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    TJGO reduz pena de “agiota” alegando “justiça pelas próprias mãos”

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    O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) reduziu a pena da mulher condenada no caso em que um casal foi torturado e roubado, em Goiânia. A 4ª Câmara Criminal entendeu que Meire Sara Menezes, descrita como agiota, deveria responder por dois crimes: exercício arbitrário das próprias razões – que significa justiça pelas próprias mãos – e lesão corporal.

    Em primeira instância, Meire foi condenada por roubo qualificado a 17 anos, 12 dias de reclusão e 360 dias-multa. A sentença foi expedida pela 1ª Vara Criminal de Reclusão e Detenção, em julho de 2024. No julgamento do recurso, na quarta-feira (17/6), a 4ª Câmara Criminal do TJGO reduziu a pena da ré para 1 ano, 3 meses e 19 dias de detenção.

    Em setembro de 2023, três criminosos invadiram a casa das vítimas, uma empresária e um policial militar aposentado, no Setor Aruanã I, em Goiânia. Elas foram amarradas, agredidas a coronhadas e com faca, além de ameaçadas, durante uma hora e meia. O irmão da empresária também estava na casa e foi amarrado.

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    Meire teria emprestado dinheiro para a mulher, dona de um salão. A vítima disse, em depoimento à polícia, ter feito empréstimos com a mandante durante oito anos. Segundo o processo, a empresária não pagou o valor acordado e Meire decidiu contratar os criminosos para recuperar o dinheiro.

    O relator do processo em segunda instância, juiz substituto em 2º grau Gustavo Dalul Faria, disse que Meire alegou ter sido vítima de estelionato e denunciou o casal antes da invasão à casa, não havendo qualquer prova de que ela anuiu com o roubo de itens aleatórios da residência. O processo de autoria de Meire ainda não foi julgado.

    Por isso, o magistrado promoveu, de ofício, a desclassificação da conduta imputada a Meire (roubo) para que ela responda pelos crimes de exercício arbitrário das próprias razões e lesão corporal, com readequação das penas e modificação do regime prisional. A desclassificação ocorreu de ofício, ou seja, sem que tenha ocorrido pedido das partes.

    “Para a configuração do exercício arbitrário das próprias razões é indispensável que a conduta do agente seja fundamentada na intenção de satisfazer uma pretensão que entenda ser legítima. Ademais, deve-se corresponder a um interesse que poderia ser satisfeito em juízo, sobretudo por se tratar de crime contra a administração da Justiça. Exatamente a hipótese dos autos, em que Meire inclusive recorreu à Justiça, embora não tenha aguardado a prestação jurisdicional”, afirmou o relator, no voto.

    “Portanto, inexistindo provas de que Meire aderiu ao liame subjetivo dos demais autores acerca da subtração de bens aleatórios da residência da vítima, uma vez que toda prova angariada aponta para o dolo de satisfazer pretensão que reputava legítima (recuperar dinheiro de empréstimo), embora por meio de violência, torna-se imperiosa a desclassificação da conduta do roubo para aquela prevista no artigo 345 do Código Penal”, disse o juiz.

    O crime

    Os homens roubaram um carro, celulares, facas, uma garrafa de uísque, uma garrafa de rum, violão, perfumes, fivela da marca Harley Davidson e outros objetos. A Polícia Militar de Goiás (PMGO) prendeu quatro criminosos em Trindade, em uma casa onde estavam os objetos roubados.

    A vítima afirmou que a “tortura” foi “coisa de filme” e deu detalhes dos momentos de terror que viveu em casa, sob a mira dos criminosos.

    “A tortura maior foi quando ele [um dos criminosos] começou a enfiar a faca nos meus dedos, na minha unha, falar que iria me cortar, que sabia onde estavam os nossos filhos e e que se a gente procurasse a polícia, que a gente fizesse alguma denúncia, que eles eram muitos, e que eles voltariam e matariam todos”, contou.

    Veja os demais condenados e respectivas penas:

    • Márcio Adriano Alves da Silva: 7 anos, 4 meses, 27 dias de reclusão e pagamento de 18  dias-multa, na proporção mínima;
    • Rafael de Oliveira Caetano: 7 anos, 4 meses, 27 dias de reclusão e pagamento de 18 dias-multa, na proporção mínima;
    • Osleomar Santos de Oliveira: 8 anos, 10 meses, 20 dias de reclusão e pagamento de 20  dias-multa, na proporção mínima.
    • Lindomar Paulino Alves: 8 anos, 10 meses, 20 dias de reclusão e pagamento de 20
      dias-multa, na proporção mínima.

    A 4ª Câmara Criminal do TJGO também reconheceu como ilícita as provas obtidas por meio da devassa feita no celular de Lindomar Paulino Alves. Segundo os desembargadores, não houve autorização judicial. As outras provas, como depoimentos dos envolvidos, foram mantidas.

    A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos réus. O espaço permanece aberto para eventuais manifestações.