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    Boulos vê cenário a favor de Lula e aposta em racha na centro-direita

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    Diante do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado, do tarifaço imposto pelo governo dos Estados Unidos aos produtos brasileiros, e da crescente articulação pela anistia aos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro, grupos de esquerda vão à Praça da República, no centro de São Paulo, na manhã deste domingo (7/9), marcar posição contra as pautas bolsonaristas.

    A expectativa dos organizadores é reunir 10 mil pessoas, menos do que o número de apoiadores de Bolsonaro aguardados para a Avenida Paulista, na tarde deste mesmo domingo. Mas para o deputado federal Guilherme Boulos (PSol), um dos coordenadores do ato da esquerda, “o debate não é uma competição de números”.

    Em entrevista ao Metrópoles, o psolista afirma que o cenário está mais favorável ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que não irá à manifestação mas pediu que seus apoiadores fossem às ruas pelo “risco da anistia”, e acredita que a centro-direita, que tem articulado a candidatura presidencial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), chegará rachada em 2026.

    Confira abaixo a entrevista com Guilherme Boulos.

    Nessa semana, União Brasil e PP anunciaram o desembarque do governo Lula. O senhor acredita que a frente ampla, que foi importante na eleição de 2022, pode se dissipar em 2026, deixando o presidente Lula mais isolado? 

    Quem está se isolando é o próprio Tarcísio, que queria se equilibrar como bolsonarista moderado. Ele está mostrando cada vez mais o seu comprometimento com o bolsonarismo raiz, mais extremo. Vamos lembrar que tanto União Brasil quanto o PP, apesar de ocuparem cargos no governo até aqui, estiveram formalmente na coligação do Bolsonaro em 2022 contra o Lula, e sempre tiveram alas bolsonaristas. Aliás, o Lula ganhou a eleição de 2022 sem nenhum partido do centro na chapa. Uma coisa é o [deputado] Baleia Rossi falar pelo MDB. Agora, vai perguntar para quem tem voto no MDB, o Helder Barbalho, o Renan [Calheiros], se eles vão apoiar o Lula ou o Tarcísio. Então, veja, esses presidentes partidários, eles expressam uma posição determinada, que, inclusive, nem no partido deles, em alguns casos, é hegemônica.

    Com Tarcísio candidato oficial à Presidência, a esquerda irá intensificar a oposição ao governo estadual?

    Esse trabalho de oposição já tem sido feito de maneira incisiva, mas não tem tanta visibilidade porque o Tarcísio é blindado por ter maioria na Assembleia Legislativa. Certamente, ele se colocando como candidato à Presidência da República vai trazer mais um holofote para o fracasso da gestão dele como governador. Quando ele abre as asinhas para ser candidato, vai ficar mais claro a gestão desastrosa de São Paulo. O que eu acho que vai mudar é que um tema que hoje é só de São Paulo, vai se tornar um tema do Brasil. E aí, as pessoas que vivem em outros estados também vão poder ter mais clareza sobre o que é verdadeiramente a gestão dele em São Paulo.

    A “não anistia” é a pauta principal da manifestação da esquerda neste domingo?

    O grande debate que vai estar colocado no ato de domingo é a soberania nacional. A anistia, nesse momento, é atender a exigência do [Donald] Trump para o Brasil, é aceitar a imposição da principal potência estrangeira do mundo sobre o Brasil. A primeira versão do projeto do PL é uma barbárie, uma excrescência. Quer anistiar todo tipo de crime contra a democracia nos últimos cinco anos. Eu acho, inclusive, que eles vão ter, apesar da articulação ativa do Tarcísio e de setores do Centrão, muita dificuldade no Congresso para avançar nisso. O Tarcísio quer se colocar como expoente da anistia para poder ganhar o carimbo do Bolsonaro para ser candidato a presidente da República, que ele está obcecado por isso. Agora, nós vamos travar a batalha na Câmara e também nas ruas, naturalmente, para que esse acordo não seja aprovado.

    O número maior de manifestantes da direita nas ruas indica maior apoio da população à anistia?

    Não. Primeiro porque qualquer pesquisa de opinião que acontece no Brasil mostra que a maioria da população brasileira é contra essa anistia. As pesquisas demonstram isso mais do que qualquer evento particular. O debate não é competição de número. O debate é iniciar um resgate dos símbolos nacionais, das datas nacionais do 7 de setembro para quem de fato defende o Brasil. Independente do número de pessoas, é muito importante que não seja apenas a extrema direita que esteja na rua. Nós estamos num momento que não tem tido grandes mobilizações de rua no Brasil. Nem de um lado, nem de outro. Se você comparar as manifestações bolsonaristas deste ano com aquelas que faziam há 2, 3 anos atrás, são muito menores. O momento atual para a mobilização da sociedade não tem se expressado nas ruas, mas numa polarização nas redes sociais, no Congresso Nacional. Diante da perspectiva da prisão do Bolsonaro, da entrada do processo eleitoral mais propriamente, eu acho que isso vai se reacender. Você vai ter, eu imagino, nos próximos meses, novamente um momento de mobilização por rua mais intenso.

    Há uma interpretação no meio político que as sanções americanas favoreceram o governo Lula politicamente. Qual a sua avaliação sobre isso?

    Não foi o presidente Lula quem desejou um ataque da principal potência do mundo contra o Brasil, e nem ele que provocou isso. Quem provocou isso foi o Donald Trump, junto com a turma bolsonarista, trabalhando para salvar a própria pele a qualquer custo. Então, acho que a questão não é se se beneficiam ou não. Eu acho que a questão é ter deixado claro de que lado cada um está. A população percebeu que aqueles que se dizem patriotas, na verdade, estão trabalhando contra o Brasil e apenas por interesses próprios. Quem se revelou o defensor do Brasil nesse processo não foram eles, mas o presidente Lula.

    Em anos anteriores, os atos do 7 de Setembro em São Paulo viraram palco de conflitos. Há algum receio de que isso se repita novamente, diante dessa tensão política?

    Essa tensão política é provocada pela extrema direita e não foi apagada em nenhum momento. Você tem uma polarização, uma disputa política no Brasil que vem de alguns anos. Da nossa parte, não vai haver qualquer tipo de provocação ou de busca de conflito físico, que só interessa para a extrema direita nesse momento. Essa não é a prática das nossas manifestações.

    Na sua última entrevista ao Metrópoles, o senhor falou de uma expectativa de que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), seria um presidente melhor que Arthur Lira (PP-PI). Como o senhor avalia a posição dele neste momento?

    Eu acho que o Hugo, do ponto de vista do trato, do trato pessoal, direto, é uma pessoa mais tranquila do que o Arthur Lira. Agora, ele está diante de uma definição que vai definir qual que vai ser o lado que ele vai ocupar, que é esse tema da anistia. Conforme ele definir isso, ele vai fazer a escolha que vai ser marcada como a escolha dele na presidência da Câmara. Eu espero que ele tenha, nesse caso, a firmeza para não ceder a essa pressão espúria do Tarcísio e do bolsonarismo e não pautar a anistia, que é uma pauta absurda que estão querendo colocar nesse momento para o país. Uma pauta que não diz nada a respeito dos grandes temas do país. Eu acho que essa é a grande definição que o Hugo Motta vai ter que tomar.

    Depois da derrota na eleição para prefeito de São Paulo, em 2024, o senhor foi cotado para assumir a Secretaria-Geral da Presidência. Como ficou essa espectativa de virar ministro do governo Lula?

    Surgiram muitas especulações nos últimos meses a respeito disso. Mas eu sequer me sinto à vontade de tratar de um tema desse porque isso é uma prerrogativa exclusiva do presidente. Se em algum momento o presidente tiver a disposição de me chamar para contribuir no governo, eu vou fazer esse debate com ele de maneira muito tranquila e natural, como alguém que aposta nesse projeto, no sucesso do governo Lula e na vitória eleitoral no ano que vem. Cargo executivo nunca foi prerrogativa para poder ocupar espaços e disputar eleições. Isso é uma manobra de marketing eleitoral que meus adversários fizeram aqui na capital. Eu fui o deputado federal mais votado no estado de São Paulo e o deputado mais votado da história da esquerda brasileira pro Congresso Nacional. E estou exercendo meu mandato.