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Por uma união nacional em defesa do Brasil e sua soberania e contra os traidores da pátria (por José Dirceu)

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Por uma união nacional em defesa do Brasil e sua soberania e contra os traidores da pátria (por José Dirceu)

Se algum brasileiro genuinamente democrata ainda tinha dúvida da natureza criminosa e golpista que rege a atuação da família Bolsonaro, a danosa aliança com Donald Trump a dissipa completamente.

A carta de 9 de julho de 2025, com a qual o presidente norte-americano fez uma chantagem explícita contra o Brasil para salvar Jair Bolsonaro do julgamento pela tentativa de golpe de Estado, entrará para a nossa história ao reviver os piores momentos que já enfrentamos, quando uma potência estrangeira se une a lideranças brasileiras para atentar contra a democracia, a soberania e os interesses do país.

Pelo que se viu na carta e nos contornos que a forjaram, Bolsonaro e seus filhos Flávio e Eduardo devem ser processados por traição e conspiração contra a segurança, o interesse nacional, a economia e o bem-estar do Brasil e do povo brasileiro.

Eles trabalharam diretamente como conspiradores e traidores da pátria, estimulando Trump a agir contra o país e buscar usurpar a soberania brasileira e desrespeitar as nossas instituições – e, o mais espantoso, não hesitaram em exibir as próprias provas dos crimes que cometeram.

Dias antes da fatídica carta-chantagem de Trump, Eduardo Bolsonaro lia, com orgulho, uma postagem de defesa do seu pai, onde o presidente norte-americano apontava, de forma mentirosa, uma “caça às bruxas” e o “julgamento político” contra Bolsonaro.

E sinalizou que tinha conhecimento de que algo mais viria pela frente. Afirmou: “O que eu posso garantir é que essa não será a única novidade vindo dos EUA sobre esse tema da perseguição no Brasil nessa semana”.

Menos de 48 horas depois o tarifaço de Trump foi anunciado. Não satisfeito, Eduardo apareceria depois lendo uma espécie de carta de exigências, como se fosse um sequestrador exibindo condições para libertar um sequestrado. Com o detalhe que o sequestrado em questão era o seu próprio país.

Segunda Guerra

Flávio Bolsonaro também avisou. Em entrevista à CNN, disse que Trump não vai parar por aí, e comparou a situação do Brasil à do Japão na Segunda Guerra Mundial, como se estivéssemos rendidos aos EUA, sem ter condições de nada exigir.

Uma declaração de quem se enxerga como vassalo de Trump. Bolsonaro e os dois filhos não esconderam que a única coisa que lhes interessa é a anistia.

Que o ex-presidente e seus filhos jamais tiveram apreço pela democracia já se sabia. Como igualmente se sabe que eles se importam exclusivamente com seus interesses, e não com o Brasil.

Do mesmo modo, já era conhecida a disposição de Donald Trump em tentar passar por cima da lei, das instituições e da diplomacia em nome de seu projeto imperial de inspiração fascista.

Mas o conluio entre os Bolsonaros e Trump, que resultou na ameaça de imposição de tarifas comerciais gravíssimas para todos os produtos brasileiros, permitiu ao Brasil saber muito mais: para livrar o ex-presidente no STF, é possível tudo, a começar por prejudicar o país, o agronegócio, a indústria e os consumidores.

Trump quer atendê-los, mas tem outras intenções. Primeiro, combater o fortalecimento dos Brics e a construção de uma nova ordem internacional, na qual os EUA não têm o poder de ditar o mundo.

Segundo, barrar no STF as ações contra as big techs com atuação no Brasil, porque sabe que elas se converteram em poderoso instrumento da extrema-direita.

Terceiro, levar adiante seu projeto de “presidência imperial”, como definiu a revista The Economist, um imperialismo que retoma o princípio da Doutrina Monroe (a política externa com origem no século 19 e sintetizada na frase “América para os americanos”) e do Destino Manifesto (a ideologia que fez os EUA se enxergarem como “nação escolhida”). Em seu projeto, a única lei internacional que conta é a lei do mais forte.

Elites

Até aqui parte de nossas elites financeiras e agrárias vinham fazendo de conta que não estamos sob ameaça da extrema-direita norte-americana e suas forças congêneres em todo o mundo.

Elas se omitiram diante da estadia ilegal e antipatriótica de Eduardo Bolsonaro nos EUA. Ignoraram os que apoiaram o clã Bolsonaro, o PL e o bolsonarismo, financiando o golpe de 8 de janeiro de 2023 e continuam financiando um grupo que claramente está organizando uma intervenção externa nas eleições de 2026.

Não reagiram ao sinal da desimportância que Trump deu ao Brasil, com sua indefinição para nomear um novo embaixador aqui, enquanto declarava “eles (os brasileiros) precisam de nós (americanos). Nós não precisamos deles”.

Fingiram desconhecer os sinais de quem deseja criar um clima que justifique a intervenção não apenas pelas redes ou medidas jurídicas, mas com medidas de força – como as tarifas comerciais, sanções e bloqueios. Surgiram até medidas contra o terrorismo na tríplice fronteira entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina, e até o Hezbollah surgiu do nada, em seguida espiões russos e a notícia de que os EUA querem ter bases militares em Natal e Fernando de Noronha.

Risco

Agora talvez não se ignore também o risco iminente de Bolsonaro usar a farsa da perseguição política e apoio da extrema-direita internacional liderada por Trump para fugir do país antes de ser julgado.

Está posta uma evidente narrativa internacional para justificar um eventual pedido de asilo político. Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, lembrou em despacho no início do mês que Eduardo Bolsonaro continua tentando interferir nas investigações relacionadas ao pai, praticando condutas, segundo ele, com o objetivo de embaraçar o andamento da ação penal que apura a atuação do ex-presidente na trama golpista. É algo muito grave.

Com a ameaça das tarifas, toda a omissão de nossas elites vista até aqui pode ter chegado ao fim. O alarme soou. Entidades ligadas ao agro, setor simpatizante do bolsonarismo, criticaram a imposição de tarifas, refutando argumentos comerciais usados por Trump.

A exportação de pescados já parou, segundo mostrou a notícia de que 58 contêiners frigoríficos carregados com cerca de mil toneladas de peixes deixaram de embarcar em navios com destino aos EUA. Caso se confirme a imposição das tarifas, o Brasil perderá empregos e atividade econômica. Os EUA também perderão.

O presidente Lula respondeu à altura, com firmeza, equilíbrio e sabedoria. Primeiro deixou claro que Bolsonaro precisa assumir a responsabilidade pelo estrago. Também destacou que é inadmissível que interesses externos se sobreponham à soberania brasileira.

E, por fim, mas não menos importante, informou que criará um comitê com empresários para repensar a política comercial com os EUA e reforçou que medidas de retaliação ao tarifaço de Trump estão em estudo, sendo a principal delas o uso da Lei da Reciprocidade, que permite ao Brasil adotar sanções equivalentes às impostas por outros países. Antes, tentará esgotar negociações diplomáticas e ações junto à Organização Mundial do Comércio (OMC).

Mais do que nunca o Brasil precisa equilibrar-se entre a ascensão da China e do Sul Global, que são a força emergente do século 21, e nossas históricas relações com os EUA e a Europa.

Estratégia

Mas para esse equilíbrio ser bem-sucedido, o Brasil precisa de uma estratégia, capaz de preparar o país para enfrentar as consequências do trumpismo, e ao mesmo tempo promover uma verdadeira política capaz de preservar nossa liderança na integração da América do Sul.

Uma estratégia que, sob a liderança do presidente Lula, construa consensos mínimos, una setores de classes empresariais e classes trabalhadoras, supere divisões e evite más escolhas.

Esse é um momento digno de uma união entre todos e todas que defendem a independência, a democracia e a nossa soberania, com um projeto nacional de desenvolvimento, coisas que o bolsonarismo ignora.

Aliás, não só o bolsonarismo como também seus sócios menores, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

Este, não satisfeito em se opor ao STF para bajular o padrinho político, achando pouco vestir o boné do movimento de Trump, o Maga (Make America Great Again) e, mais recentemente, tendo cumprimentado o presidente norte-americano depois que este fez suas primeiras ameaças ao Brasil por causa do julgamento de Bolsonaro, ainda transformou um tema econômico de grande interesse do Brasil em plataforma política e ideológica.

Tarcísio e boa parte da direita brasileira pagarão um preço bastante alto pelo apoio a esse crime de lesa-pátria promovido pela família Bolsonaro. Hoje parece claro que quem está com Trump está contra o Brasil.

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