Um ano após ser privatizada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Sabesp quase dobrou seu lucro, mas viu dispararem as reclamações de consumidores relacionadas a cobranças em plataforma na internet. Além disso, a companhia de saneamento básico reduziu o número de funcionários e, neste mês, ganhou manchetes negativas após ser multada em mais de R$ 23 milhões por um vazamento de esgoto no Rio Pinheiros, na capital paulista.
A venda da Sabesp foi uma das principais bandeiras políticas de Tarcísio e deve ser usada como trunfo eleitoral pelo governador — seja na busca pela reeleição, seja na disputa pela Presidência da República. O desempenho da empresa, no entanto, está na mira da oposição, que deve usar como artilharia queixas sobre serviço, cortes no quadro de pessoal e problemas ambientais.
Com a privatização, o estado de São Paulo deixou de ter mais da metade das ações da companhia e tornou a Equatorial, empresa do setor de energia, a investidora de referência da Sabesp. O governo segue hoje com 18% das ações.
Queixas contra a Sabesp disparam
- Desde o início da gestão Tarcísio, a reputação da Sabesp no site Reclame Aqui vem caindo. A nota da companhia passou de 6,3, em 2023, para 4,4 neste ano, saindo da categoria “regular” para “não recomendada”.
- Já o número de reclamações saltou de 12.929, em 2023, para 19.214, em 2024. Apenas no primeiro semestre deste ano, já foram registradas 12.962 — mais do que em todo o ano de 2023.
- A média mensal de queixas em 2025 é cerca de 35% maior do que no ano passado.
- Os principais problemas apontados são cobranças indevidas e demora na execução de serviços.
- Dados da Agência Reguladora Estadual (Arsesp) seguem a mesma toada de avanço das queixas: foram 610 registros no primeiro semestre de 2024 contra 1.246 no mesmo período deste ano.
- Já a Sabesp afirma que as reclamações feitas diretamente à empresa caíram 9%, com variação negativa de 260 mil reclamações — foram de 1,46 milhão, no primeiro semestre de 2024, para 1,31 milhão, no mesmo período deste ano.
- Além disso, o índice de reclamações por ligação faturada, diz a empresa, caiu de 2,62% para 2,34%.
- Segundo a diretora de relações institucionais e sustentabilidade, Samanta Souza, as queixas em plataformas independentes refletem principalmente críticas a cobranças.
- O Metrópoles também ouviu queixas de consumidores por excesso de burocracia, como exigência de comparecer presencialmente a agências para resolver questões que poderiam ser solucionadas por telefone, além de cobranças de esgoto em regiões com esgoto a céu aberto.
Cobrança de inadimplentes intensificada
A Sabesp nega que tenha aumentado as contas após a privatização. Admite, porém, ter intensificado a cobrança de devedores.
“Na verdade, a gente passou a praticar o que está deliberado para atuação em contas em atraso. Então, o cliente que está com contas em atraso passou a ter uma atuação de negociação de contas. E, para isso, a Sabesp abriu alguns novos canais”, disse Samanta, diretora da Sabesp. Entre as medidas está a negativação de consumidores no Serasa.
Grandes empresas que tinham descontos também perderam o benefício, medida que se estende a indústrias e clientes corporativos. Quando anunciou a mudança na política tarifária, a companhia afirmou que se tratava de uma alteração para seguir novos critérios regulatórios da concessão.
Lucro em alta e cortes de pessoal
Desde a privatização, os lucros da Sabesp decolaram. No segundo trimestre de 2025, o lucro por ação chegou a R$ 3,12, contra R$ 1,77 no ano anterior — alta de 76%. No primeiro semestre, o lucro líquido somou R$ 3,6 bilhões, 78% a mais do que em 2024. Segundo a companhia, 75% do montante são reinvestidos em infraestrutura e 25% vão para os acionistas.
A Sabesp atribui parte do desempenho a uma “força de trabalho mais enxuta”. O quadro de funcionários caiu de 10.214 para 9.190 após um programa de demissão voluntária, segundo informe da companhia. Funcionários ouvidos pela reportagem relatam que, em algumas regiões, já havia falta de pessoal e que os cortes podem dificultar a supervisão de empresas terceirizadas, com possível impacto na qualidade do serviço no futuro.
A companhia argumentou que está recompondo seus quadros e informou que recontratou 500 profissionais, além de cerca de 150 estagiários. Também abriu nova turma de jovens aprendizes e prepara o lançamento de um programa de trainee.
Vazamento e multas ambientais
Neste mês, a Sabesp ganhou manchetes negativas após um vazamento de esgoto em uma estação elevatória, que atingiu o Rio Pinheiros e provocou mau cheiro e mancha na água. A falha resultou em multa de R$ 23 milhões pela Arsesp.
A estação elevatória de Pinheiros é a maior da companhia, responsável por encaminhar o esgoto de 3,8 milhões de moradias para a Estação de Tratamento de Esgoto de Barueri, na Grande São Paulo.
A empresa afirma que o problema na estação elevatória foi identificado e que bombas novas estão vindo da China. “A gente está falando de uma estação elevatória que bombeia em torno de nove metros cúbicos por segundo. São seis bombas que a gente vai ter aqui. Cada uma tem 13 metros de altura, toneladas de peso”, afirmou a diretora Samanta.
O episódio não foi isolado. Dados obtidos pelo Metrópoles via Lei de Acesso à Informação (LAI) revelam que a Sabesp foi multada 57 vezes pela Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb) entre janeiro de 2024 e julho de 2025, acumulando mais de R$ 11,4 milhões em punições.
O que diz o governo
O governo Tarcísio de Freitas afirma que houve “avanços concretos” para a política de saneamento com a privatização da Sabesp. “Em um ano, os investimentos da companhia praticamente dobraram em relação ao período anterior, atingindo R$ 10,6 bilhões de um total de R$ 70 bilhões previstos até 2029”, diz o governo, que acrescentou que 1,3 milhão de pessoas passaram a ter acesso a água potável e 1,4 milhão receberam coleta e tratamento de esgoto.
A gestão também afirma que a criação da Tarifa Social Paulista, que entrou em vigor em junho deste ano, ampliou descontos que chegam até 78% na conta de água e esgoto para 2,2 milhões de pessoas de baixa renda.
Pontua ainda que o contrato com a empresa prevê sanções claras em caso de ocorrências. “Todas as ocorrências são tratadas no âmbito dos órgãos reguladores, que têm a responsabilidade de fiscalizar, cobrar providências e aplicar as penalidades cabíveis, sempre com foco na proteção dos usuários”, diz a gestão.
Sobre o vazamento no Pinheiros, a Cetesb, que é vinculada à Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, afirma que monitora a unidade de tratamento diariamente por meio de vistorias presenciais e sobrevoos com drones. “A Sabesp já foi devidamente sancionada e seguirá sendo fiscalizada.”