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    A reverência de Trump e o beija-mão da Europa (por Sónia Sapage)

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    O que aconteceu na segunda-feira ao final do dia, em Washington, quando Donald Trump recebeu Volodymyr Zelensky e, a seguir, os representantes europeus (que foram fazer de escudo do Presidente da Ucrânia), foi muito diferente do que aconteceu na Cimeira do Alasca, com Vladimir Putin. Washington foi um beija-mão da chamada “coligação dos dispostos” (coalition of the willing) ao Presidente americano. O Alasca foi um sinal de que os Estados Unidos — ou Trump — têm hoje muito mais reverência em relação à Rússia — ou a Putin — do que no passado.

    O fato de Trump ter interrompido os trabalhos na Casa Branca para ligar a Putin foi um sinal da importância que dá ao seu homólogo russo. Quis pô-lo a par das conversações, em direto, apesar de o encontro com Zelensky e os líderes europeus ter estado durante longos minutos a ser emitido nas televisões, sem qualquer filtro (algo que não aconteceu no Alasca). Transparente, disseram uns. Nunca visto, comentaram outros.

    No day after, Trump fez notar, em entrevista à Fox News, que “isto é uma guerra” e que “a Rússia é uma nação militar poderosa, quer as pessoas queiram quer não”.

    Para o Presidente americano, ficou claro que o cessar-fogo não é uma inevitabilidade (Putin prefere falar em acordo de paz) e que terá de haver cedências de território (Putin insiste nas anexações), algo que, obviamente, Zelensky não tem qualquer intenção de cumprir. “A questão do território é uma questão que deixamos para mim e para Putin”, disse o ucraniano.

    Trocadas por miúdos, as reuniões do Alasca e de Washington serviram para Trump se gabar repetidamente de já ter mediado “seis acordos” de paz este ano, e para dizer que cabe à Europa assegurar a sua defesa e dar garantias de segurança à Ucrânia. Ao mesmo tempo, a “cimeira” abriu a possibilidade de um encontro bilateral entre Putin e Zelensky, eventualmente em território neutro, como a Suíça, para discutirem o que os pode unir, mas sobretudo o que os continuará a desunir.

    Quanto a Ursula von der Leyen (Comissão Europeia), Mark Rutte (NATO), Emmanuel Macron (França), Alexander Stubb (Finlândia), Friedrich Merz (Alemanha), Keir Starmer (Reino Unido) e Giorgia Meloni (Itália), os sete europeus foram à Casa Branca para surgirem simbolicamente alinhados numa fotografia, com Zelensky e Trump ao centro, como se o retrato fosse uma garantia da boa saúde da NATO.

    Nem 24 horas depois, o imprevisível senhor Trump lembrava: “Temos um oceano que nos separa”.

     

    (Transcrito do PÚBLICO)