O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) determinou, nesta quarta-feira (17/9), o encerramento imediato das atividades do Instituto Terapêutico Liberte-se. Uma das unidades da clínica foi alvo de denúncias de cárcere privado, maus-tratos e outras violações de direitos humanos, bem como das prisões dos coordenadores da unidade, no Lago Oeste.
A decisão também requer que os proprietários do instituto adotem providências administrativas, a distância, para implementar tal medida, inclusive a desinternação dos pacientes.
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), por meio da 5ª Promotoria Regional de Defesa de Direitos Difusos (Proreg) e o Núcleo de Direitos Humanos (NDH) instaurou, nesta quarta-feira (17/9), um procedimento preparatório para investigar as denúncias de graves violações de direitos humanos envolvendo a clínica.
O documento ressalta que o fato de “uma instituição operar por anos de forma irregular, violando sistematicamente normas federais e regulamentares, sem qualquer fiscalização efetiva, evidencia uma grave omissão do Poder Público Distrital”.
Segundo o MPDFT, a resposta do Conselho de Política sobre Drogas (Conen-DF), confirmando que a entidade não tinha qualquer credenciamento, “corrobora tal cenário”.
As apurações do MPDFT tiveram início a partir de uma denúncia encaminhada pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, que relatava práticas de internação involuntária, condições insalubres, maus-tratos e possível trabalho forçado.
9 imagens
Fechar modal.
1 de 9
Internos relatam rotina de horror em clínica
Material cedido ao Metrópoles2 de 9
Hugo Barreto/Metrópoles 3 de 9
Cinco pessoas morreram durante um trágico incêndio em uma clínica de recuperação
Hugo Barreto/Metrópoles @hugobarretophoto
4 de 9
Lugar funcionava clandestinamente
Hugo Barreto/Metrópoles
@hugobarretophoto5 de 9
Pastora presa nega fechamento de clínica
Material cedido ao Metrópoles6 de 9
Delegado não descarta crime de cárcere privado
Hugo Barreto/Metrópoles
@hugobarretophoto7 de 9
O Corpo de Bombeiros conteve as chamas e levou as vítimas aos hospitais regionais de Sobradinho (HRS) e da Região Leste, no Paranoá (HRL)
Hugo Barreto/Metrópoles
@hugobarretophoto8 de 9
As causas do início do fogo são desconhecidas. A 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá) investiga o caso
Hugo Barreto/Metrópoles
@hugobarretophoto9 de 9
Atualmente, a clínica contava com mais de 20 internos
Hugo Barreto/Metrópoles
@hugobarretophoto
Leia também
-
“Grave omissão”, diz MPDFT sobre clínica acusada de cárcere privado
-
Pacientes eram contidos e levados à força para a clínica, diz delegado
-
Vídeos detalham maus-tratos em clínica interditada: “Não verá sua mãe”
-
Filial de clínica que pegou fogo e matou 5 tem abuso sexual e tortura
Requerimentos
A medida ocorre um dia após operação da Polícia Civil (PCDF) na unidade do Lago Oeste, que prendeu em flagrante os responsáveis pela instituição, pelo crime de cárcere privado de 27 pacientes.
Relatos colhidos pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara Legislativa (CLDF) apontam indícios de supostas práticas de “tortura, violência sexual e trabalho análogo à escravidão”.
O MPDFT determinou o envio de ofícios à 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho 2), à Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus) e ao Conselho de Política sobre Drogas do DF (Conen), para reunir informações sobre as medidas administrativas, criminais e de fiscalização que foram ou serão adotadas, bem como sobre o plano de assistência aos pacientes que estavam internados nas unidades da Liberte-se. As instituições têm 10 dias para responder.
Internação involutária
O delegado-chefe da 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho II), Ricardo Viana, confirmou ter recebido, nessa terça-feira (16/9), diversos relatos que denunciam a prática criminosa. Os pacientes afirmaram, por exemplo, que eram levados à força para a clínica.
“Alguns internos nos relataram terem sido pegos em casa e levados à clínica. Trata-se, então, de uma forma de internação involuntária: a clínica pegava o paciente no interior da residência, fazia a contenção, levava à força para o estabelecimento e lá eles ficavam, não tinham condições de sair”, afirma Ricardo Viana, da 35ª DP, delegacia responsável pelas investigações.
Os familiares dos pacientes podem ser responsabilizados judicialmente por levá-los até a clínica, de acordo com o delegado, caso fique evidenciado o consentimento dos parentes em deixar as vítimas serem levadas à força para a casa de recuperação.
Maus-tratos, violência sexual e mais
As denúncias feitas por internos da unidade do Lago Oeste do Instituto Terapêutico Liberte-se apontam trabalho forçado e não remunerado, tortura, maus-tratos, violência sexual, cobranças abusivas e falta de assistência médica adequada.
Os internos disseram, por exemplo, que sofrem abusos sexuais constantemente, sobretudo aqueles com transtornos mentais. Há ainda denúncias de episódios de pessoas enforcadas, amarradas com cordas e trancadas em quartos superlotados.
A unidade do Lago Oeste também não oferecia assistência médica adequada. Alguns pacientes usavam psicotrópicos como quetiapina e rivotril sem prescrição clara, além de não contarem com a presença de psicólogos e psiquiatras na clínica — quem quisesse se consultar, tinha que desembolsar R$ 300 para uma consulta online. Quem dão os medicamentos são monitores não formados na área médica.
As famílias dos acolhidos já pagam entre R$ 1.600 e R$ 1.800 de mensalidade pela internação e, ainda assim, pagam alimentação por fora e também têm que arcar com gastos como taxa de deslocamento. Se o paciente está com algum problema de saúde e solicita ir ao médico, por exemplo, é cobrado dele um valor entre R$ 150 e R$ 200.
Prisões
Três pessoas, de 40, 46 e 49 anos, foram presas pela Polícia Civil do DF (PCDF), que foi acionada pela CDH logo após a visita. Trata-se do casal de pastores donos da unidade do Lago Oeste e de um coordenador da mesma filial.
A 35ª DP ouviu 27 internos antes de prender em flagrante os coordenadores. Eles responderão pelo crime de cárcere privado.