É do Centro-Oeste brasileiro que Siron Franco olha o mundo. A partir de uma sensibilidade aguçada, o artista, nascido em Goiás Velho em 1947, observa atento fatos que tomam o globo e os traduz a seu modo, seja com camadas de tinta ou esculturas. Foi assim com a série Césio, feita a partir do acidente com o elemento radioativo Césio-137 que causou grandes danos de saúde a moradores de Goiânia em 1987. E segue assim.
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Desta vez, movido, por exemplo, pelas enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul e pelo incêndio histórico que tomou conta de Los Angeles, nos Estados Unidos, Siron Franco produziu telas de grandes formatos, que colocam o público diante de uma força cromática marcada por pinceladas, mas que não deixa de lado o elemento humano – ou animal – desses eventos.
Em exposição na Cerrado Cultural, no Lago Sul, com curadoria de Agnaldo Farias, Observando o mundo desde o centro do Brasil reúne obras do artista goiano, um reflexo de sua produção mais recente. Nessa quarta-feira (13/8), entusiastas da arte acompanharam, em primeira mão, a abertura da mostra acompanhados pelo próprio artista e pelo curador.
“Pouca coisa nesse mundo grávido de tragédias, acidentes, iniquidades e também muita, mas muita beleza, escapa à sensibilidade de Siron Franco”, escreve Agnaldo no texto curatorial. “Sua poética é movida pelo fascínio e pelo espanto”, acrescenta.
Impacto
Há mais de 20 anos, o curador acompanha o desenvolvimento artístico do goiano, a quem define como um “homem prodigioso e de uma energia incomum”. Para esta exposição, Agnaldo detalha à coluna Claudia Meireles que optou por um caminho de embate. “São telas grandes, que a galeria comporta, para criar um impacto, quase como algo institucional. Mesmo porque existe uma intenção de criar um Instituto Siron Franco”, adianta o curador. “É uma seleção abrangente, porque a obra é abrangente”, emenda.
“Vários trabalhos falam de acontecimentos e, ao mesmo tempo, ao lado disso, tem a preocupação de um homem, uma figura humana, e com os animais. Isso é uma constância”, comenta.
No primeiro andar, Agnaldo partiu de uma escolha cromática de Siron Franco em um dos trabalhos – Efeitos do clima número 02 (2024/2025) – para dar tom ao ambiente, pintando as paredes brancas da galeria de um roxo escuro, fechado e denso. O impacto é imediato, como imaginou o curador, e ganha continuidade diante da dimensão das obras e das pinceladas marcadas e coloridas do artista.
“O processo de Siron Franco dá-se por catarses. Cada tela, sobretudo as produzidas nas duas últimas décadas, principia em ações fortes e concisas, condensados gestuais e cromáticos, ágeis e vivos, talvez uma estratégia para contornar sua manifesta habilidade”, define Agnaldo no texto curatorial.
Ele conta ainda que o goiano tem um processo de trabalho dividido em etapas e não pinta uma tela por vez. “Feita a primeira ação, ele [Siron] deixa a tela à espera para só depois, quando o ímpeto inicial arrefece, quando a distância se interpõe entre ele e o que foi feito antes, retomá-la”, escreve.
De pinturas monocromáticas, como uma tela feita inteiramente com folhas de ouro trazidas do Peru, até trabalhos que são mais “lacônicos e singelos”, como descreve Agnaldo, a exposição revela uma certa compaixão, vista a partir do centro que é Brasília. “É preciso denunciar, falar. O Siron é um artista que incorpora, que sente o drama alheio, mas, por outro lado, o trabalho não se resolve como simplesmente um tema”, comenta o curador.
Mas também traz observações que vêm da memória do artista, como uma pintura de uma figura, que lembra uma silhueta feminina, diante de uma faixa. “Essa obra nasceu dele lembrando da mãe pisando em brasas, mas o chão também tem a ver com o Cerrado”, explica Agnaldo. “É uma maravilha ver a desenvoltura e o virtuosismo problemático do Siron, ele não se acomoda”, acrescenta.
A exposição reúne obras de grande formato
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Obra do artista Siron Franco
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A mostra tem curadoria de Agnaldo Farias
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As obras de Siron Franco estão expostas na Cerrado Cultural
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A mostra fica em cartaz até outubro
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Obras do artista Siron Franco
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Arte como alimento
O goiano é um artista por vocação — uma paixão que começou cedo, aos 9 anos. “Sou guiado pela arte. Desde pequeno me entreguei a ela e falei: ‘vou virar artista’. Todo mundo falava para não pegar este caminho porque eu ia morrer de fome, e eu falava: ‘eu como pouco’”, relembra Siron. Para ele, seu processo de pintura, dividido em “ações”, revela quem de fato ele é. “Isso faz com que você reveja você, é um espelho ao contrário”, define.
Diante das obras, o goiano espera que o público “perceba e sinta esse trabalho que não é descritivo”, mas que, a seu ver, lembra Brasília e a expansão do céu. “Tenho uma ligação profunda com a cidade, uma paixão. Meu irmão foi cabo eleitoral do presidente Juscelino Kubitschek e eu estive na primeira missa de Brasília. Aqui, em 1984, fiz a primeira instalação na frente do Senado”, detalha.
À coluna, Siron também adianta os planos futuros, como comentou anteriormente Agnaldo, que vão além da profusa produção artística. “Quero que o Instituto Siron Franco, que já tem um local próprio, seja um lugar que vai acolher adolescentes, meninos e meninas, para trabalhar com arte. Não quero que seja focado no meu trabalho, mas tenha uma função social”, afirma.
Legado do Centro-Oeste
Na avaliação de Lúcio Albuquerque, um dos nomes à frente da Cerrado Cultural, a influência de Siron “transcende a fronteira nacional”. “Ele fala com propriedade das situações do nosso dia a dia. Ele assimila muito rapidamente as questões da nossa sociedade e transforma na obra dele”, pontua, reforçando como o pensamento do artista é “para frente”.
Antônio Almeida, um dos sócios-fundadores da Almeida & Dale Galeria de Arte, de São Paulo, e um dos nomes por trás da Cerrado, fala, à coluna, sobre a alegria em sediar a exposição de Siron Franco e sobre o movimento de ocupação artística do Planalto Central e de cidades fora do eixo Rio-São Paulo.
“Vejo o Centro-Oeste com um potencial absurdo. Brasília, hoje, vai ser o segundo mercado de arte, tomando o espaço do Rio”, afirma. “Esse resgate de grandes artistas da região feito pela galeria é essencial e ninguém melhor que o Siron para começar isso, um artista presente em bienais, acervos de museus internacionais e nacionais e com exposições já agendadas para o exterior”, finaliza.
Confira detalhes da abertura da exposição do artista Siron Franco, pelas lentes de Giuliano Gazzoni e edição de Ivan Lacombe:
Confira os cliques de Wey Alves:
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