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Promotor cita “disputas institucionais” em investigações do PCC

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Promotor cita “disputas institucionais” em investigações do PCC

O promotor de Justiça de São Paulo, Lincoln Gakiya, citou em entrevista ao Acorda, Metrópoles desta quarta-feira (17/09) o que chamou de “disputas institucionais” entre agentes de segurança pública no combate a facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Gakiya é um dos principais investigadores do PCC em São Paulo e conheceu o delegado Ruy Ferraz, assassinado em Praia Grande (SP). O promotor também está na lista de jurados de morte da facção paulista.

Na entrevista, o promotor afirmou que a falta uma articulação entre as forças estaduais e federais atrapalha a efetividade do combate ao crime organizado.

“Só se pode combater esse fenômeno hoje agindo de maneira integrada com outras instituições, em trabalho multiagências, com várias instituições ao mesmo tempo. E o que eu vejo aqui, e isso é um desabafo, já há 34 anos, são disputas institucionais por pedaços de poder. Sejam entre polícias, estaduais e federal, cada um quer a primazia para si do controle ou do poder de organizações criminosas”, afirmou.

O promotor citou a PEC da Segurança Pública, uma das principais apostas do governo federal para a segurança pública, que pretende aumentar a atuação da Polícia Federal (PF) em crimes envolvendo facções, mas disse que a estratégia deveria ser de “integração e coordenação” entre todos os órgãos.

“Não se pode desprezar a cooperação das outras forças. A gente está falando aí de uma Polícia Federal que tem 12 mil homens extremamente qualificados, mas a gente está falando de forças estaduais que tem mais de 500 mil policiais, não é? Então não é possível, e mesmo assim não está dando certo. Nós estamos perdendo”, pontuou.

Outro plano do governo federal também foi alvo de comentários do promotor: o projeto de lei antimáfia, que planeja implementar novas diretrizes para o combate a facções. A criação de uma agência nacional voltada ao enfrentamento de organizações criminosas foi aventada, mas enfrenta resistências por parte da Polícia Federal.

Gakiya afirma que defende que esse combate seja feito por meio de forças-tarefas que englobam diferentes instituições, mas sem estar sob o comando seja da PF ou do Ministério Público porque “esse modelo não funciona”.

Segundo o promotor, a ideia da criação de uma agência nasceu de conversas de um grupo de trabalho formados por uma série de representantes dessas instituições de segurança pública para a elaboração do projeto, no qual foi debatida a criação de uma agência de combate a máfias.

“Seria um órgão federal que pudesse coordenar esses esforços, centralizar esses esforços, e dele fariam parte a Polícia Federal, a PRF, o Banco Central, através da COAF, a Receita Federal, os Ministérios Públicos Federal e estaduais e as Polícias estaduais”, afirma.

Ele cita como exemplos de forças-tarefas as recentes operações da PF e do Ministério Público contra organização criminosa atuante no mercado de gasolina. Em um mesmo dia, três operações foram deflagradas, de forma coordenada, para esse fim.

“Você não imagina o esforço de reunir essas instituições para atuar numa mesma investigação formada por agentes com a formação profissional diferente, a própria formação institucional diferente e com interesses diferentes. Então, a gente precisa de ter, assim como existe na Itália, existe no Reino Unido, existe na França, nos Estados Unidos, uma agência que possa coordenar, uma agência que tenha uma autoridade central”, ressalta.

O promotor, no entanto, faz uma ressalva sobre o problema hoje vivido com relação às facções, que passaram a atuar não mais em apenas estados específicos, mas se nacionalizaram.

Segundo Gakiya, em meados dos anos 2000, quando o PCC passava a ser investigado em São Paulo, as autoridades tinham uma atitude de “negação” da existência desse fenômeno das organizações criminosas, que desde então só se expandiu.

Ele cita que um primeiro mapeamento amplo sobre a atuação do PCC foi feito apenas em 2012, em uma investigação da qual participou e resultou em uma denúncia contra o Marcola, um dos líderes da facção.

“Passaram muitos anos para que o Estado fizesse o seu dever de casa. Enquanto isso, a facção, ela se expandiu não só fora do sistema prisional, ganhou as ruas e dominou o tráfico aqui no Estado de São Paulo, como se expandiu para outros Estados. Hoje, o PCC está presente em todos os Estados da Federação, em maior ou menor número que outras facções, e também em 28 países. Enquanto isso, os governos, federal e estadual, não tiveram nenhuma atitude, pelo menos minimamente articulada”, conclui.

Execução de delegado

Como mostrou a coluna, embora ainda não haja comprovação da atuação do PCC na execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, morto na segunda-feira em Praia Grande (SP), essa é uma das vertentes investigadas pelas autoridades.

Na entrevista ao Acorda Metrópoles, Gakiya afirmou que seu assassinato é um desestímulo para investigadores que se dedicam ao combate de facções no Brasil. Ao longo de sua carreira, fontes investigou a fundo o PCC e era jurado de morte pelo grupo.

O promotor também criticou o fato de não haver nenhuma legislação específica vigente no país que proteja casos como o do ex-delegado, e como o dele próprio, que também é jurado de morte pela facção.

“Isso é muito grave, a gente não tem nenhuma legislação no país que dê guarida a casos como o do Dr Ruy. O meu, inclusive, também, e desestimula outros investigadores, promotores, juízes a continuar nesse trabalho de combate a essas organizações criminosas”, afirmou.

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