Na última semana, o desabamento de uma pilha de lixo no aterro sanitário Ouro Verde, localizado em Padre Bernardo, Entorno do Distrito Federal, chamou a atenção para a série de processos que o local enfrenta. Até março deste ano, o aterro funcionava autorizado por uma liminar judicial expedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). O desembargador que concedeu a liminar entendeu que não seria possível embargar o aterro sem um planejamento para remanejar o lixo que era despejado lá.
A referida decisão é de 2023. O lixão havia recorrido à Corte federal contra uma sentença anterior, que suspendia as atividades do aterro a pedido do Ministério Público de Goiás (MPGO) e do Ministério Público Federal (MPF). O desembargador responsável entendeu que a paralisação poderia ser “mais gravosa” que a permanência do aterro.
“[…] o fato é que a mera suspensão das atividades do empreendimento e a consequente proibição de recebimento dos resíduos sólidos pelo aterro, sem qualquer planejamento ou preocupação acerca de qual deva ser a destinação ou disposição final ambientalmente adequada dos resíduos produzidos na região, têm a aptidão concreta de causar danos ambientais e sociais reflexos em proporções até mesmo mais gravosos do que a própria manutenção do atual estado de coisas”, escreveu.
O magistrado ressaltou que ainda é preciso lembrar dos “efeitos sociais” que o fechamento abrupto do aterro poderia causar. “Pessoas de baixa renda dependem exclusivamente do aterro como fonte de renda para sua manutenção”, completou.
Desabamento e contaminação
Um vídeo feito por drone mostra até onde os resíduos que estavam na pilha do aterro chegaram. O desabamento ocorreu na quarta-feira (18/6). É possível ver a extensão do caminho que o lixo fez após o desabamento. Os resíduos chegaram até o vale que fica ao lado do empreendimento.
A secretária do Meio Ambiente de Goiás, Andréa Vulcanis, foi ao local um dia após o desabamento. Segundo ela, a situação é “gravíssima”.
“O Rio do Sal e o Córrego Santa Barbara estão contaminados. Ninguém faça uso de abastecimento do Córrego Santa Barbara e do Rio do Sal porque está contaminado e isso pode causar graves danos à saúde humana”, alertou.
Imbróglio judicial
O aterro estava funcionando há anos amparado por uma decisão liminar. Ele operava em zona de conservação da Área de Preservação Ambiental (APA) do Rio Descoberto — segundo o Ministério Público de Goiás (MPGO), sem licenciamento do Estado de Goiás.
Ao longo dos anos, diversas denúncias de irregularidades foram recebidas na 2ª Promotoria de Justiça de Padre Bernardo e levaram à proposição de duas ações civis públicas: uma pelo órgão estadual e outra por meio de atuação conjunta entre o MPGO e MPF, além de embargos e sanções pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Em 2018, a Justiça chegou a atender a um pedido dos órgãos e embargou as atividades da Ouro Verde pela falta de licença. Porém, o aterro recorreu e conseguiu, em segunda instância, uma liminar que permitiu a continuidade do funcionamento do aterro até a identificação de uma alternativa ambientalmente adequada.
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Área de rio com lixo proveniente de aterro
Área do Meio Ambiente e Consumidor e da 2ª Promotoria de Justiça de Padre Bernardo2 de 12
Aterro de Padre Bernardo
Área do Meio Ambiente e Consumidor e da 2ª Promotoria de Justiça de Padre Bernardo3 de 12
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O lixo estaria mal armazenado
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Foto da suposta emissão de gases
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Mais lixo encontrado de forma irregular no local
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A proximidade do aterro com áreas de proteção ambiental
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Segundo o documento, o solo estaria mal preparado para receber um aterro
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Os técnicos encontraram lixo hospitalar no local
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Fotos anexadas ao relatório do ICMBio de fevereiro
Em março de 2025, atendendo ao pedido de tutela provisória de urgência do MPGO, a Justiça determinou ao município de Padre Bernardo a suspensão da destinação de resíduos sólidos a qualquer aterro sem licença ambiental válida, especialmente o Aterro Ouro Verde.
A decisão judicial também determinou a suspensão do processo licitatório da Concorrência Pública nº 16/2024, que tratava de uma processo de habilitação do Aterro Ouro Verde. Para o ministério público, o empreendimento não atende aos requisitos previstos no edital, incluindo a exigência de licença ambiental.
“A não habilitação deste aterro no procedimento licitatório também foi ordenada pela Justiça ao município, justamente em razão da falta do licenciamento. O não cumprimento desta determinação implicará multa diária de R$ 5 mil”, completou o MPGO.