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    Opinião: Juiz de Garantias , por Levi Bezerra 

    Por Levi Bezerra

    O Pacote Anticrime (Lei nº. 13.964/2019) trouxe inúmeras alterações e inovações na Legislação Penal e Processual Penal e, dentre elas, está o Juiz de Garantias, instrumento processual penal previsto no art. 3º-A e seus consectários do Código de Processo Penal, tendo a seguinte responsabilidade dentro da ritualística processual penal:

    “Art. 3º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente (…)”.

    O pacote anticrime foi proposto pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro, auxiliado por uma comissão de juristas. Entretanto, o texto original sofreu inúmeras modificações no Parlamento. Inclusive, o instituto do Juiz de Garantias é oriundo de uma emenda feita pelo então Deputado Federal Marcelo Freixo. Após votação e aprovação do texto final pelo Congresso, o ex-presidente, Jair Bolsonaro, vetou inúmeros dispositivos da lei aprovada, sancionando o instrumento em questão.

    Promulgada a lei, o referido instituto foi suspenso pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, em janeiro de 2020, sob diversas alegações, sendo as principais, que existiria vício de iniciativa e que inexistia previsão orçamentária para execução do novo instrumento processual. Após 3 anos, a Ministra Rosa Weber pautou o processo para julgamento no dia 24 de maio do corrente ano. Nesse interregno, ocorreram diversas audiências públicas, reuniões entre Poderes e diversos órgãos foram instados a se manifestar, restando o feito maduro para julgamento.

    No que tange às questões jurídicas que envolve o Juiz de Garantias, tecerei alguns comentários. Particularmente, vejo esse instituto com bons olhos, pois trará maior imparcialidade aos julgamentos e garantirá a todos os cidadãos a salvaguarda dos direitos individuais, pois independentemente da ação cometida ou de circunstâncias pessoais, todos somos detentores de direitos fundamentais que devem ser observados durante o processo investigativo (fase pré-processual) e a instrução/julgamento (fase processual), para que ao final, de fato, consigamos fazer justiça.

    Sobre os fundamentos utilizados para suscitar a inconstitucionalidade da lei, tenho as seguintes impressões: 1) Não há vício de iniciativa, pois compete ao Congresso Nacional dispor sobre todas as matérias de competência da União, dentre elas, o Direito Penal e Processual Penal, nos termos do art. 22, inciso I e art. 48, ambos da Constituição Federal; 2) Suposta violação do princípio do Juiz Natural é uma alegação meramente retórica, pois esse instituto processual recai apenas sobre uma das fases do processo, permanecendo as competências em razão do lugar, matéria e pessoa; 3) Também não há violação ao princípio da igualdade, pois dentro dos tribunais podem ser designados membros que cuidarão especialmente desse instituto; 4) No que tange à dita necessidade de criação de cargos ou despesas sem fonte de custeio prevista, ressalto que não vejo o Juiz de Garantias como um cargo. No entanto, a sua implantação, conforme os termos da lei, trará aos tribunais a necessidade de dois magistrados por comarca, haja vista que nas situações de flagrante, a lei determina a apresentação pessoal, vedado o emprego da videoconferência. Especialmente neste ponto, vejo que o legislador impôs uma condição difícil de ser cumprida, sendo este causídico favorável a utilização da videoconferência para essas situações de flagrante; 5) Sobre a questão da retroatividade penal, o Código de Processo Penal prevê aplicação imediata e, particularmente, não vejo isso como um problema, pois em caso de impedimento, as Varas possuem os Juízes substitutos; 6) Sobre a proporcionalidade para implementação, não é mais empecilho, pois já se passaram mais de três anos da promulgação da lei, ou seja, tempo suficiente para uma organização administrativa dos Tribunais para implemento do instituto; 7) Sobre a duração razoável do processo, o instituto trará maior celeridade aos procedimentos investigativos, pois em alguns casos, se o Inquérito Policial não for concluído no prazo estabelecido, a prisão será relaxada.

    A constitucionalidade do instituto será decidida pelo Supremo Tribunal Federal, cujo julgamento está previsto para iniciar no dia 24 de maio de 2023. Espero que não tenha pedidos de vistas, pois esse período de suspensão foi tempo mais que suficiente para a análise de todas as questões que cercam esse importante instituto processual.

    ☆☆ Levi Bezerra  é  advogado,  ex procurador  jurídico  do município de Cruzeiro do Sul,  ex gestor  do Núcleo  DP IMAC  de Cruzeiro  do Sul e pós-graduando em Direito  Público.