nas nossas diferenças, e passar a partilhar o mundo com outros seres vivos, outros viventes, viver e se olhar e se reconhecer no olhar do outro, com reciprocidade, com respeito aos humanos e respeito também aos não-humanos, uns ao lado dos outros, vivendo juntos em nossas diferenças. Existe apenas um planeta, e todos podemos viver nele, livres do peso do racismo e do sexismo. Existem muitos mundos que convivem nas diferentes formas de habitar este planeta.
    Durante muitos séculos, os pajés equilibram a vida na Terra. Com seus cantos, rezas, curas e sabedoria, massageiam o Planeta proferindo lindas palavras, as mais belas palavras sagradas. São médicas e médicos, rezadoras e rezadores, curandeiras e curandeiros, sabedores do mundo, com suas próprias ciências e sua filosofia.
    Em nome de um deus, homens missionários agrediram nos últimos séculos muitas outras formas de vida. Se nos anos 1970 a própria Igreja admitiu sua violência catequista, esse processo não arrefeceu. Assistimos hoje ao crescimento de novas cruzadas de intolerância, sobretudo de missões protestantes. Se aliam com os inimigos dos povos indígenas para deles extraírem suas almas. O etnocídio que visa esvaziar todos os corpos de suas espiritualidades. O genocídio matou os povos em seus corpos físicos e o etnocídio em seu espírito, sua essência, sua forma de viver, que é a sua cultura.
    Alguns leem na Bíblia a mensagem para invadir o mundo inteiro para forçadamente pregar o evangelho para todas as criaturas, entendendo que quem não se converter irá arder no inferno que essa própria religião inventou. Essa corrida colonial provoca ainda hoje, talvez como nunca antes, uma disputa por almas que esconde poder, dinheiro, controle de territórios, mercados de almas.
    Hoje atravessamos muitas crises, ecológica, econômica, política, a nossa frágil democracia foi atacada e os territórios indígenas estão sendo invadidos e saqueados. Junto com o ferro e o fogo, vem a conversão racista. Trocam as rezas pela bíblia e as medicinas por aspirinas. Epidemias de depressão provocam os maiores índices de suicídio do mundo manchando de sangue as lindas florestas do Brasil.
    Os espíritos da floresta estão bravos, pedindo socorro, pois cada árvore derrubada, cada rio contaminado, faz com que desapareçam. Assim disse um sábio pajé, a floresta é um portal cristalino, e todos nós humanos precisamos dela. Se acabar a floresta, também acabará nosso espírito. Os pajés precisam existir, e para existir, precisam ser respeitados. Antes que seja tarde demais, que o mundo esteja esvaziado de espiritualidade e o Céu caia sobre nossas cabeças!
    Basta de etnocídio! Mais pajés! Menos intolerâncias!

    Assinam essa carta manifesto as seguintes organizações e lideranças :

    Organizações
    Associação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
    Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira -COIAB /
    Associação Aty Guassu Guarani Kayowá
    Comissão Yvy Rupa
    Conselho dos Povos Indígenas de São Paulo -CEPISP
    Federação do Povo Huni Kuî do Acre – FEPHAC
    Instituto Maracá
    Fórum dos professores indígenas do Estado de São Paulo, FAPISP
    Organização Nhandepa Guarani e Huni Kuî
    Rádio Yande
    Rede de Memória e Museologia Indígena
    ARPIN Sul
    ARPIN Sudeste
    APOINME
    FEPIPA

    Lideranças
    Aílton Krenak
    Álvaro Tukano
    Alberto Terena
    Chicão Terena
    Davi Yanomami Kopenawa
    Daiara Tukano
    Denilson Baniwa
    Dinaman Tuxá
    Ninawa Huni Kuî
    Nara Baré
    Carlos Papá Mirim Poty
    Cristiane Takuá
    Genito Gomes Kayowá
    Marcos Tupã
    Antonio Carvalho
    Júlio Garcia Karai Xiju
    Nelson Ribeiro
    Marcos Moreira
    Mauricio da Silva Gonçalves
    Sama Hani Kuî
    Sônia Guajajara
    Banima Hani Kuí
    Davi Popygua
    Joana Munduruku
    Benício Pitaguary
    Paulo Karai
    Rosa Pitaguary