Portal Estado do Acre Notícias

Labubu e curupira: a mágica do soft power (por Marcos Magalhães)

labubu-e-curupira:-a-magica-do-soft-power-(por-marcos-magalhaes)

Labubu e curupira: a mágica do soft power (por Marcos Magalhães)

A febre ainda não contagiou de vez o Brasil. Mas o Labubu, nascido na China, é um fenômeno de vendas na Europa e nos Estados Unidos. E a República Popular, talvez pela primeira vez, consegue emplacar no Ocidente um exemplo de seu soft power.

Existem filas para comprar os pequenos monstrinhos, que fizeram as vendas da empresa chinesa Pop Mart saltar 200% no primeiro semestre de 2025, em relação ao mesmo período do ano anterior. Nada menos que 1,6 bilhão de euros.

Em reportagem sobre o tema, a TV franco-alemã Arte entrevistou uma adolescente do Qatar, que relatou a adoração dos jovens de seu país pelo bichinho.

“Quando as pessoas descobrem que a origem do Labubu é a China, elas querem ir para lá conhecer mais versões”, disse a jovem. “Isso cria uma melhor imagem da China”.

Como ressalta a reportagem, é uma mudança e tanto. Há poucos anos, os produtos chineses eram vistos como de má qualidade. Muitas vezes, como se repetiram as acusações em várias partes do mundo, cópias de produtos ocidentais.

Agora, a China começa a ser reconhecida por sua capacidade tecnológica. Seus carros elétricos, por exemplo, questionam antigas certezas de tradicionais compradores das mais famosas marcas alemãs. O país lidera, também, em equipamentos destinados à produção de energia renovável.

Mas tudo isso, até aqui, tem atraído apenas decisões racionais de consumidores. Se o produto tem boa tecnologia e soa contemporâneo, ponderam, pode merecer pelo menos uma chance. De carros a televisores e aparelhos de ar-condicionado.

Os americanos sempre foram orgulhosos de sua conquista de corações e mentes, após a Segunda Guerra Mundial. Além de bens industriais, agora menos cotados, eles espalharam pelo planeta a sua visão de mundo, por meio do cinema, da música e da TV.

Se os produtos chineses ganham cada vez mais mercado, isso se deve à conquista das mentes consumidoras. Agora chega a parte mais difícil. Dá para conquistar também corações? É possível competir com os americanos na busca de simpatia pelo mundo?

O Labubu pode ser um primeiro caso de sucesso. Trata-se de um personagem criado pelo artista Kasing Lung, nascido em Hong Kong e criado na Holanda. Ela integra a série de histórias The Monsters, de Lung, que se declarou influenciado pelo folclore nórdico.

É claro que o fenômeno de vendas caiu nas graças de Pequim. “Labubu demonstra o apelo da criatividade, da qualidade e da cultura chinesa em uma linguagem que o mundo entende”, registrou a agência estatal de notícias Xinhua. Um exemplo do que a agência chamou de uma “China descolada”.

O sucesso do monstrinho indica que a busca de influência da China continua firme e forte. E o Brasil? Já começou a imaginar alguma estratégia nesse sentido?

O sucesso da nova geração de filmes brasileiros pode ser um bom sinal. Ainda estou aqui conquistou neste ano o Oscar de melhor filme estrangeiro. O Agente Secreto levou o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes.

Essas raras conquistas parecem ecos de um tempo, entre o fim dos anos 1950 e início dos 1960, em que a cultura brasileira se espalhava pelo mundo, por meio do próprio cinema, mas também do futebol, da música e da arquitetura.

Mas ainda parece faltar uma estratégia nacional de divulgação da imagem e da cultura do país neste início de século 21. Imagem que acolha algumas das melhores qualidades do país – embora contestadas por vozes radicalizadas – como o compromisso com o meio ambiente, a paz e o combate à pobreza.

O símbolo da COP-30, que reunirá representantes de todo o mundo em Belém para discutir a mudança climática, será o Curupira, personagem do folclore brasileiro identificado com a proteção das florestas.

Seus pés são virados para trás, como artifício para iludir os que tentam seguir os seus passos. E os cabelos têm a cor de fogo. A imagem do simpático personagem vai correr o mundo assim que começar a conferência de Belém, em 10 de novembro.

Uma boa tentativa. Apesar de sua conexão com a mais do que urgente defesa das florestas, em tempos de crise climática, porém, ele dificilmente poderia concorrer, em prestígio, com o monstrinho de pelúcia vindo da China.

O Curupira pode ser um primeiro passo. E o Brasil precisa certamente de vários outros, para ajudá-lo na cada vez mais intensa competição por corações e mentes em todo o mundo.

 

Marcos Magalhães. Jornalista especializado em temas globais, com mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Southampton (Inglaterra), apresentou na TV Senado o programa Cidadania Mundo. Iniciou a carreira em 1982, como repórter da revista Veja para a região amazônica. Em Brasília, a partir de 1985, trabalhou nas sucursais de Jornal do Brasil, IstoÉ, Gazeta Mercantil, Manchete e Estado de S. Paulo, antes de ingressar na Comunicação Social do Senado, onde permaneceu até o fim de 2018.

Sair da versão mobile