As reações negativas sobre a aplicação de tarifas aduaneiras de 15% na maioria das exportações europeias para os EUA se multiplicam. Críticos afirmam que a União Europeia deveria ter adotado uma posição mais firme e condenam o pacto que poderá prejudicar o bloco por vários anos. A Comissão Europeia se defende e diz que foi o “melhor acordo possível em circunstâncias muito difíceis”. Alemanha, Itália e Irlanda deverão ser os países mais afetados.
“À medida que o verão (europeu) se transforma em outono”, foi com esta metáfora que o jornal britânico The Guardian descreveu o acordo comercial entre União Europeia e os EUA. Enquanto algumas lideranças do bloco fizeram declarações mornas, outros políticos se indignaram com as consequências desastrosas deste pacto desequilibrado. O crescimento econômico da zona do euro que já está fraco, deve ficar ainda mais lento.
“A Comissão Europeia não foi capaz de utilizar todo o peso da Europa nas negociações. Mesmo que a presidente do executivo europeu, Ursula von der Leyen proclame vitória para tentar salvar o seu cargo, no plano estratégico o acordo é uma derrota para a Europa”, analisou o economista francês Christian Saint-Étienne.
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A vitória permanece, assim, nas mãos do presidente americano, Donald Trump, que conseguiu colocar a Europa sob suas próprias condições. Na guerra comercial criada por ele, o republicano segue com sua tática de dividir para reinar melhor. As novas tarifas dos EUA entrarão em vigor a partir de sexta-feira (1º/8).
Perdas & danos
A indústria cosmética europeia, com quase 13% de sua produção destinada ao mercado americano, foi duramente atingida. Os perfumes e cosméticos que eram isentos ao entrarem nos EUA serão agora taxados em 15%. Só na França, isso ameaça 5 mil empregos. As pequenas e médias empresas francesas também serão muito afetadas. Segundo a Confederação de Pequenas e Médias Empresas (CPME), “as consequências do pacto serão muito negativas para a economia francesa e terão repercussões desastrosas no país”.
Já as montadoras de automóveis alemãs foram menos afetadas do que se temia com a redução da sobretaxa de 30%, inicialmente ameaçada por Donald Trump, para 15%. Porém, analistas do setor alertam que mesmo essa taxa mais baixa custará bilhões de euros à indústria automobilística alemã.
Na contramão da luta climática, Von der Leyen concordou em derrubar a tarifa de carros americanos de 10% para 2,5%. Na prática, carros das três grandes montadoras americanas – GM, Ford e Chrysler – receberão sinal verde para transitar nas ruas europeias. Enquanto isso, nos EUA, Trump busca desmantelar as políticas que limitam as emissões de gases de efeito estufa em veículos fabricados no país.
Quanto aos setores poupados pelo tarifaço de Trump, podemos citar os produtos farmacêuticos que encabeçam a lista das exportações europeias para os EUA. Eles devem permanecer isentos de qualquer alíquota. Porém, se Trump mudar de ideia, Bruxelas já adiantou que haverá retaliações. Segundo a Eurostat, agência de estatísticas da UE, a Europa exportou cerca de € 120 bilhões de fármacos no ano passado para o mercado americano, o equivalente a 22,5% do total dos bens europeus exportados para os EUA.
Tarifas zero também serão aplicadas em outros setores estratégicos, como aeronaves e peças de aeronaves, alguns produtos químicos, equipamentos semicondutores e certos produtos agrícolas, além de matérias-primas essenciais.
Impacto geopolítico
A explicação oficial é a de que a Europa quer acabar com toda a dependência do gás da Rússia, que ainda fornece 20% do gás natural liquefeito (GNL) para a União Europeia, por isso, o pacto prevê que os europeus comprem US$ 750 bilhões em produtos energéticos americanos – gás natural liquefeito, petróleo e combustíveis nucleares – nos próximos três anos e invistam US$ 600 bilhões nos EUA, incluindo a aquisição de equipamentos militares produzidos no país.
Segundo analistas, a Comissão Europeia não tem nenhum poder sobre o mercado de petróleo e gás e que, ao fechar o acordo com os EUA, Von der Leyen agiu além dos limites definidos pelo seu mandato.
Na semana passada, Von der Leyen se reuniu com o presidente chinês Xi Jinping. Foi um encontro tenso marcado, principalmente, pelas disputas comerciais. Agora, Pequim vê a União Europeia concedendo praticamente tudo aos EUA. A fragilidade dos europeus nas negociações com Trump pode encorajar os chineses a serem tão inflexíveis quanto os americanos.