Lula deu entrevista ao Jornal Nacional para falar sobre o tarifaço de Donald Trump. É sempre doloroso ouvir o seu mau português. Aliás, Lula costuma acrescentar erros de concordância propositais quando está precisando de apoio popular. Ontem, ele caprichou. Vou corrigir os erros nas transcrições de trechos.
Em respostas às perguntas da jornalista Délis Ortiz, Lula se deteve na exigência de Donald Trump de que o Brasil tem de dar fim à “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro.
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O presidente da República se viu obrigado a dourar a pílula, obviamente:
“Isso aqui tem justiça, a gente está fazendo um processo com direito a presunção de inocência de quem é vítima (sic). Se a vítima cometeu erro, vai ser punido. Aqui no Brasil é punido”, disse Lula.
A verdade: a presunção de inocência não existe para Jair Bolsonaro, como dão mostra, em falas fora dos autos, ministros do STF. Mas não é verdade que culpados são sempre punidos pela justiça brasileira, como prova a própria liberdade de Lula e as de outros acusados de corrupção.
Mais adiante, ao voltar ao caso de Jair Bolsonaro, o presidente da República antecipou o veredicto condenatório ao ex-presidente, embora tenha tentado atenuar a sua fala na sequência. Afirmou Lula:
“Ele (Bolsonaro) não tentou dar um golpe. Ele tentou preparar a minha morte, a morte do presidente da Suprema Corte, que era o Alexandre de Moraes, a morte do vice-presidente… Quem vai ser julgado não é o cidadão Bolsonaro, são os autos do processo. Se ele tiver razão, vai ser preso. Se tivesse um Capitólio aqui no Brasil, o Trump estaria sendo julgado, porque a lei aqui no Brasil é para todos. Doa a quem doer.”
A verdade: a lei no Brasil dói apenas para quem não tem dinheiro e poder. A chance de que a lei valesse para todos foi eliminada com o fim da Lava Jato.
O presidente da República negou que o Brics possa ser pomo da discórdia com Donald Trump, mas acabou reafirmando o motivo pelo qual o presidente americano está irritado com o Brasil: a tentativa de abolir o dólar como moeda de troca nas transações comerciais entre os países. Disse Lula:
“O Brics trabalha pelo Sul Global. Nós cansamos de ser subordinados ao Norte. Queremos ter independência nas nos nossas políticas, queremos fazer uma comércio mais livre e as coisas estão acontecendo de maneira maravilhosa. E nós estamos discutindo a possibilidade de ter uma moeda própria ou, quem sabe, as moedas de cada país, para a gente fazer comércio sem precisar utilizar o dólar, porque nós não temos a máquina de rodar dólares, os Estados Unidos que têm. Nós não precisamos disso para fazer comércio exterior.”
A verdade: a ideia de que o dólar deixe de ser a moeda de troca internacional ajudará a que a ditadura chinesa dê as cartas no comércio internacional e permitirá à autocracia russa e à ditadura iraniana, assim como a outros regimes delinquentes, que contornem as sanções que lhes foram impostas pelas democracias ocidentais.
Sobre a contradição de protestar contra a tentativa de ingerência de Donald Trump no processo criminal contra Bolsonaro e de ele próprio ter ido visitar Cristina Kirchner na prisão domiciliar, em Buenos Aires, em sinal de apoio à ex-presidente da Argentina condenada por corrupção, Lula se sustentou na meia verdade Afirmou o presidente brasileiro:
“Eu fui visitar a presidente Cristina com a autorização da justiça argentina. Fui fazer uma visita humanitária. Nunca me preocupei que o Trump recebesse o Bolsonaro. É direito de cada presidente fazer o que quiser. O que não é direito é o presidente querer dar palpite na decisão da justiça de outro país.”
A verdade inteira: na “visita humanitária” a Cristina Kirchner, Lula posou para uma foto, ao lado da ex-presidente, carregando um cartaz com a frase “Cristina libre”, enquanto um áulico de Cristina carregava um cartaz com a frase “Lula livre”, daqueles usados na campanha petista para livrá-lo da prisão. Ou seja, Lula quis fazer crer que a condenação da ex-presidente argentina tem motivações políticas ilegítimas, assim como teria ocorrido com ele próprio, quando Lula e o PT faziam as mesmas acusações de Jair Bolsonaro e os seus asseclas contra a justiça brasileira .
Depois da visita, Cristina Kirchner divulgou que “hoje recebemos em minha casa o camarada Lula, onde me encontro em prisão domiciliar por decisão de um Poder Judiciário que há muito deixou de ocultar sua subordinação política e se tornou um partido político a serviço do poder econômico”.
Lula também antecipou que, caso as negociações com Donald Trump sejam infrutíferas, o Brasil adotará a reciprocidade e que, nesse caso, “só espera que os empresários estejam aliados ao governo brasileiro, porque se existir um empresário que ache que o governo brasileiro tem de fazer tudo o que presidente de outro país quer, sinceramente esse cidadão não tem nenhum orgulho de ser brasileiro”.
Está acesa, portanto, a fogueira inquisitória para quem discordar de retaliações brasileiras e queira defender o próprio negócio e os empregos que ele gera no Brasil.
Por último, ao ser questionado por não ter tido nenhum contato direto com Donald Trump, que comanda o país que é o nosso segundo parceiro comercial, Lula disse:
“Eu não tenho o que conversar com o Trump neste momento. Não tem uma razão. Imaginei encontrar o Trump no G7. Quando chegamos lá, ele tinha saído. Na hora que tiver necessidade de falar com o Trump, não terei problema. Agora, precisa ter uma razão para ligar. Dois presidentes não ficam se ligando para contar piada.”
A verdade: só pode ser piada. Outra piada: Lula disse que não tem relação ideológica com país nenhum. É um anjo.