MAIS

    Ex-delegado morto foi do céu ao inferno até se tornar chefe da Civil

    Por

    O delegado aposentado Ruy Ferraz Fontes, assassinado nessa segunda-feira (15/9), em Praia Grande, no litoral paulista, viveu uma gangorra na vida profissional ao longo das últimas duas décadas, indo do céu ao inferno até se tornar o chefe da Polícia Civil em São Paulo.

    De principal responsável pelas investigações contra o Primeiro Comando da Capital (PCC) no começo do século, ele foi escanteado e conviveu com o ostracismo na virada da primeira década dos anos 2000, para então ressurgir no cargo máximo de sua corporação, em 2019.

    Foram as investigações conduzidas por Fontes que levaram à denúncia de toda a cúpula do PCC em 2006, quando o estado de São Paulo sofreu uma até então inédita onda de ataques, promovida pelo crime organizado, que parou a maior cidade do país. Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, estava entre os acusados por Fontes, que foi jurado de morte pela facção.

    Leia também

    O ex-delegado comandava, na ocasião, a prestigiada 5ª Delegacia do Patrimônio (Roubo a Banco), do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), cargo desejado por muitos na corporação.

    Do total prestígio do qual dispunha à frente das investigações contra o crime organizado, o ex-delegado sofreu uma derrocada, há 15 anos. A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) estava sob o comando de Antônio Ferreira Pinto, que anteriormente havia sido responsável pela Secretaria da Administração Penitenciária (SAP).

    31 imagensRuy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São PauloRuy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São PauloRuy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São PauloRuy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São PauloRuy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São PauloFechar modal.1 de 31

    Delegado Ruy Ferraz Fontes

    Divulgação/Alesp2 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo

    Divulgação/Prefeitura de Praia Grande3 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo

    Divulgação/Alesp4 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo

    Divulgação/Alesp5 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo

    Divulgação/Polícia Civil6 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo

    Reprodução/Prefeitura de Praia Grande7 de 31

    Ruy Ferraz Fontes, ex-delegado-geral da Polícia Civil de SP

    Divulgação/Polícia Civil de SP8 de 31

    Ruy Ferraz foi executado em Praia Grande

    Reprodução/ Vídeo cedido/ Divulgação/ Prefeitura de Praia Grande9 de 31

    O velório do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Valentina Moreira/Metrópoles10 de 31

    O velório do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Valentina Moreira/Metrópoles11 de 31

    O velório do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Valentina Moreira/Metrópoles12 de 31

    O velório do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Valentina Moreira/Metrópoles13 de 31

    Vídeo mostra dinâmica de atentado que matou o ex-delegado-geral de SP, Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/ vídeo cedido ao Metrópoles14 de 31

    Membros da mesma família foram atingidos por tiros de fuzis dos envolvidos na execução do ex-delegado

    Reprodução/Material cedido ao Metrópoles15 de 31

    O ex-delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, foi executado por criminosos em Praia Grande, litoral de São Paulo

    Reprodução/Redes Sociais16 de 31

    Ex-delegado-geral levou mais de 20 tiros de fuzil em ataque no litoral

    Reprodução/ Material cedido ao Metrópoles17 de 31

    Saiba estado de saúde de feridos em atentado contra ex-delegado de SP

    Reprodução/ redes sociais18 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança19 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança20 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança21 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança22 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança23 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança24 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança25 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança26 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança27 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança28 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança29 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Câmera de segurança30 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Redes sociais31 de 31

    A execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil Ruy Ferraz Fontes

    Reprodução/Redes sociais

    Os dois trocavam acusações mútuas, inclusive envolvendo subordinados, eram desafetos declarados e não havia qualquer resquício de confiança entre eles. Em meio às rusgas, Fontes foi parar no 69º Distrito Policial (Teotônio Vilela), na região de São Mateus, zona leste da cidade, onde foi salvo em 2010 de uma emboscada, após o Ministério Público de São Paulo (MPSP) detectar que criminosos queriam matá-lo. PMs das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) foram ao local e impediram o assassinato.

    Com Ferreira Pinto no comando da SSP, a PM ganhou protagonismo e, com o apoio do MPSP, passou a fazer o monitoramento telefônico das conversas envolvendo integrantes do PCC detidos nas penitenciárias estaduais. A estratégia gerou descontentamento generalizado entre policiais civis e tirou o prestígio do qual dispunham departamentos como o Deic, antiga casa de Fontes.

    Muitos das pessoas que participaram, mesmo que em posições subalternas, do fortalecimento da PM nos anos de Ferreira Pinto à frente da SSP, estão hoje em lugar de destaque no cenário estadual.

    Um dos exemplos é o atual secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, que atuava como tenente da Rota à época.

    Derrite participou, inclusive, de uma das ações consideradas como deflagradoras da onda de violência vivida em 2012 nas periferias da Grande SP: a morte de seis suspeitos de integrar o PCC, durante reunião em um lava-rápido na Tiquatira, zona leste da capital. Um dos criminosos era Anderson Minhano, considerado uma das vozes de Marcola fora do sistema penitenciário.

    Já secretário, Derrite também é constantemente apontado como alguém que privilegia a PM em detrimento da Polícia Civil, assim como foi Ferreira Pinto.

    Ponto crítico

    Um dos momentos críticos na relação entre o então secretário da Segurança Pública Ferreira Pinto e o delegado Fontes se deu no segundo semestre de 2011, após o roubo de uma agência do Itaú na Avenida Paulista.

    Uma quadrilha arrombou 171 cofres de clientes de alta renda do banco. Fontes foi acusado de iniciar uma investigação paralela sobre o caso, recebendo as imagens da ação criminosa antes dos colegas que deveriam ser, por prerrogativa, os primeiros a serem avisados. Ele estava no 69º DP, fora daquela jurisdição, sem as atribuições da 5ª Delegacia do Patrimônio do Deic (Roubo a Banco), em uma área sob responsabilidade do 78º Distrito Policial (Jardins).

    Somadas a essa, outras acusações de mesma natureza, sempre fortemente rechaçadas por Fontes, foram lançadas à época e levaram a uma “punição” ainda maior, possivelmente o fundo do poço na relação conflituosa entre o então secretário e o delegado que montou o organograma do PCC anos antes.

    Em 2012, em meio à onda de violência que assolou a periferia da região metropolitana, Fontes estava no 92º Distrito Policial (Parque Santo Antônio), considerado à época um “calabouço” da Polícia Civil, em uma das regiões mais violentas da zona sul da capital paulista.

    Também para lá foi enviado o então delegado titular do 89º Distrito Policial (Jardim Taboão), um exímio especialista em escutas telefônicas que participara, antes da transferência, das investigações contra policiais militares do 16º BPM, flagrados em conversas como “consultores do crime”. Os PMs eram suspeitos de prestar apoio a uma quadrilha de ladrões que invadia residências na zona oeste paulistana.

    Com a queda de Ferreira Pinto no fim de 2012, Fontes recuperou sua trajetória ascendente, chefiando, entre outros, o Departamento de Narcóticos (Denarc). Anos depois, já em 2019, durante a gestão de João Doria (então no PSDB), ele ocupou o cargo de delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, o cume da corporação, onde permaneceu até 2022.

    Entre pessoas que conviveram tanto com Fontes quanto com Ferreira Pinto, é comum a afirmação de que as divergências entre os dois tinham avançado para um plano pessoal, muito além da forma como ambos enxergavam as questões relacionadas à segurança pública.

    O Metrópoles procurou o ex-secretário, nesta terça-feira (16/9), mas não houve resposta até a publicação da reportagem. O espaço segue aberto para manifestação.

    Dois suspeitos da execução já identificados

    A Polícia Civil de São Paulo identificou um segundo suspeito de envolvimento na execução do ex-delegado-geral Ruy Ferraz Fontes.

    Segundo o secretário de Segurança Pública do estado (SSP), Guilherme Derrite, o indivíduo foi identificado após uma perícia no local. “Seguimos com todas as polícias empenhadas nesse caso, para que os culpados sejam punidos”, escreveu Derrite nas redes sociais, acrescentando que solicitará a prisão temporária dos dois suspeitos.

    Mais cedo, na manhã dessa terça-feira (16/9), o secretário havia afirmado que o primeiro suspeito também tinha sido identificado. Questionado sobre o envolvimento do crime organizado, uma vez que a SSP atribuiu inicialmente o crime ao Primeiro Comando da Capital (PCC), Derrite afirmou que as informações serão divulgadas em momento oportuno.

    O secretário também se negou a divulgar o nome para não atrapalhar as investigações. “O que eu posso falar é que já temos a identificação e a qualificação e o pedido de prisão vai ser feito agora, ainda hoje”, disse.

    “Ele está, obviamente, nesse momento, tentando fugir. Esse primeiro indivíduo identificado e qualificado, para nós, é fundamental que consigamos realizar a prisão dele para que, a partir de então, consigamos capturar todos os envolvidos”, continuou.

    Segundo Derrite, o suspeito já foi preso diversas vezes, e também apreendido quando ainda era menor de idade. Ele, no entanto, não seria um dos atiradores, e a polícia ainda apura qual foi a participação dele no crime, afirmou o secretário-adjunto da SSP, Osvaldo Nico.

    O que a polícia já sabe sobre a execução

    A polícia usa imagens de câmeras de segurança para estabelecer a dinâmica do crime e afirma já ter dois suspeitos identificados.

    Um vídeo obtido pelo Metrópoles mostra o momento em que os criminosos deram início à emboscada que resultou na morte do ex-delegado. Eles estacionaram um carro em uma rua próxima da Prefeitura de Praia Grande , onde a vítima trabalhava como titular da Secretaria de Administração, às 18h02.

    Veja o vídeo:

    Após 14 minutos, o veículo de Ruy Fontes aparece na gravação, passa ao lado dos criminosos e é alvo de tiros. Ruy tenta fugir, mas é perseguido, bate o carro em um ônibus após cerca de 2,5 km e é executado.

    Outras duas pessoas que estavam próximas do local do ataque ficaram feridas durante a ocorrência, segundo a prefeitura municipal. As vítimas foram transferidas para o Hospital Municipal Irmã Dulce. Uma mulher ficou com ferimentos leves e um homem segue internado para atendimento médico, sem maiores riscos.

    Nenhuma linha de investigação é descartada

    Autoridades da SSP não descartam a participação de agentes públicos na execução de Ferraz. Além de ter sido inimigo número 1 do PCC quando atuava como delegado, Ruy Ferraz tinha inimizades dentro da polícia e trabalhava como secretário de Administração em Praia Grande, onde pode ter contrariado interesses locais. Oficialmente, nenhuma hipótese é descartada pela cúpula da SSP.

    A suspeita sobre a possibilidade de envolvimento de agentes públicos no crime brutal surgiu após análise dos vídeos que flagraram o atentado. As imagens mostram uma ação coordenada dos quatro executores, com sinais de conhecimento operacional. Ao todo, mais de 20 tiros foram disparados na ação.

    Na gravação captada por uma câmera de segurança na Avenida Roberto de Almeida Vinhas, na Vila Mirim, o ex-delegado aparece sendo perseguido, até bater seu carro contra um ônibus e capotar. Nesse momento, três criminosos encapuzados desembarcam do carro de trás. Dois começam a atirar enquanto o terceiro faz uma espécie de contenção. Na sequência, eles retornam ao veículo e deixam o local.

    Internamente na Polícia Civil, a ação tem sido comparada à execução do corretor de imóveis Vinícius Gritzbach, delator do PCC morto com 10 tiros de fuzil no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. De acordo com as investigações, três policiais militares teriam sido contratados pela facção para executar o crime.

    Autoridades ligadas à investigação afirmam ser prematuro chegar a qualquer conclusão, e dizem que não se pode descartar nenhuma hipótese.

    Possível vingança

    Entre as linhas de investigação sobre o mando do crime, a força-tarefa acredita em uma possível vingança do PCC. Ruy Ferraz atuou na transferência algumas das principais lideranças para presídios federais de segurança máxima, como Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola.

    Além disso, também é considerada a hipótese de que o crime esteja relacionado com a atual função de Ruy Ferraz, que ocupava o cargo de Secretário de Administração de Praia Grande. Nesse caso, o envolvimento de agentes públicos e do PCC também não é descartado.

    Quem era Ruy Ferraz

    • Ruy Ferraz Fontes atuou por mais mais de 40 anos Polícia Civil de São Paulo era especialista na facção criminosa PCC.
    • Ele iniciou a carreira como delegado de polícia titular da Delegacia de Polícia do Município de Taguaí, do Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior (Deinter) 7.
    • Durante a vida profissional, foi delegado de Polícia Assistente da Equipe da Divisão de Homicídios do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP).
    • Também atuou como delegado de Polícia Titular da 1ª Delegacia de Polícia da Divisão de Investigações Sobre Entorpecentes do Departamento Estadual de Repressão ao Narcotráfico (Denarc).
    • Além disso, Ferraz foi delegado de Polícia Titular da 5ª Delegacia de Polícia de Investigações Sobre Furtos e Roubos a Bancos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e comandou outras delegacias e divisões na Capital.
    • O então secretário de Administração de Praia Grande também esteve à frente da Delegacia Geral de Polícia do Estado de São Paulo e foi Diretor do Departamento de Polícia Judiciária da Capital (DECAP).
    • Ele ainda foi professor Assistente de Criminologia e Direito Processual Penal da Universidade Anhanguera e atou como Professor de Investigação Policial pela Academia da Polícia Civil do Estado de São Paulo (Acadepol).
    • Ruy assumiu a Secretaria de Administração de Praia Grande em janeiro de 2023, permanecendo na gestão que se iniciou em 2025, até ser morto nessa segunda-feira.
    • O policial também foi o primeiro delegado a investigar a atuação do PCC no estado, enquanto chefiava a Delegacia de Roubo a Bancos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), no início dos anos 2000.
    • Ele foi jurado de morte por Marco William Herbas Camacho, o Marcola, apontado como líder máximo do PCC, em 2019, após o criminoso ser transferido para o sistema penitenciário federal.