MAIS

    Luiz Cleiton fala de compulsão, depressão e relação com Rebeca Andrade

    Por

    O fisiculturista Luiz Cleiton, ex-namorado da ginasta Rebeca Andrade, falou abertamente à coluna Fábia Oliveira sobre os bastidores de sua trajetória no esporte, os efeitos da exposição pública e os desafios enfrentados com a saúde mental. Em um relato comovente, ele relembrou o período em que perdeu a avó e mergulhou em uma espiral de compulsão alimentar e depressão.

    “Achei que seria tranquilo superar, mas acabei me desmoronando por dentro. Cheguei a pesar 130 kg e achei que não tinha mais volta”, revelou.

    Leia também

    Luiz também contou que foi durante esse processo doloroso que o fisiculturismo deixou de ser apenas um esporte e passou a ser um verdadeiro alicerce emocional. “De certo modo, o fisiculturismo me salvou. Cada treino é uma forma de canalizar a dor em algo construtivo. Não é só sobre levantar peso, é enfrentar seus próprios demônios todos os dias”.

    5 imagensLuiz CleitonRebeca Andrade e Luiz CleitonLuiz CleitonRebeca Andrade e Luiz CleitonFechar modal.1 de 5

    Rebeca Andrade e Luiz Cleiton

    Reprodução/Instagram2 de 5

    Luiz Cleiton

    Reprodução/Instagram3 de 5

    Rebeca Andrade e Luiz Cleiton

    Reprodução/Instagram4 de 5

    Luiz Cleiton

    Reprodução/Instagram5 de 5

    Rebeca Andrade e Luiz Cleiton

    Reprodução/Instagram

    Ao relembrar o relacionamento com Rebeca Andrade, ele descreveu momentos de carinho, simplicidade e acolhimento. Mas admitiu que a exposição pública o desestabilizou emocionalmente. “Eu não era mais o Luiz, era o namorado da Rebeca. Depois do fim, isso piorou. Tudo o que eu fazia era associado a ela. E o que eu não fazia, inventavam. As crises de ansiedade vieram como num embalo só. A sensação era de morte”, declarou ele.

    Confira a entrevista completa:

    Você tem uma trajetória no fisiculturismo marcada por transformações visíveis e títulos importantes. Quando foi que você percebeu que esse caminho era, de fato, uma escolha de vida?
    Eu entrei no fisiculturismo em 2016, ainda sem saber o tamanho que isso ia tomar na minha vida. Comecei competindo como estreante, fiquei em segundo lugar logo na primeira vez, e aquilo me deu um choque porque ainda não enxergava aquilo como algo que fazia sentido pra mim. Eu não tive disciplina ou foco como deveria. Eu competi mais pelo hype, coisa de jovem. Mas o momento em que o fisiculturismo virou algo muito maior pra mim foi em 2020, quando perdi a minha avó. Foi ela quem me criou. Ela morreu de câncer, e mesmo sabendo que o fim era inevitável, meu coração não estava pronto. Achei que seria tranquilo superar, mas acabou havendo uma sucessão de impactos emocionais que pareciam ter um peso muito grande dentro de mim. Ela era minha base, minha referência de amor incondicional. E foi nesse período que eu cheguei a pesar 130 kg.

    Justamente na época da perda da avó, eu parei de trabalhar por causa da pandemia e desenvolvi uma compulsão alimentar. Olha, isso é importante falar: eu sempre fui muito disciplinado com a alimentação. Quando trabalhava animando festas, eu levava minha marmita. Não comia salgadinho, bolo, docinho, nada. Levava minha comida e mantinha a rotina. Mas quando a rotina mudou completamente, somado a perda da minha avó, eu desenvolvi essa compulsão. E até hoje essa compulsão não está totalmente resolvida. Agora, na preparação para o campeonato de 2025, eu fui de 102 kg para 124 kg em apenas quatro dias. Aí vem depois o sentimento de culpa, o desespero de achar que não dá para reverter, de ter perdido completamente o controle… Estou tentando resolver isso, sendo acompanhado psicologicamente e tomando remédio. Porque não é só sobre disciplina ou força de vontade, é sobre entender que a comida virou meu refúgio emocional, e isso precisa ser tratado com seriedade.

    De certo modo eu acho que fisiculturismo me salvou e continua me salvando de mim mesmo. Não foi só uma escolha de carreira, foi uma escolha de vida. Cada treino é uma forma de canalizar a dor e as minhas dificuldades em algo construtivo e positivo.

    Recentemente, você conquistou mais uma premiação na sua categoria. Como foi a preparação pra essa competição e o que esse reconhecimento representa pra você hoje?
    Essa preparação foi diferente de todas as outras. Não foi sobre dieta e treino, isso eu já domino há algum tempo e até gosto da parte física. Foi uma batalha mental intensa, de identificar meus gatilhos e entender por que eu me saboto quando chega perto da competição. Eu tenho um padrão: sempre acho que vou perder, que os outros são melhores. A regra na minha cabeça é não acreditar em algo bom pra mim, como se eu não merecesse estar ali. Muitas vezes quando chamam meu nome no palco, eu não acredito. Literalmente não acredito. É paralisante.

    A compulsão alimentar piora conforme a competição se aproxima. Justamente quando deveria estar mais focado, eu começo a me sabotar. Eu me vigio pra não criar um ciclo de culpa focando em não deixar a comida virar válvula de escape. Uma coisa que funcionou foi mudar de academia. Eu precisava ter menos interação com as pessoas. Elas fazem muitas perguntas sobre fisiculturismo, e um ambiente mais solitário, sem tantos estímulos, funciona melhor pra mim. Toda essa jornada mental me fez perceber que força não é só levantar peso, é enfrentar seus próprios demônios todos os dias. É acordar sabendo que sua mente vai trabalhar contra você e ainda assim escolher continuar.

    Vencer a minha categoria já foi muito bom, mas conquistar o Overall, que é o título máximo da noite, foi um daqueles momentos que parecem congelar no tempo. Porque ali não é só o físico sendo julgado, é toda essa batalha mental, toda a luta silenciosa contra mim mesmo. É a prova de que, mesmo quando você se sente um impostor, mesmo quando acha que não merece, você pode surpreender até a si mesmo. Hoje eu olho pra esse troféu e vejo muito mais que uma conquista esportiva. Não é só sobre vencer competições, é sobre mostrar que dá pra continuar mesmo quando sua própria mente trabalha contra você. É sobre provar que você pode ser quebrado e forte ao mesmo tempo.

    Você também tem formação em engenharia e já passou por outras áreas, como animação de festas infantis. De que forma essas experiências ajudaram na sua construção pessoal e profissional?
    Essas experiências me moldaram profundamente de uma forma que eu nem imaginava na época. A animação foi muito mais do que um trabalho pra mim. Me preparou para apresentações, me ajudou a me desinibir, a me tornar mais sociável. Como eu me apresentava de forma teatral, aprendi sobre fala, sobre como usar o corpo, a expressão facial, a linguagem corporal. Hoje percebo que essas experiências me ajudaram a desenvolver habilidades sociais de uma forma única. Paralelo a tudo isso, sempre busquei conhecimento de forma intensa. Fiz cursos de Nutrição Esportiva, Métodos de Treinamento e Bodybuilding. Cheguei a passar no vestibular para cursar Nutrição e Educação Física, mas acabei optando pela engenharia na UFRJ. Ela me deu disciplina, método e pensamento analítico.

    Você já compartilhou nas redes sociais que enfrentou um período de depressão. O que te motivou a tornar esse relato público?
    Os stories que falei da minha depressão foram gravados no impulso. Foi um ato de desespero. Eu estava no fundo do poço e não soube lidar com o hate que estava vindo de todo o lado. Eu tinha namorado uma pessoa pública, mas não me via como uma, e não sabia lidar com tanta gente falando tanta babaquice. Mas internet é isso, basta você respirar. Você não precisa ser famoso ou conhecido, basta existir.

    No final foi bacana porque vieram mensagens de pessoas passando por problemas de depressão ou com histórias de familiares ou amigos na mesma situação. Além das mensagens de apoio, de desejar o seu bem, sabe? Essa é a parte boa da internet. Foi reconfortante. Homens têm dificuldade de falar sobre saúde mental. Não é fraqueza buscar ajuda, é coragem. A terapia veio depois e foi ali que comecei a entender os estilhaços. Hoje, falo disso com mais consciência. Mas naquela hora? Era sobrevivência.

    Durante um período em que sua vida pessoal estava mais exposta, você recebeu comentários negativos e até ofensivos. Como foi lidar com esse tipo de situação?
    Tive muitas crises de ansiedade. Principalmente porque criaram um personagem de quem eu era e aquilo saía no jornal. E pior, quando saía matéria sobre nós dois, sempre falavam dos dois, quando saía sobre mim, era só me detonando. Foi cruel. As pessoas criam ódio de uma pessoa que elas nem conhecem. Esquecem que tem um ser humano ali. Li comentários dizendo que eu era um lixo, que era “livramento”… Isso num momento em que eu já estava destruído por dentro. Mas aprendi a filtrar. Quem te ataca, muitas vezes, só tá projetando sua própria dor. Comecei a focar em quem me acolhe. Foi isso que me manteve de pé.

    Em uma das publicações, você expôs que foi chamado de “michê”. Como esse tipo de fala impactou você na época?
    Na época não me impactou porque eu nem sabia o que era rs. Quando ela me explicou eu fiquei p*to, mas não porque estavam me “xingando”. Fiquei p*to por associarem o namorado dela a isso. Eu queria protegê-la, proteger a imagem dela, mas não sabia como fazer isso. Eu era tão louco por ela, que entrava até na frente de um tiro se tivesse que protegê-la. Eu fiquei irado e ela ficou mal também. Porque não foi só sobre isso, o cara também disse que não entendia como ela, sendo preta, podia estar comigo. Sei que a equipe dela entrou em contato com os jornais pedindo para isso parar de ser divulgado e foi abafado.
    Hoje, podem me chamar do que quiserem. Será apenas uma tentativa de me diminuir através de preconceitos. Não vai me afetar em absolutamente nada.

    Você também revelou ter recebido recentemente o diagnóstico de autismo. O que mudou na sua forma de se entender e de lidar com o mundo depois disso?
    Foi libertador e assustador ao mesmo tempo. Finalmente entendi porque certas situações me afetavam tanto, porque eu processava o mundo de forma diferente. Muitas pessoas pensam que autismo é só criança, só estereótipo, mas não é. Eu sou prova viva de que pessoas autistas podem ser atletas, podem ter relacionamentos, podem ter amigos, serem absolutamente funcionais e, mais importante de tudo, serem felizes. O diagnóstico não mudou quem eu sou, apenas me ajudou a me aceitar. Hoje vejo minha sensibilidade como uma força, não como fraqueza.

    Você teve um relacionamento com a ginasta Rebeca Andrade, que ganhou bastante repercussão. Essa exposição influenciou de alguma forma sua saúde emocional ou sua forma de lidar com a vida pessoal em público?
    Sim, foi uma experiência que me marcou profundamente, tanto de forma positiva quanto dolorosa. Nosso relacionamento começou igual ao de muita gente… Uma amiga, que também era amiga dela, nos apresentou em sua festa de aniversário. Não havia nada de incomum ou diferente. Ela era apenas a Rebeca, eu era apenas o Luiz, que se tornaram namorados porque se apaixonaram. Durante o relacionamento, eu me sentia acolhido. Pela primeira vez, parecia que eu fazia parte de algo real. A gente brincava com os cachorros no parque, conversava até de madrugada, maratonávamos séries… fazíamos coisas simples, mas que pra mim tinham um valor enorme, porque eu nunca tive esse tipo de vínculo. E amar é bom, né? Você fica leve. É um sentimento muito bom.

    Entre nós dois, no nosso relacionamento pessoal, nunca tive problemas que afetassem meu emocional. Ela é uma pessoa maravilhosa, mesmo. Não é um personagem. E eu gostava de todos que estavam a volta dela. Desde a família, o treinador, os amigos e as amigas. São pessoas muito legais, e isso acaba tornando o relacionamento ainda melhor. Quando veio a exposição pública, eu achei que estaria preparado, mas não estava. No primeiro momento, eu achava diferente. As pessoas que paravam para tirar fotos com ela, depois de um certo tempo, passaram a pedir para tirar comigo também. Eu achava engraçado, fazia piadas.

    Minha saúde mental era realmente afetada quando saíam as matérias. Elas sempre tratavam sobre mim como se ela tivesse feito uma escolha ruim ou que eu fosse uma pessoa ruim. Eu ficava me perguntando: Será que faz bem a ela estar comigo? Será que estou atrapalhando o futuro dela? Com o tempo, eu sentia que não tinha mais identidade. Eu não era mais o Luiz, era o namorado da Rebeca. Depois do fim, isso piorou. Tudo o que eu fazia era associado a ela. E o que eu não fazia, inventavam. E aí minha saúde emocional sofreu. Porque, por mais que a gente tente separar, acaba absorvendo os julgamentos, as comparações e a pressão. As crises de ansiedade vieram como num embalo só. A sensação era de morte. Eu não quero que uma coisa boa na minha vida se torne um arrependimento por causa dos outros, entendeu?

    Vocês ainda mantêm algum tipo de contato? Como foi o fim desse ciclo pra você?
    Não. O tempo encerrou esse ciclo no meu coração. Isso é tudo o que eu posso te dizer.

    Hoje, olhando pra trás, o que você diria pro Luiz que estava começando no esporte e ainda não imaginava tudo que viria depois?
    Eu diria: Luiz, a sensibilidade, que você vê como fraqueza, é sua maior força. Você vai passar por momentos muito difíceis, mas também vai se apaixonar por crianças e vai fazer pessoas sorrirem vestido de super-herói, e isso não é menos importante que qualquer troféu que você venha a conquistar. Você vai viver um relacionamento que vai te dar a primeira sensação real de família, de pertencimento. Vai ser lindo enquanto durar. E quando acabar, vai doer muito, mas aceite que algumas coisas na vida não têm explicação clara, e que isso não é culpa sua. Sua jornada no fisiculturismo vai ser muito mais sobre batalha mental do que física. Você vai se sabotar, vai achar que não merece estar no palco, vai duvidar de si mesmo, mas você vai vencer. E principalmente: você não precisa ser perfeito para ser valioso. Você não precisa ter todas as respostas. Você pode ser quebrado e forte ao mesmo tempo.