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    Lula completa 80 anos de olho no 4º mandato e sem formar sucessores

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    O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) completa 80 anos nesta segunda-feira (27/10). O petista, que já acumula o feito inédito de chefiar o Planalto por três mandatos, mostra interesse em disputar mais quatro anos à frente do Executivo federal.

    Lula, que é o presidente mais velho da história do Brasil, comemora o aniversário em meio a uma importante viagem pela Ásia. Ele passará a data em Kuala Lumpur, na Malásia, onde participa da 47ª Cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean).

    O presidente retorna ao Brasil nesta terça-feira (28/10) e, até o momento, nenhuma celebração está prevista. Durante visita oficial à Indonésia, Lula festejou o aniversário de forma antecipada, com um banquete oferecido pelo presidente indonésio, Prabowo Subianto, no Palácio Merdeka, em Jacarta.

    Foi também ao longo da passagem por Jacarta que o titular do Executivo admitiu, pela primeira vez, que vai disputar às eleições em 2026. Antes, Lula condicionava a participação no pleito ao estado de saúde. Nos dois últimos anos, o aniversário do presidente foi permeado por questões de saúde: uma cirurgia no quadril, no fim de setembro de 2023, e o acidente doméstico que resultou em um traumatismo craniano, em outubro de 2024.

    Hoje, o petista aposta no discurso de vitalidade. Além de repetir que se sente com “energia de 30 anos”, Lula tem viajado mais pelo país, publica nas redes sociais vídeos se exercitando e correndo pela rampa do Palácio do Planalto, e chegou até a participar de uma caminhada de 3 km na Esplanada dos Ministérios.

    O esforço busca evitar o “efeito Joe Biden”, ex-presidente dos Estados Unidos que desistiu de disputar a reeleição após pressão por conta da idade — à época, com 81 anos. Em agosto, Lula chegou a citar o ex-chefe da Casa Branca ao falar sobre a possibilidade de concorrer em 2026.

    “Para ser candidato tenho que ser muito honesto comigo. Preciso estar 100% de saúde. Para eu me candidatar e acontecer o que aconteceu com Biden, jamais. Quando falo que tenho 80 [anos], energia de 30, vocês podem acreditar”, disse em discurso na posse do presidente do PT, Edinho Silva.

    Trajetória

    • Apesar de ter nascido em 27 de outubro, o registro de Lula tem como data o dia 6 de outubro. A duplicidade gera confusão sobre o verdadeiro aniversário do titular do Planalto. Segundo a biografia do petista, isso ocorreu porque ele foi registrado anos depois de nascer.
    • O presidente, que é natural de Garanhuns (PE),  governou o país entre 2003 e 2010, e voltou à cadeira da presidência 20 anos depois, em 2023, para o terceiro mandato.
    • Lula disputou à presidência em 1989, 1994, 1998, 2002, 2006 e 2022. Em 2018, ele teve a candidatura indeferida e foi substituído por Fernando Haddad.
    • Nos mandatos, Lula garantiu avanços econômicos e sociais ao país, que lhe renderam aprovação acima dos 80%. Porém, o ex-metalúrgico enfrentou graves escândalos de corrupção, com denúncias de propina assolando as principais obras e investimentos públicos. Os escândalos mancharam a imagem do PT.
    • O partido encarou um momento de grande crise política quando a sucessora de Lula, a ex-presidente Dilma Rousseff, sofreu impeachment. O cenário se agravou quando o atual chefe do Executivo foi condenado e preso por corrupção, em abril de 2018, no âmbito das investigações da operação Lava Jato.
    • Em abril de 2021, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou as alegações de que o petista não deveria ter sido julgado pela Justiça Federal de Curitiba, e anulou as condenações e os processos em andamento.
    • Após 580 dias de cárcere, ele saiu da prisão em novembro de 2019 e retornou para política, voltou a se candidatar e derrotou o então presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022.

    8 imagensO presidente LulaPresidente Lula discursa durante abertura do 16º Congresso do PCdoB, no Centro de Convenções Ulysses GuimarãesPresidente Lula discursa durante abertura do 16º Congresso do PCdoB, no Centro de Convenções Ulysses GuimarãesAtlas: aprovação de Lula vai a 51,2%, melhor nível desde janeiro de 24Fechar modal.1 de 8

    Presidente Lula

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    O presidente Lula

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    Presidente Lula discursa durante abertura do 16º Congresso do PCdoB, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães

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    “A fome é uma escolha política”, diz Lula em artigo internacional

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    O presidente Lula

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    Sucessão

    Enquanto Lula se prepara para a sétima disputa presidencial, o campo da esquerda reacende o debate em torno da sucessão do petista. Caso seja reeleito em 2026, ele não poderá concorrer novamente em 2030, já que a legislação atual veda o terceiro mandato consecutivo.

    Entre os ventilados para herdar o legado do político estão os ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), da Educação, Camilo Santana (PT), da Casa Civil, Rui Costa (PT), e o recém-nomeado chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Guilherme Boulos (PSol). Por fora, correm nomes como o de João Campos (PSB-PE), prefeito de Recife — que ainda não tem idade para concorrer ao Planalto — e até o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF).

    Na avaliação de Leonardo Paz, professor de Relações Internacionais do Ibmec-RJ, Haddad desponta como o nome mais forte dentro do PT para substituir Lula. Ele aponta, no entanto, que o “fator carisma” pode desfavorecer o ministro.

    “Eu acho que (Haddad) talvez seja um dos melhores e mais competentes quadros da esquerda brasileira. Mas competência não é carisma, e eleição é carisma, em grande parte. Então eu acho que isso pesa muito para ele”, observa o especialista.

    O professor chama a atenção para o desafio que o PT terá de enfrentar em um cenário sem Lula. Ele relembra as eleições de 2018, em que houve um racha entre a sigla e Ciro Gomes — agora filiado ao PSDB —, após o partido se recusar a abrir mão de encabeçar a chapa. Na época, Lula estava inelegível e escalou Haddad para disputar o pleito. O atual ministro da Fazenda saiu derrotado no segundo turno contra Jair Bolsonaro (PL).

    “Vai ser interessante entender como vai ser, uma vez Lula fora da equação, já para 2030, como o PT vai se posicionar na política, porque ele está acostumado desde a década de 90 a ser cabeça de chave da esquerda. Como que ele vai se posicionar nesse momento? E o [João] Campos talvez seja a figura que vai fazer parte dessa costura”, analisa Paz.

    Para Paulo Ramirez, cientista político e professor do curso de ciências sociais e de consumo da ESPM, o principal desafio da esquerda na formação de novas lideranças está no distanciamento das bases sociais.

    “Um partido que se institucionaliza no governo [como o caso do PT], tende a criar relações mais hierárquicas, verticais, deixando as bases de lado. Bases essas que foram de alguma forma cooptadas por grupos evangélicos. Afinal de contas, quando falta a cesta básica, a mãe precisa de uma creche para o filho, são geralmente as igrejas que conseguem resolver. Então os partidos estão muito afastados da periferia e o PT, por mais de esquerda e mais popular que seja, seguiu esse afastamento”, pontua Ramirez.

    “Tanto a esquerda quanto a direita têm uma carência de renovação de lideranças e o Lula precisa preparar o cenário para o próximo mandato. Para o final do próximo mandato, Boulos é um nome forte, e Haddad também, mas pesa contra Haddad a falta de carisma e pesa contra o Boulos uma visão que parte da opinião pública tem de que ele seria extremamente radical”, avalia o docente.

    Momento político

    A menos de um ano para o primeiro turno, a gestão de Lula à frente do Executivo passa por um momento de recuperação. Após crises motivadas por embates com o Congresso Nacional, medidas econômicas impopulares, e um período de alta no preço dos alimentos, a avaliação do petista ganhou fôlego em meio ao tarifaço imposto por Trump a exportações brasileiras.

    Pesquisa Atlas/Bloomberg divulgada nessa sexta (24/10) mostra que a aprovação do presidente chegou a 51,2% — o maior patamar desde janeiro de 2024. Ainda segundo a sondagem, Lula é o favorito em todos os cenários no primeiro e segundo turno da corrida presidencial em 2026.

    Empoderado pela pressão em cima do Legislativo, diante da aprovação de pautas impopulares, o governo decidiu fazer um rearranjo na base aliada, visando as eleições. A medida resultou em dezenas de demissões de aliados de políticos do Centrão que votavam contra projetos prioritários ao Executivo.

    A gota d’água foi a derrubada da MP 1303, que trazia alternativas ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A medida era fundamental para o governo fechar as contas, mas acabou caducando por falta de análise dos parlamentares. Em resposta, a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), deu início a um “limpa” em estatais e órgãos vinculados ao Executivo. A titular da articulação do governo está ouvindo lideranças para definir a redistribuição dos cargos.

    De olho em 2026

    A troca na chefia da Secretaria-Geral da Presidência, oficializada na semana passada, foi outra mudança na postura do governo, que mira a construção de um caminho para a reeleição de Lula. A pasta, responsável pela articulação do governo com organizações e movimentos sociais, agora tem Boulos no comando. O até então deputado federal foi o mais votado de São Paulo em 2022 e tem grande experiência dentro da militância de esquerda.

    De acordo com Jilmar Tatto (SP), deputado federal e vice-presidente do PT, mesmo com as recentes rusgas com o Congresso, o presidente não deve ceder aos interesses de outros partidos durante a corrida eleitoral. O objetivo da sigla é, além da reeleição de Lula, eleger uma bancada maior de aliados na Câmara e no Senado.

    “Acho que ele (Lula) vai querer o apoio dos partidos, querer o apoio das lideranças, querer o apoio de todo mundo, mas acho que não vai fazer concessões aos partidos, não. Ele não vai pagar pedágio, sabe? E isso não significa que nós não vamos conversar, discutir os palanques nos estados, ver quem está conosco”, disse ao Metrópoles.

    Na opinião do parlamentar, que é autor de um projeto de lei que implementa a tarifa zero no transporte público de todo o país, o tema da gratuidade do serviço será uma aposta grande do titular do Planalto para o ano que vem.

    No início do mês, o ministro da Fazenda confirmou que a pasta analisa a viabilidade do projeto a pedido do presidente. A pauta é mais uma das que tem apelo popular  — como a isenção do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil — e que podem alavancar a popularidade e a aprovação de Lula.