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    Estatal manda demitir funcionário que gritou “sem anistia” a Tarcísio

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    O professor e economista Ivan Paixão, de 40 anos, foi demitido na segunda-feira (8/9) de uma consultoria que presta serviço para a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), estatal do governo de São Paulo, após gritar “sem anistia” ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

    A manifestação do funcionário ocorreu enquanto Tarcísio seguia à pé com sua comitiva para a sede da Bolsa de Valores (B3), no centro da capital, na manhã do dia 5 de setembro, quando seria realizado o leilão do lote Paranapanema de rodovias. Naquele mesmo dia, mais tarde, Tarcísio voltou à B3 para o leilão do túnel Santos-Guarujá.

    Ivan relata que estava tomando café com uma colega de trabalho em um restaurante próximo do prédio da CDHU, onde ele atua como consultor por meio da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), quando viu o governador passando pela rua rodeado de seguranças. Ivan e sua colega não estavam uniformizados e não portavam crachá identificando que trabalhavam na CDHU.

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    Ele afirma ter gritado duas vezes “sem anistia”, em protesto à articulação que Tarcísio vinha empenhando naquela semana para fazer avançar um projeto de lei que concede perdão aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro, que beneficiaria também o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), padrinho político do governador.

    A semana também era marcada pelo início do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Bolsonaro e outros sete réus do chamado “núcleo crucial” da trama golpista.

    “Vigia” e demissão

    O economista afirma que se manifestou de forma pacífica e sem ofensas. Tarcísio percebeu o grito e chegou a fazer um aceno com a cabeça, segundo Ivan.

    Pouco depois do ocorrido, ele relata ter notado que uma pessoa, supostamente da equipe do governador, sentou-se em uma lanchonete do outro lado da rua e passou a mexer no celular, sem consumir nada.

    Ele lembra que chegou a brincar com a situação, dizendo que devia estar sendo observado por um segurança de Tarcísio. O ex-funcionário suspeita que a pessoa tenha tirado fotos suas para poder identificá-lo.

    Na segunda-feira seguinte, dia 8/9, Ivan foi informado de sua demissão.

    “Segunda eu fui para o trabalho e falaram que o presidente da CDHU, o Reinaldo Iapequino, ligou no fim de semana para a Fipe, para os responsáveis do projeto, dizendo que tinha um relatório com o meu nome. E que era para me desligar imediatamente, sem explicar o porquê”, afirma o profissional ao Metrópoles.

    Segundo ele, nem mesmo a empresa de consultoria tinha conhecimento do motivo do desligamento.

    “O pessoal lá ficou meio assim, não sabia, mas o cara é o presidente da empresa [CDHU]. Pelo que as pessoas da Fipe me falaram, eles não sabiam o que estava acontecendo. O meu chefe até perguntou se tinha vazado algum vídeo meu, alguma coisa. Só que o presidente da empresa estava com o meu nome lá com ele, falou de dossiê, um relatório com tudo sobre mim e mandando me tirar da consultoria”, diz.

    Motivações políticas

    • A reportagem apurou que, internamente, chefes de Ivan na consultoria afirmaram que o decisão era, de fato, por motivações políticas, que a ordem era de cima e que “não tinha o que fazer”.
    • O economista atuava no projeto na CDHU havia cerca um ano e meio.
    • Após o ocorrido, o clima entre os funcionários é de vigilância e receio de se manifestar, pelas redes sociais ou em ambientes de trabalho.
    • “Onde está a liberdade expressão que eles [bolsonaristas] tanto defendem? Do meu ponto de vista, os principais culpados são o Tarcísio, o grupo dele e o presidente da CDHU. A Fipe foi obrigada a me demitir”, lamenta Ivan.

    O Metrópoles questionou o governo Tarcísio, mas não obtece resposta até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para manifestação. A Fipe, por meio da assessoria de imprensa, afirmou que não vai comentar o caso.