Tenho para mim, na minha superstição, à prova de toda a ciência, que o entusiasmo produz um cortisol positivo e saudável que serve de antídoto ao cortisol da ralação conhecida por stress, que é negativo e deletério.
Gostar de pessoas e de coisas, tal como rir e brincar, só nos pode fazer bem. Já o contrário, até por ser muito mais frequente, só nos pode fazer mal.
É que gostar não é normal. O normal é não gostarmos. Gostar é excepcional. Por isso é que sabe tão bem: vem a seguir a um longa sucessão de desgostos, embirrações, antipatias.
Gostar é uma escolha. “É de ti que gosto!”, digo eu, ficando entendido que não gosto das outras pessoas todas. Gostar é uma amizade, mesmo que nunca passe daquilo. Gostar é o ponto de partida.
Não gostar é que é normal. Somos todos incompatíveis com a grande maioria das pessoas, para que possamos apreciar a raridade de gostar, de sorrir, de nos apaixonarmos, de acharmos graça a alguém.
Resmungar é a reação mais fácil a esta raridade. É também a mais adequada. De facto, o mundo não está feito para facilitar a alegria, ou para justificar a boa disposição.
Não é normal gostarmos uns dos outros, ou das coisas que nos rodeiam.
Gostar é uma sorte.
Resmungar é barato, é local, gasta poucos recursos: é sustentável, como agora se diz. Mas acaba por sair caro se considerarmos que resmungar faz mal ao nosso interior, para além de nos tornar muito pouco atraentes para quem nos vê.
Adormece a cabeça, desembocando na facilidade lamacenta de “é tudo uma merda”. De tanto pensar assim, torna-se mesmo verdade para quem está sempre a repetir essa mesma merda.
Mas também substitui o gostar. Para gostar, é preciso mexermo-nos. É preciso irmos à procura. É preciso encontrar pessoas e coisas que contrabalancem aquelas que nos pesam e deprimem.
O cortisol bom, que anula o mau que vem das nossas relações todas, vem do entusiasmo, do elogio, da generosidade – da partilha das coisas boas que estão a passar despercebidas.
(Transcrito do PÚBLICO)
