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SP taxa gorjeta? Entenda polêmica sobre cobrança de ICMS acima dos 10%

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SP taxa gorjeta? Entenda polêmica sobre cobrança de ICMS acima dos 10%

A cobrança de imposto sobre gorjetas pagas em bares e restaurantes virou tema de debate em São Paulo. O assunto veio à tona após a federação que representa o setor relatar aumento nas fiscalizações e multas contra estabelecimentos que estariam descumprindo as regras.

Após enviar ofício ao governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Federação de Hotéis, Restaurantes e Bares do estado (Fhoresp) discutiu a medida com a Secretaria da Fazenda. Agora, a promessa é de que as instituições atuem em conjunto para derrubar o decreto estadual, de 2012, que permite a cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre gorjetas.

O tema também virou combustível para a oposição contra o governador paulista. Além de críticas do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), o deputado estadual Emídio de Souza (PT) apresentou um projeto de lei na Assembleia Legislativa de São Paulo para proibir a cobrança. A deputada federal Erika Hilton (PSol-SP) também aproveitou o ensejo para acionar o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Por enquanto, os estabelecimentos alegam que estão absorvendo o prejuízo. O custo, no entanto, pode ser repassado aos trabalhadores caso uma solução demore para ocorrer.

Impostos sobre gorjetas

A legislação sobre gorjetas — incluindo a lei federal 13.419 de 2017, conhecida como Lei da Gorjeta, e o artigo 457 da CLT — estabelece que esse tipo de pagamento não representa receita dos empregadores e pertence exclusivamente aos empregados. Assim, mesmo que a gorjeta seja cobrada pelo estabelecimento, não está sujeita ao ICMS.

O estado de São Paulo, no entanto, se apoia em um decreto de 2012 com base em uma decisão do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Esse decreto fixa a isenção de imposto para gorjetas de até 10% do valor da conta. Para os pagamentos que superam essa porcentagem, é possível a cobrança de ICMS de 4% sobre o valor excedente.

Não há cobrança de imposto sobre as gorjetas espontâneas, ou seja, aquelas que são pagas diretamente ao trabalhador sem intermediação do estabelecimento.

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Segundo o diretor-executivo da Fhoresp, Edson Pinto, o decreto de 2012 foi criado em um contexto em que, por convenção, os estabelecimentos cobravam 10% de gorjeta e, portanto, não afetavam os pagamentos.

A regulamentação federal, entretanto, passou a incorporar as gorjetas à remuneração via holerite, o que resultou no recolhimento de encargos sociais e declaração no Imposto de Renda (IR), e aumentou os gastos do empregador. Para evitar cortes no pagamento feito aos trabalhadores, a solução encontrada na época foi aumentar a fatia da gorjeta, ampliando de 10% para 12%, 13% ou 15%.

“De 2017 até agora, a gente não teve problema em relação q isso, estava tudo certo. Mas em 2025, a Fhoresp passou a receber reclamações de estabelecimentos que estavam sendo autuados, multados para pagar ICMS sobre a taxa de gorjeta que excede os 10%”, disse o diretor ao Metrópoles.

Além disso, também haveria o entendimento de que, como o estabelecimento não pagou o ICMS, sonegou o imposto e por isso deveria ser multado.

Ofício ao Governo de São Paulo

A Fhoresp oficiou a gestão Tarcísio e participou de uma audiência com o secretário-executivo da Fazenda, Rogério Campos, para discutir o assunto.

No entendimento da federação, a cobrança é injusta e prejudica os trabalhadores. Já a secretaria argumenta que o decreto é de 2012 e não houve mudança desde então, além de afirmar que segue determinação que partiu do Confaz. O secretário alega ainda que não houve determinação para aumentar as fiscalizações e multas aos estabelecimentos e que as reclamações dos bares e restaurantes seriam fruto de iniciativas individuais dos fiscais.

Após a audiência, ficou definido que a federação e a secretaria vão atuar em conjunto para derrubar a medida do Confaz, formado por representantes das Secretarias da Fazenda de todos os estados brasileiros e vinculado ao Ministério da Fazenda.

Com relação às multas aos estabelecimentos, Edson Pinto afirmou que a federação tem orientado os bares e restaurantes a recorrerem ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O diretor-executivo também afirmou que, por enquanto, as empresas têm absorvido o prejuízo, mas os funcionários podem acabar prejudicados no futuro.

“Se a gente não conseguir reverter isso no curto prazo, vamos ter que normatizar uma forma de dividir esse ônus com os trabalhadores, talvez repassar menos para eles.”

Projeto de Lei e representação no Tribunal

O deputado estadual Emídio de Souza (PT) protocolou um projeto de lei para fixar, em São Paulo, as regras definidas na Lei da Gorjeta e vedar a cobrança de ICMS sobre valores recebidos a título de gorjeta.

“Não se pode admitir que o Estado, ao invés de buscar formas de fortalecer a justiça tributária, insista em onerar aquilo que representa o esforço, o mérito e a solidariedade entre trabalhadores e clientes”, justifica o deputado.

O parlamentar reforça a autonomia dos estados para legislar sobre ICMS. “Por isso, é necessária uma lei estadual para determinar, de forma definitiva, a não incidência do ICMS sobre as gorjetas. O projeto de lei, portanto, busca harmonizar a legislação estadual com o que a lei federal já reconhece: a gorjeta não é faturamento da empresa, mas apenas um repasse destinado à remuneração dos empregados e, assim, não deve ser tributada pelo ICMS”, complementa.

Na quarta-feira (15/10), a deputada federal Erika Hilton (Psol) apresentou uma representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE) contra a cobrança de ICMS sobre gorjetas.

Segundo ela, a situação cria um cenário de insegurança jurídica e perseguição fiscal, além de prejudicar a remuneração de milhares de trabalhadores.

Erika Hilton também argumenta que o decreto permite a inclusão indevida das gorjetas na base de cálculo do ICMS, embora não exista nenhuma lei estadual aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo sobre o tema.

Na representação, a deputada pede que o TCE realize uma auditoria na Secretaria da Fazenda para apurar a fundamentação da cobrança de ICMS sobre gorjetas, o montante arrecadado com essa cobrança e a eventual inclusão indevida desses valores na receita estadual.

O documento também solicita que novas autuações e multas sejam suspensas e o tribunal publique uma determinação para impedir a tributação de gorjetas, a menos que isso seja autorizado por uma lei formal.

Inconstitucionalidade

O Metrópoles consultou um especialista em Direito Tributário para avaliar o tema. O advogado Adolpho Bergamini explicou que a base legal do ICMS é o valor da operação, ou seja, o preço que se cobra sobre a mercadoria. “Gorjeta, por natureza, não é mercadoria, é um serviço do garçom. Ela não pode ser entendida como integrante da base do ICMS porque não faz parte da operação.”

O advogado também ressalta que entende a cobrança como inconstitucional. Segundo ele, o ICMS sobre gorjetas foi viabilizado a partir de um decreto e da resolução do Confaz, que não tem atribuição para estipular regras sobre o imposto.

“Isso (inconstitucionalidade) porque o Confaz é um conselho formado pelos Estados que, por sua vez, não tem nenhuma competência/atribuição para estipularem regras de composição de base de cálculo do ICMS. Isso é matéria reservada à lei promulgada pelo Poder Legislativo e sancionada pelo Poder Executivo. O Confaz não é Poder Legislativo e os Convênios que emite não podem, jamais, avançar sobre temas reservados à lei”, conclui o sócio do escritório Bergamini Advogados.

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