Em sua recente participação no podcast Call Her Daddy, Kim Kardashian abriu o jogo e o coração sobre um tema delicado: a rotina da coparentalidade após o divórcio de Kanye West.
Longe dos flashes e dos tapetes vermelhos, a empresária de 44 anos revelou que o ex-marido “não telefona para os filhos há alguns meses” e que tem criado as crianças em tempo integral.
“Eles moram comigo, e eu sempre incentivo uma relação boa e saudável entre meus filhos e o pai deles. Acho que ele sabe disso — eu insisto nisso o tempo todo —, mas também os protejo quando é necessário. Tudo acontece em ondas e fases”, contou.
Kim explicou que, embora Kanye tenha direito de conviver com as crianças, sua presença tem sido intermitente. Ela nega, no entanto, os rumores de que impediria o rapper de vê-los.
“Isso não é verdade de forma alguma”, garantiu, afirmando que tem provas de mensagens e ligações trocadas entre eles.
A confissão da estrela e mãe de North, Saint, Chicago e Psalm, acendeu um debate global sobre a coparentalidade moderna: quando o ideal da guarda compartilhada se choca com a realidade da sobrecarga feminina.
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Kim Kardashian e filhos
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O que diz a lei
No Brasil, a guarda compartilhada é o modelo legal padrão desde 2014, estabelecendo que pai e mãe devem dividir igualmente direitos e deveres sobre os filhos. Na teoria, trata-se de um formato que busca equilíbrio e corresponsabilidade.
Na prática, as coisas nem sempre funcionam assim. A advogada Isabela Torres explica:
“A guarda compartilhada é um modelo de responsabilidade parental em que ambos os genitores participam ativamente das decisões sobre a vida do filho — escola, saúde, rotina, atividades — dividindo direitos e deveres. A criança tem um lar de referência, mesmo que o outro genitor participe ativamente.”
Segundo a especialista, muitas pessoas confundem guarda compartilhada com guarda alternada, que é quando a criança mora períodos intercalados com cada genitor.
“É importante lembrar que toda guarda alternada é compartilhada, mas nem toda guarda compartilhada é alternada”, pontua.
Apesar do avanço legal, Isabela destaca um fenômeno recorrente: a “guarda compartilhada fake”, quando o acordo existe apenas no papel.
O problema não é a guarda em si, e sim a maternidade solo disfarçada de compartilhamento. É comum que as mães continuem sobrecarregadas, assumindo sozinhas as responsabilidades cotidianas, mesmo com a guarda formalizada. A cultura brasileira ainda impõe que o cuidado é papel exclusivo da mulher.
Isabela Torres
A advogada lembra que, quando o pai é ausente ou pouco participativo, é possível pedir uma reavaliação judicial da guarda, sempre considerando o melhor interesse da criança. Casos de alienação parental e descumprimento de acordos têm recebido atenção maior dos tribunais.
“É cada vez mais comum que a Justiça determine acompanhamento psicológico, multas ou visitas assistidas”, afirma.
Para Isabela, a solução passa por mais do que sentenças judiciais. “A guarda compartilhada precisa ser acompanhada por políticas públicas, mediação familiar e um olhar multidisciplinar que envolva psicólogos e sociólogos. Não é só uma questão de lei, é de cultura.”
Kim Kardashian e filhos
Quando a divisão pesa mais de um lado
Se a lei prevê equilíbrio, o cotidiano revela outra realidade. A psicóloga Beatriz Moutella explica que, mesmo com acordos bem estruturados, as mulheres continuam enfrentando uma sobrecarga emocional e simbólica herdada de séculos de patriarcado.
“Ainda vivemos, infelizmente, sob a influência dos ideais do patriarcado, com poucas superações em relação aos papéis e às funções da mulher na sociedade” Afirma a psicóloga.
“Tanto a mãe tem dificuldade em se desapegar do excesso de responsabilidades quanto o pai tende a normalizar e, na maioria das vezes, não compreender a dimensão das tarefas que precisam ser realizadas”, completou.
Esse desequilíbrio, segundo Beatriz, traz consequências diretas à saúde mental.
“A sociedade ainda espera da mulher um amor incondicional e abnegado. Essa idealização da maternidade produz culpa, ansiedade e exaustão. Muitas mães se sentem fracassadas por não darem conta de tudo”, diz.
Ainda ouvimos de muitas mães que vivenciam pais mais ativos e presentes, que eles a ‘ajudam’ muito. O que os desprende de um dever com o desenvolvimento e formação de seus filhos. A igualdade parental ainda é muito mais teórica do que efetiva. A divisão da guarda acaba sendo mais objetiva e formal do que simbólica […] Mesmo quando se tenta amenizar a sobrecarga por meio de acordos de corresponsabilidade, o afeto, a culpa e a expectativa social costumam levar a mulher a assumir o gerenciamento invisível da rotina dos filhos.
Beatriz Moutella
A psicóloga reforça que o diálogo entre os ex-parceiros é o principal fator de proteção emocional para os filhos.
“Filhos gostam de mãe e pai satisfeitos. Quando o casal vive em conflito, a criança absorve culpa e insegurança.”
Ela defende que a guarda compartilhada só é bem-sucedida quando há maturidade emocional dos dois lados.
“Não se trata de dividir tempo, mas de continuar sendo uma família — com novos contornos, mas com a mesma base de afeto e pertencimento.”
Kim Kardashian e filhos
Entre o público e o privado
O relato de Kim Kardashian ilustra uma realidade comum a muitas mulheres, famosas ou anônimas. A diferença é que, no caso dela, tudo acontece sob os holofotes.
Ao admitir que cria os filhos em tempo integral e que “há meses” não recebe uma ligação do pai, Kim deu voz a um sentimento coletivo: o de que a guarda compartilhada, muitas vezes, ainda é desigual.
Para a advogada Isabela Torres, reconhecer essa disparidade é o primeiro passo para uma transformação.
“Precisamos entender que compartilhar a guarda é, antes de tudo, compartilhar presença, decisões e afeto, não apenas direitos.”
Beatriz Moutella completa:
“Mães não deixam de ser humanas quando viram mães. E é importante que os filhos saibam disso, para crescerem entendendo que amor também é feito de limites e humanidade.”