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    Como a guerra entre facções pode interferir no programa 1001 Dignidades em Rio Branco

    Por Ecos da notícia

    Um dos principais problemas de Rio Branco, capital e cidade mais populosa do Acre, com mais de 364 mil moradores, é o déficit habitacional. Estima-se que a falta de moradias chegue a 11 mil casas, o que representa mais de 45% da falta de casas em todo o estado, presumida em um déficit de 24 mil unidades habitacionais.

    O problema da falta de um lugar seguro para morar tem se agravado, já que existe uma parcela significativa da população que, apesar de ter uma moradia, reside em uma área de risco e corre perigo devido à onda de violência crescente.

    Além disso, um levantamento do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) aponta a existência de 6.534 edificações em risco em Rio Branco, com quase 27 mil pessoas moradoras de diversos bairros da capital acreana que podem ser atingidas por desmoronamento de terra.

    Uma das apostas para diminuir o déficit habitacional dessa população foi anunciada pela prefeitura e batizada de Projeto 1.001 Dignidades. A proposta do prefeito Tião Bocalom é entregar 1.030 unidades habitacionais em maio de 2024 para famílias de baixa renda que moram em áreas vulneráveis e/ou de risco social. A promessa é de construir casas populares pré-fabricadas em madeira.

    Nas últimas semanas, Bocalom estampou sorrisos no rosto ao apresentar o protótipo da unidade habitacional. O ac24horas divulgou com exclusividade na última semana quais bairros serão contemplados e a quantidade de casas que devem ser construídas em cada um deles.

    Conforme a prefeitura de Rio Branco, serão beneficiados oito bairros da capital acreana. Em três deles, Loteamento Santo Afonso, Loteamento Rosa Linda e Loteamento Rosa Linda III, serão construídas 852 casas, o que representa mais de 83% das 1.030 residências que serão levantadas. Os outros bairros beneficiados são loteamentos Juarez Távora, Loteamento Vale do Carandá, Loteamento Bom Sucesso e Lagoa Tucumã.

    Desde o início da apresentação do Projeto 1.001 Dignidades, a prefeitura declara que já possui o recurso necessário para a execução da obra. Com o protótipo apresentado e a grana no “bolso”, a equação parece simples, bastando selecionar as famílias que mais precisam, preparar os terrenos nos bairros que vão receber as casas, construir as unidades habitacionais e entregar à quem mais precisa.

    Mas é exatamente na escolha de quem receberá as casas que surge uma outra realidade da capital acreana, tão presente quanto o déficit habitacional, que é a guerra entre facções criminosas que delimita territórios e impõe restrições à quem mora em determinadas regiões de Rio Branco.

    Ao longo dos últimos anos, Rio Branco ganhou as páginas policiais por conta do número de mortes resultantes da guerra entre os grupos criminosos que disputam a hegemonia sobre o tráfico de drogas. A capital acreana já foi apontada em anos recentes com o maior aumento no número de homicídios entre todas do país.

    Mas o que uma coisa tem a ver com outra? Infelizmente, apesar dos esforços das forças de segurança, a guerra entre as facções criminosas ainda é algo latente, principalmente, para quem vive nas periferias de Rio Branco.

    Uma das principais características dessa guerra que ocasiona a morte de jovens com frequência é a demarcação de território e, por mais que as autoridades neguem, é um dado que precisa ser considerado no momento da distribuição das unidades habitacionais para quem será beneficiado.

    Exemplo: a preocupação de moradores que vivem numa área dominada por uma facção, e serem levados para outro bairro dominado por outro grupo criminoso ficou evidente durante o período em que as pessoas retiradas da região da Terra Prometida, no Irineu Serra, ocuparam a entrada da Assembleia Legislativa do Acre (Aleac). Diversos moradores declararam que não aceitavam serem encaminhados ao Parque de Exposições, como era proposto pelo governo do estado, exatamente pelo fato de as regiões serem controladas por facções rivais.

    A reportagem do ac24horas levantou que existe já a preocupação com ameaças sofridas por alguns moradores beneficiados com a entrega de 8 sobrados geminados, no loteamento Santo Afonso, entregues pela prefeitura há cerca de um mês.

    O que diz o poder público

    A prefeitura de Rio Branco, apesar de enfatizar que não tem responsabilidade sobre a segurança pública, reafirmando que a atribuição é do estado, deixa claro que se preocupa, sim, com o assunto. Por meio de sua assessoria, o prefeito Tião Bocalom declarou que buscará selecionar moradores já da própria área para evitar problemas.

    “Estamos construindo as casas e vamos procurar selecionar as famílias mais próximas das áreas onde moram atualmente. Agora, a questão da segurança é com o Estado que é quem tem que dar conta da segurança pública. Nós vamos construir as casas e colocar as pessoas, agora não temos como entrar nessa discussão. O que estamos fazendo é instalar as câmeras na cidade para poder contribuir com a segurança”, disse.

    O ac24horas também procurou a Secretaria de Segurança Pública. Por meio de uma nota, a Sejusp se posicionou, afirmando que não aceita “autodeclaração” de domínio de território por nenhum grupo criminoso.

    Não aceitamos, nem tão pouco motivamos os “autodeclarados” domínio de localidades por qualquer criminoso ou grupo destes.
    Para nós, da Segurança Pública do Acre são todos iguais e, independentes de onde estejam, serão, sim, devidamente e firmemente combatidos. O poder executivo (federal, estadual e municipal), ao planejar seus projetos urbanísticos ou qualquer outro, certamente não se pautará por esse viés e executará o programa/projeto de acordo com os preceitos constitucionais e que atenda ao cidadão de bem.
    E, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública do Acre (Sejusp) através das forças de segurança se fazem presente (no local escolhido pela gestão executiva), como já o faz em todo Estado, para prevenir e reprimir o crime nas suas mais diversas formas.