Com a fama de ser o melhor amigo do homem, os cães são habilitados com um significativo sentimento de empatia, comprovado cientificamente. Capazes de compreender as emoções humanas por meio de uma percepção social e emocional, os cachorros têm desempenhado um papel crucial na vida de diferentes famílias, chegando à interferir de forma transformadora nas experiências vividas por seus tutores.
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A conexão entre as partes vem de um hormônio muito comum nas relações humanas: a ocitoxina. Por ser um dos hormônios do amor, a liberação dessa substância nos cachorros confere aos pets uma solidariedade singular pelos seus donos – algo que os move à querer ajudá-los em momentos difíceis. Seja por questões de saúde física ou emocional, as histórias de cães que “salvam” a vida dos tutores são intensas, e denotam o quão evoluídos os animais de estimação são.
Essa cooperação canina foi especialmente vivida por Júlia Flôres, Jairton Fabeni Domingos, Maria Luisa Maciel, e Mariana Scherer; cada um pôde contar com os seus animais de estimação de diferentes maneiras, em diferentes momentos da vida.
Júlia Flôres e Ozzy
Amor à primeira vista; essa é a forma que Júlia consegue descrever sua conexão com o shih tzu Ozzy. Em 2011, aos 10 anos, ela se tornou uma pequena tutora do filhote de 5 meses. A memória do primeiro encontro com o cão é carregada de uma nostalgia marcante. “Jamais vou esquecer a cena dele descendo as escadas da quitinete que as antigas donas moravam. Ele veio correndo para gente, e nunca mais nos soltamos dele”, conta Júlia.
De filhote até a idade adulta, passando pela adolescência, Ozzy acompanhou Flôres durante as diferentes fases da vida da tutora. O cachorro foi adotado à pedido da psicóloga de Júlia, que passava longos períodos sozinha e estava apresentando sintomas depressivos. A companhia do shih tzu durante o crescimento da tutora foi crucial, não apenas para fazer companhia, mas também para mantê-la ocupada com as atividades e responsabilidades do cuidado; como passear, alimentar e higienizar.
Um dos momentos mais difíceis da vida de Flôres foi a experiência com a obesidade e a recuperação após uma cirurgia bariátrica. Da sua própria maneira, Ozzy era a companhia perfeita para a tutora. Durante o período de recuperação que levou 15 dias, o shih tzu parecia ter uma espécie de “sexto sentido” que sempre captava os momentos onde a dona estava especialmente desanimada com o processo.
“Eu ouvia ele arranhando a porta do meu quarto. Então ele aparecia só pra me olhar um tempo e saía. Era o suficiente pra eu ver que não estava sozinha e tinha algo pelo que persistir”, descreve Flôres.
A presença silenciosa de Ozzy parecia se encaixar com perfeição na necessidade de Júlia. Sem opiniões, ou críticas, o cão estava ali exclusivamente para demonstrar apoio e oferecer acalento. A tutora conta que o shih tzu tinha a personalidade um gato; não era de muito grude, ou mesmo de toque físico, mas estava a todo momento ao lado dela.
Após anos desempenhando o papel de verdadeiro amigo para a tutora, Ozzy morreu em janeiro deste ano, aos 14 anos de idade, por complicações naturais da velhice. “Foi difícil perdê-lo. Eu entendia a ele e ele a mim, e acho que ele tinha uma ligação muito especial com cada um da casa”, comenta Flôres sobre o luto.
Maria Luisa e Diana
Aquela que traz luz; este é o significado do nome da golden retriever de 1 ano e 11 meses. Derivado do latim “Diviana”, o nome Diana foi escolhido pela psicóloga Maria Luisa Maciel, a tutora da cadela. A família vive em Salvador, Bahia, e inicialmente não haviam adotado Diana com o propósito de ser um cão de suporte emocional. Dotada de um temperamento amoroso e calmo, a golden parecia ter nascido para se conectar emocionalmente com as pessoas.
Desde que chegou, a pet já demonstrava um equilíbrio admirável para uma cadela da raça, além de ser especialmente atenta para os sinais de desconforto nos membros da família. “Digo sempre que ela salva a minha vida todos os dias”, afirma Maciel.
Diana viaja com o casal para todo o canto
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A psicóloga diz que a companhia da cadela salva a vida dela todos os dias
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A golden retriever consegue perceber sinais de estresse
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A psicóloga sofre com Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), e ela conta que aos 8 meses de idade, Diana já notava os sinais iniciais de uma crise da tutora. Ao ver os tremores na perna de Maciel, o primeiro impulso da golden retriever é cutucá-la gentilmente com a patinha.
“Antes, ir sozinha para ambientes cheios como shoppings, era impossível. Hoje, com ela, eu me sinto bem em ir, ela me acompanha até dentro do provador”, brinca a baiana.
Assim que a tutora notou a aptidão da cadela para oferecer suporte emocional às pessoas, ela considerou a possibilidade de estender o bem que Diana fazia, para outras pessoas. Foi quando uma outra psicóloga especializada em cursos de adestramento sugeriu que a golden retriever atendesse como cão de suporte emocional em clínicas psiquiátricas.
Atualmente, Diana, já adestrada, frequenta a Clínica Apice duas vezes por semana para interagir com as crianças que fazem diferentes tratamentos no local. Em momentos onde onde o grupo infantil não está em consulta, elas interagem com a golden retriever. Reunidos em rodinhas, em pequenas brincadeiras ou contação de histórias, a cadela faz seu “trabalho” com os pacientes; ofertando carinhos e abraços.
Jairton Fabeni Domingos e Jeep
O trabalho de um cão-guia requer responsabilidade, e o labrador Jeep foi preparado para desempenhar esse papel — assim como para seguir o seu tutor dentro de casa no tempo livre. Morador do município de Navegantes, Santa Catarina, Jairton Fabeni Domingos conta que, quando Jeep não está trabalhando o guiando fora de casa, gosta de agir como se fosse sua “sombra”.
Jeep foi treinado pela escola de cães-guias Helen Keller. Lá, os cachorros são adestrados com o propósito de auxiliar pessoas com deficiências visuais à se locomover. O labrador é o segundo cão-guia que Domingos recebeu da escola, que tenta combinar a personalidade do cão a do novo tutor. Velocidade do caminhar e temperamento são dois exemplos dos diferentes critérios adotados pra criar um verdadeiro “match” entre as duas partes.
O cão não é do tipo muito energético e tem um temperamento calmo, assim como o dono. Talvez pelas similaridades compartilhadas entre os dois, Jeep aprecia estar sempre perto de Domingos. Eles estão juntos há 10 meses, e nesse período, diariamente, o labrador conduz o tutor nos percursos fora de casa, evitando obstáculos no caminho. “É um casamento perfeito. Eu peço e ele faz”, brinca o tutor. Apesar do trabalho externo, dentro de casa, Jeep tem uma rotina comum com Domingos.
As brincadeiras, momentos de alimentação e passeio são priorizados, e assim como o cão se adapta ao tutor, o dono também registra mentalmente em quais horários Jeep demanda atenção para suas necessidades — a relação de troca é mútua. “A gente tem uma conexão bem forte”, compartilha o tutor.
Comumente, os cães-guias ficam com o deficiente visual a maior parte da vida, até a idade em que esses animais se aposentam — por idade ou por questões de saúde — e deixam de desempenhar o serviço. Mas até lá, o labrador de 4 anos ainda tem muitos quilômetros para percorrer com o dono, sejam eles na frente ou atrás de Domingos.
Mariana Scherer e Pedrinho
Pedrinho já foi um cão da raça “fiapo de manga” das ruas, mas hoje é influencer com o perfil @pedrinho_srd. O vira-lata tem dois anos e foi encontrado no bairro do Areal, do Distrito Federal. O cão foi adotado pela engenheira florestal Mariana Scherer, no Eixão do Lazer. Scherer conheceu o pet por meio do projeto Feirinha Pet, organizado pela protetora Eliana Cavalcanti.
O vira-lata vivia nas ruas com um morador de rua, sem ter acesso aos cuidados básicos que um cachorro precisa. Ele foi adotado em julho de 2023, e apesar dos “dias de cão”, Pedrinho chegou a casa de Scherer sem dar nenhum trabalho. A tutora conta que ele rapidamente aprendeu a fazer as necessidades no lugar certo e sempre foi muito amoroso com a família. Seja depois de um longo dia de trabalho, ou em períodos difíceis, o vira-lata tem retribuído o carinho de Scherer com o famoso afeto incondicional canino.
Hoje em dia, Pedrinho é influencer
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Pedrinho acompanha a tutora para todo lugar
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O pet está com Mariana há dois anos
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“Ele é fundamental pra nossa saúde mental todos os dias, seja dando suporte através do carinho depois de um dia de trabalho cansativo, seja pelos passeios que fazemos diariamente que são bons tanto pra ele quanto pra gente”, relata a tutora.
Um período que marcou a história dos dois foi quando o pai de Scherer se mudou para outro país. A tutora é de Arambaré, Rio Grande do Sul, e o pai era a única pessoa da família dela que morava em Brasília. A mudança fez com que Mariana se sentisse solitária no quadradinho.
A engenheira florestal conta que a companhia de Pedrinho foi fundamental. Nos momentos de passeios e brincadeiras, ela se sente especialmente conectada ao pet. “Mesmo sem falar nada, ele demonstrava o amor e o companheirismo”, descreve a tutora.