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    Policiais são acusados de coagir testemunha por celular na cadeia

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    Presos pela Polícia Federal (PF) em setembro do ano passado, acusados de extorquir dinheiro de criminosos ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) para livrá-los de investigações, os policiais civis Valmir Pinheiro, conhecido como Bolsonaro, e Valdenir Paulo de Almeida, o Xixo, são suspeitos de continuarem a cometer crimes de dentro do Presídio Especial da Polícia Civil, na zona norte da capital paulista.

    Segundo investigações conduzidas pela Corregedoria da Polícia Civil e pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP), Xixo e Bolsonaro protagonizaram uma ação “sem precedentes” na história da unidade carcerária policial. De dentro do presídio, a dupla teria feito um telefonema para coagir e ameaçar uma testemunha de um processo criminal pelo qual respondem.

    5 imagensPoliciais civis Valmir Pinheiro, conhecido como "Bolsonaro" (esq.), e Valdenir Paulo de Almeida, o "Xixo", presos por envolvimento com o PCCPoliciais civis Valdenir Paulo de Almeida, o "Xixo" (esq.), e Valmir Pinheiro, conhecido como "Bolsonaro", presos por envolvimento com o PCCAntônio Vinícius Gritzbach, delator do PCC, foi morto no aeroporto de GuarulhosVinicíus Gritzbach, delator do PCCFechar modal.1 de 5

    Empresário, preso sob suspeita de mandar matar membros do PCC, foi solto por determinação do STJ

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    Policiais civis Valmir Pinheiro, conhecido como “Bolsonaro” (esq.), e Valdenir Paulo de Almeida, o “Xixo”, presos por envolvimento com o PCC

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    Policiais civis Valdenir Paulo de Almeida, o “Xixo” (esq.), e Valmir Pinheiro, conhecido como “Bolsonaro”, presos por envolvimento com o PCC

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    Antônio Vinícius Gritzbach, delator do PCC, foi morto no aeroporto de Guarulhos

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    Vinicíus Gritzbach, delator do PCC

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    A ligação desencadeou uma operação conjunta, em fevereiro, por meio da qual a Corregedoria, o Canil da Guarda Civil Metropolitana (GCM), juntamente com a Promotoria, fizeram um pente-fino na unidade. Na ação, encontraram 20 celulares, drogas, bebidas alcoólicas, notebooks e dezenas de milhares de reais.

    Cerca de um mês e meio depois, mais celulares, drogas, dinheiro e, até, anabolizantes e caixas de cerveja foram apreendidos na unidade. A Corregedoria instaurou um inquérito para identificar os responsáveis pelos itens ilegais encontrados durante a operação.

    O órgão fiscalizador ainda solicitou a transferência de Xixo e Bolsonaro — além de outros oito policiais civis presos que teriam ligações com o crime organizado — para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). O pedido, no qual é destacada a falta de segurança do presídio da Civil e o iminente risco de fuga ou resgate dos dez agentes presos, foi negado pelo juiz Hélio Narvaez.

    Sequestro e tribunal do crime

    Quando estavam em liberdade, Xixo e Bolsonaro mantiveram contato com o corretor de imóveis Vinícius Gritzbach, o delador do PCC e de policiais corruptos que foi fuzilado com dez tiros de fuzil, em 8 de novembro passado, quando desembarcou no Aeroporto Internacional de São Paulo, na região metropolitana.

    Gritzbach foi executado dias após realizar uma delação premiada na qual apontava a ligação entre policiais com o PCC. Antes de fechar o acordo com a Corregedoria e com o MPSP, Gritzbach foi assediado por policiais, para pagar por sua inocência em um processo de duplo homicídio, cujas vítimas eram integrantes do PCC.

    No fim de 2021, o corretor foi sequestrado por um bando composto por membros da facção e pelo policial civil Marcelo Roberto Ruggieri, o Xará. O grupo o levou para um tribunal do crime, no qual Gritzbach teria sido “absolvido” dos dois assassinatos pela facção.

    Vídeo: execução no aeroporto

     

    Prisão e recompensa

    Em fevereiro de 2022, o corretor foi preso pelo crime, sempre negado por ele. Quando foi solto, com medidas cautelares, Xixo o procurou. O policial, na presença de Gritzbach, recebeu um telefonema no qual, por meio do viva voz, puderam ouvir o advogado Ahmed Hassan Saleh, conhecido como Mude, informando existir uma recompensa de R$ 3 milhões pela morte do corretor de imóveis.

    Mude é um advogado ligado à Sintonia dos Gravatas, um dos “departamentos” do PCC, além de ser apontado como o elo entre a execução de Gritzbach e o esquema de lavagem de dinheiro do PCC, por meio de empresas de ônibus que operam linhas na capital paulista.

    O registro em áudio, no qual Mude fala sobre o preço pela cabeça de Gritzbach, foi anexado à delação premiada do corretor de imóveis, na qual denunciou e apresentou provas da relação de policiais civis paulistas com a maior facção criminosa do país.

    Gritzbach teria ainda indicado para Xixo e Bolsonaro a localização de 15 casas cofre do PCC, nas quais eram mantidos milhões de reais em espécie. A partir das informações, os policiais teriam ido até os locais, sem mandado judicial, e se apropriado dos valores, causando prejuízo de R$ 90 milhões à facção.

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    Delatados por Tacitus

    A dupla de investigadores foi citada por um integrante do PCC, identificado como Tacitus, em mensagens enviadas ao próprio Gritzbach e a delegados.

    “O Vinícius [Gritzbach] passou informações das ‘casas cofre’ para o Xixo e o Pinheiro [Bolsonaro], esses policiais invadiram as casas ‘cofre’ sem mandado judicial, roubando milhões de reais em espécie da ’empresa’”.

    Em um e-mail, Tacitus orientou uma delegada sobre como obter elementos que ajudassem a comprovar o envolvimento dos policiais com o crime organizado. Em uma mensagem enviada ao próprio Gritzbach, o integrante do PCC afirmou que Xixo e Bolsonaro eram “vermes”, prometendo vingança.

    Os dois policiais civis foram presos em setembro passado pela PF, acusados de receber R$ 800 mil do narcotraficante João Carlos Camisa Nova Júnior para livrá-lo de uma investigação sobre a exportação de toneladas de cocaína para a Europa.

    A defesa deles não havia sido localizada até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.