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Perigo de dano irreparável: o voto de Fachin sobre região alvo dos Caiado

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Perigo de dano irreparável: o voto de Fachin sobre região alvo dos Caiado

Ao votar pela proibição da desocupação das casas da fazenda Antinha de Baixo, em Santo Antônio do Descoberto (GO), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, relator do processo, levou em conta o “perigo de dano irreparável” para com a comunidade da região caso ela seja repassada a terceiros. A 2ª Turma do STF concluiu, nesta sexta-feira (29/8), a votação de uma liminar sobre o caso, e os quatro ministros da turma acompanharam o relator.

Fachin fundamentou seu voto no fato de a comunidade da Antinha de Baixo ter se identificado como remanescente de quilombo — a população do local impetrou recurso apontando que cidadãos escravizados ocupavam aquelas terras cerca de 400 anos atrás; a Fundação Cultural Palmares aceitou a autodeclaração, e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) solicitou entrada no processo para acompanhar o caso.

“Sopesado o perigo de dano irreparável decorrente do cumprimento de decisão anterior […] que não avaliou as peculiaridades inerentes ao reconhecimento de propriedade […], foi monocraticamente deferida a liminar”, ponderou o Fachin.

“Entendo prudente a imediata suspensão da ordem de desocupação proferida no processo de origem”, declarou.

O ministro utilizou como referência técnica, dentre outros conteúdos, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que versa sobre os povos indígenas e tribais. O documento leva a “consciência da própria identidade” como critério para determinar grupos tradicionais e pontua: “Estado algum tem o direito de negar a identidade de um povo que se reconheça como tal”.

Votaram acompanhando o relator Fachin os ministros Dias Toffoli, Nunes Marques, Gilmar Mendes e André Mendonça. O mérito da questão deve ser votado posteriormente, sem data prevista.

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Família centenária

As citações diretas e indiretas contidas no voto de Fachin evidenciam que a autodeclaração da população como remanescente de quilombo é suficiente para que a terra seja preservada.

A Antinha de Baixo possui moradores centenários até os dias atuais. Um deles é Joaquim Moreira, conhecido como Seu Joaquim, 86 anos. “Meu pai era daqui, minha mãe também. Fiz casa, criei meus filhos aqui… Não tenho outra casa em lugar nenhum”, disse em entrevista ao Metrópoles.

Relembre no vídeo abaixo:

Entenda a batalha judicial

“Tiraram tudo o que era meu”

Como dito acima, ao menos 32 famílias chegaram a ser desapropriadas e ficar sem lugar para morar antes de o STF intervir no caso.

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Fazenda Antinha de Baixo, em Santo Antônio do Descoberto (GO)

Breno Esaki/Metrópoles (@brenoesakifoto)2 de 8

População da Antinha de Baixo

Breno Esaki/Metrópoles (@brenoesakifoto)3 de 8

Região seria quilombola; tal fator levou o STF a suspender as derrubadas

Vinícius Schmidt/Metrópoles (@vinicius.foto)4 de 8

Lídia Rosa Silva, 61, é uma das moradoras que perderam casa

Breno Esaki/Metrópoles (@brenoesakifoto)5 de 8

Katleen Silva, 38, é uma das moradoras que ficou sem teto

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Viviane Barros, 42, revisita os escombros da sua propriedade

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Ela e o marido, o rodoviário Wilson Rabelo, 38, ao lado do Pipoco, cavalo de estimação da família

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Murilo Caiado, primo do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, é um dos herdeiros, de acordo com o TJGO

VINÍCIUS SCHMIDT/METRÓPOLES @vinicius.foto

A servidora pública Lídia Rosa Silva, 61 anos, é uma das moradoras.

Lídia alega nunca ter sentido tanta dor e decepção. Ela não teve coragem para visitar os escombros da própria casa. “Não consegui descer do carro. Quando passei e vi os tijolos no chão, não consegui”, relata.

“Eu sei cada tijolinho que tem ali. Quantas vezes eu mesma trabalhei fazendo massa de cimento porque eu não tinha dinheiro para pagar o servente…”, afirma Lídia, que mora na Antinha de Baixo há 12 anos.

“Eles tiraram tudo o que era meu. Minha casa, meus bichos, minhas galinhas, minha horta. Acabou tudo, foi tudo destruído.”

A agricultora familiar Katleen Silva, 38, também foi obrigada a deixar o lar em 4 de agosto. “A palavra é dor. O sonho de toda uma vida hoje está aqui”, dissw Katleen à época, apontando para os tijolos de casa quebrados, os móveis largados e algumas peças de roupas perdidas.

A motorista de transporte coletivo Viviane Barros, 42, é mais uma moradora da Antinha de Baixo que viu um trator destruir o imóvel que levou anos para ser erguido. “Nossa vida toda estava aqui. São mais de 10 anos.”

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