A região da 25 de Março é a “boca de dragão” para motoboys que transportam cargas valiosas, como equipamentos eletrônicos, e são alvos de quadrilhas violentas que não hesitam em atirar mesmo em meio à multidão que circula pela mais famosa área de comércio popular de São Paulo. Os assaltos são tão rotineiros quanto a escolta armada realizada como bico extraoficial por policiais militares, num bang-bang à paulista.
Na tarde do dia 18, um motoboy foi baleado na cabeça durante uma tentativa de assalto nas proximidades da esquina entre as ruas Barão de Duprat e Carlos de Souza Nazaré, que fazem parte da região da 25 de Março.
Um suspeito de ter cometido o crime foi baleado, segundo as autoridades, por um policial militar de folga que passava pelo local. A tentativa de assalto não foi um fato isolado, como mostram depoimentos e imagens obtidos pelo Metrópoles e que entregadores atribuem à região. Tanta violência levou motoboys a fazerem um protesto na última segunda-feira (20/10) cobrando mais segurança.
Motoboys na região central de São Paulo
William Cardoso/Metrópoles
Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na região central de São Paulo
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Motoboys na Rua Santa Ifigênia, em São Paulo
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Motoboys na Rua Santa Ifigênia, em São Paulo
William Cardoso/Metrópoles
Os motoboys que trabalham nas regiões da 25 e da Rua Santa Ifigênia, separadas por 1 km de distância, têm um perfil diferente daquele associado aos entregadores de aplicativo, seja pela remuneração, que pode chegar a R$ 600 por dia a depender da época do ano, ou pelo valor da carga que transportam. Saem as refeições e lanches e entram Iphones, notebooks e todo tipo de eletrônico que é vendido por lojas e quiosques em lugares como a Galeria Pagé e o Shopping Mundo Oriental.
A cargas são valiosas e, de acordo com os motoboys, podem chegar ao equivalente a R$ 500 mil em produtos, em uma única corrida, em alguns casos específicos. Eles são contatados diretamente pelos lojistas para fazerem as entregas.
Na prática, é como se a moto se transformasse em uma espécie de carro-forte, mas sem blindagem e exposta à ação de criminosos. Segundo os entregadores, é quase certo que informantes avisem os ladrões sobre o conteúdo de cada carregamento. É “fita dada”.
Por toda essa situação, um dos motoboys com quem a reportagem conversou no bolsão de estacionamento da Rua Carlos de Souza Nazaré chamou o local de “boca de dragão”, uma gíria usada para descrever lugares onde se reúnem muitos criminosos.
Arapuca
Motoboy há 18 anos, Marcelo Duty afirma que assaltos a entregadores ocorrem também dentro do Mercado Kinjo Yamato, em eterna reforma, chamado pela categoria de “mercado chinês”, ladeado pelas Ruas Barão de Duprat e Carlos de Souza Nazaré, paralelo ao Mercado Municipal.
Os ladrões seguem os entregadores desde o Shopping Mundo Oriental ou da Galeria Pajé e fazem a abordagem dentro do mercado, que é usado como atalho que seria, em teoria, mais seguro do que caminhar pela Barão de Duprat até o bolsão de estacionamento das motos.
Segundo Duty, na maioria dos roubos, os ladrões correm após a ação para um lugar conhecido como “vilinha”, uma rua estreita chamada Serop Kherlakian, que liga a Barão de Duprat à 25 de Março.
“Eles se embrenham por lá e não temos mais contato. É a nossa vida. Somos pais de família, não temos como correr atrás deles, porque estão armados, e estamos sujeitos a acontecer conosco o que aconteceu no sábado [motoboy baleado no dia 18]”, diz.
Um guardador de motos da região afirmou à reportagem que já chegou a ver oito assaltos em um único dia na sua área de atuação.
“Ladrão, ladrão”
Uma carga de celulares avaliada em cerca de R$ 70 mil atraiu a atenção de assaltante e quase acabou com a vida de um motoboy que trabalha há seis anos na região.
Quando se aproximava do portão de saída do Kinjo Yamato nas proximidades do bolsão de motos, o entregador percebeu a movimentação de cinco ladrões.
“Vieram dois para me grudar, corri para uma barraca de frutas e eles tentaram de todo jeito me pegar. Gritei ‘ladrão, ladrão, socorro’. O pessoal que estava fazendo compras gritou também e eles saíram correndo”, diz. Um outro motoboy ainda tentou ir atrás de um dos integrantes do bando, que disparou, mas não acertou ninguém.
O motoboy diz que assaltos fazem com que entregadores percam clientes, seja pela desconfiança de lojistas em relação à ocorrência do crime ou por acharem que houve descuido com a carga, mesmo quando imagens comprovam a ação das quadrilhas.
No caso relatado pelo motoboy, câmeras de segurança flagraram a aproximação dos bandidos, a tentativa de abordagem e a fuga para dentro da banca de frutas. No registro, aparece a data de 5 de abril, às 14h03.
Uma cena chama bastante a atenção. Depois que o motoboy consegue fugir dos ladrões, escuta-se um tiro e uma família que passava pelo local, com uma criança, se desespera e tenta se proteger em uma banca de frutas.
Imagens gravadas por motoboys mostram um membro da quadrilha de assaltantes sendo detido por PMs, após o disparo no Kinjo Yamato.
Perseguição
“Vim coletar mercadoria aqui na 25 de Março e um indivíduo me seguiu. Não tinha saído ainda aqui da região, na Rua Cavalheiro [Basílio Jafet], ele tentou me dar o bote, só que sou bem conhecida aqui, o pessoal me ajudou e, graças a Deus, não tive nada roubado. Foi só a tentativa mesmo”, diz a motogirl Helloá Crystine Silva Rocha, de 25 anos.
A preocupação da entregadora todas as vezes que passa pela região da 25 de Março é grande. “A luta nossa de cada dia é ter uma base policial que possa passar para a gente uma confiança”, afirma. “A gente já vem coletar aqui com aquela insegurança, é bem visado, tanto em relação às mercadorias quanto às motos”, diz. Em razão dos valores que a gente carrega, ficamos muito visados.”
A situação vivida por Helloá, de ser perseguida depois da coleta do produto, não é incomum na vida dos entregadores.
Em outro ponto da região central que também concentra a venda de produtos eletrônicos, a Santa Ifigênia, um motoboy contou à reportagem que foi assaltado há cerca de dois meses. Os bandidos sabiam que ele estava com produtos de valor e fizeram a abordagem quando se preparava para deixar a entrega na casa do cliente.
A preocupação dos motoboys aumenta com a chegada do fim do ano, período em que o volume de entregas aumenta consideravelmente, impulsionado pela black friday e pelo Natal. Eles sabem que os ladrões também acompanham essa movimentação do comércio.
O que diz a SSP
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma que o caso ocorrido no último dia 18 está sob investigação da 1ª Central Especializada de Repressão a Crimes e Ocorrências Diversas (Cerco). A unidade coleta imagens de câmeras de segurança para auxiliar na apuração dos fatos e identificar os envolvidos.
A SSP diz que intensificou as ações no centro de São Paulo, uma das prioridades da atual gestão, com foco no combate ao crime organizado e na redução dos índices de criminalidade. “Foram reforçados o policiamento ostensivo e a Atividade Delegada, com mais 400 policiais militares e 1,7 mil vagas adicionais, além de incentivos salariais para atuação noturna e em áreas estratégicas. Das 11 bases comunitárias previstas, sete já estão em funcionamento em pontos estratégicos do centro, com investimento superior a R$ 4 milhões”, diz.
Segundo a pasta, em 32 meses, foram 18,3 mil prisões e apreensões, 558 armas retiradas das ruas, 1.427 veículos recuperados e 6,8 toneladas de drogas apreendidas.
A Polícia Civil diz que mantém investigações permanentes contra crimes patrimoniais, incluindo os praticados por falsos entregadores de delivery. “Esses esforços, aliados ao reforço do policiamento preventivo em pontos de maior incidência criminal, permitiram que São Paulo atingisse o menor índice de roubos dos últimos 25 anos”, diz.
Segundo a SSP, a região central, que integra a área da 1ª Delegacia Seccional – Centro, apresenta reduções nos índices criminais. “Entre janeiro e agosto deste ano, os roubos em geral caíram 19,11%, enquanto os roubos de carga diminuíram 52,48%, em comparação com o mesmo período de 2024. No mesmo intervalo, 5.202 pessoas foram presas ou apreendidas, representando um aumento de 4,5% nas detenções em relação ao ano anterior”, afirma.
O que diz a Prefeitura de São Paulo
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana afirma que a região da Rua 25 de Março conta com patrulhamento ostensivo da Guarda Civil Metropolitana e reforço da Operação Delegada.
A administração municipal diz que são 170 vagas disponíveis diariamente para policiais militares com o objetivo de apoiar a Subprefeitura Sé na fiscalização de comércio irregular. “Aliás, a atual gestão mais que dobrou as vagas na Operação Delegada na cidade, subindo de 1.063 em 2020 para 2.400 atualmente. O efetivo da GCM também aumentou em 26% no mesmo período, passando de 5.955 para 7.500”, diz, em nota.
Segundo a prefeitura, a região do centro conta com o suporte de 9.000 câmeras do programa Smart Sampa.
