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Não se deveria relegar Eduardo Tagliaferro ao limbo do bolsonarismo

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Não se deveria relegar Eduardo Tagliaferro ao limbo do bolsonarismo

O ex-assessor do TSE e perito criminal Eduardo Tagliaferro disse ao jornalista Paulo Cappelli que, se tivesse denunciado antes as lambanças do tempo em que trabalhava sob o comando de Alexandre de Moraes, ele “estaria morto”. Ou melhor, supostas lambanças, porque seguro morreu de velho.

Atualmente, Eduardo Tagliaferro está na Itália. Refugiou-se lá antes que o ministro decretasse a sua prisão, sob a acusação de que ele violou sigilo funcional.

Faça-se o retrospecto necessário.

Em 2022, Alexandre de Moraes o nomeou assessor-chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do TSE. Nessa função, ele diz ter visto muitas coisas erradas, e parte dessas coisas erradas apareceu publicada na Folha de S.Paulo, em agosto do ano passado.

Graças ao jornal, soube-se que, durante e depois das eleições de 2022, o gabinete de Alexandre de Moraes no STF enviou mensagens à Justiça Eleitoral, fora do radar oficial, ordenando a produção de relatórios para embasar decisões do próprio ministro contra bolsonaristas no inquérito das fake news.

A maior parte das mensagens às quais a Folha teve acesso foi trocada entre o juiz Airton Vieira, do gabinete de Alexandre de Moraes, e Eduardo Tagliaferro. Em uma delas, o primeiro pediu ao segundo para usar a “criatividade” contra a revista Oeste.

Não é preciso dizer, mas digo mesmo assim, que o conteúdo revelado  pelo jornal seria suficiente para derrubar todos os envolvidos, estivéssemos em latitude civilizada.

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Acontece que, bem antes de o material vir à tona, Eduardo Tagliaferro havia sido demitido do TSE, acusado de violência doméstica — e, assim, ele se tornou o principal suspeito do vazamento para o jornal.

Ao perceber que seria alvo de Alexandre de Moraes, Eduardo Tagliaferro escapuliu para a Itália e lá está, pondo a boca no trombone. O ministro pediu a sua extradição.

Há pouco tempo, surgiram mais evidências de lambanças (supostas, por favor) perpetradas no TSE, no âmbito do inquérito sobre os atos antidemocráticos. Os jornalistas Eli Vieira e David Ágape tiveram acesso a outro lote de mensagens, desta vez sobre os participantes do quebra-quebra de 8 de janeiro.

Como o poço brasileiro não tem fundo, soube-se também que havia (sempre supostamente) um gabinete de inteligência clandestino no tribunal, que fornecia “atestados ideológicos” sobre os detidos do  8 de janeiro, usados (supostamente outra vez) por Alexandre de Moraes para decidir sobre quem seria mantido preso ou não.

No dia em que começou o julgamento de Jair Bolsonaro e dos demais réus do núcleo principal da tal trama golpista, Eduardo Tagliaferro falou à Comissão de Segurança Pública do Senado, em coreografia idealizada por Flávio Bolsonaro.

No seu depoimento, ele apresentou documentos que mostrariam que um relatório teve a data adulterada para justificar a operação da Polícia Federal contra empresários que trocaram mensagens, em grupo privado, mostrando inconformismo com a eleição de Lula.

De acordo com Eduardo Tagliaferro, o relatório sobre as mensagens foi confeccionado depois da publicação de uma reportagem de Guilherme Amado, ex-colunista do Metrópoles, o mesmo que noticiou que Filipe Martins havia viajado para os Estados Unidos, viagem que nunca feita e que motivou a prisão preventiva do ex-assessor especial de Jair Bolsonaro. A data do relatório, no entanto, foi mudada para parecer que o ministro se baseou em apuração técnica, não em matéria jornalística, para mandar que a PF fosse atrás dos empresários.

“Foi pedido para que se confeccionasse um parecer, relatório, com data retroativa, e eu assinando pelo Supremo Tribunal Federal, ao qual eu não era nomeado”, disse Eduardo Tagliaferro à comissão do Senado. O pedido seria do próprio Alexandre de Moraes, segundo afirma ele.

O ex-assessor do TSE não mediu palavras: “Trata-se de manipulação e criação de uma investigação que nunca existiu e colocada a data de busca e apreensão justamente para justificar que essa busca e apreensão não se deu somente com base numa matéria jornalística e sim, fraudulentamente, com base numa investigação que nunca existiu”.

Eduardo Tagliaferro também afirmou à comissão do Senado que Alexandre de Moraes combinava com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, quais seriam as denúncias que seriam feitas pela PGR aos Tribunais Regionais Eleitorais.

Por meio da sua assessoria no STF, o ministro negou qualquer irregularidade à imprensa que o procurou.

Vivemos tempos complicados, e o simples fato de tocar em determinados assuntos pode ser usado contra você, mas não se deveria relegar Eduardo Tagliaferro ao limbo do bolsonarismo. As acusações dele são graves demais e estão acompanhadas de documentos que precisariam ser periciados por profissionais independentes.

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