O mercado ilegal de cigarros eletrônicos, popularmente conhecidos como vapes, movimenta perto de R$ 5,8 milhões por dia, ou R$ 2,12 bilhões por ano, no estado de São Paulo, segundo uma pesquisa da Escola de Segurança Multidimensional da Universidade de São Paulo (ESEM-USP). Apesar de proibidos no país, os produtos seguem em expansão e quase um milhão de pessoas consumiram vapes no último mês no estado.
Os números fazem parte do 1° Levantamento Nacional sobre a Demanda de Bens e Serviços Ilícitos, apresentado na quarta-feira (22/10) pela universidade. A pesquisa utilizou uma amostra por cotas de 3.000 entrevistados, que responderam um questionário sobre a noção da ilicitude, a frequência de compra, as motivações e os meios de adquirir os produtos. A margem de erro do levantamento é de 1,8%.
A pesquisa mostra que, apesar de estarem proibidos desde 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil, esses produtos possuem consumidores e circulam com liberdade no mercado. De acordo com o levantamento, 815.757 pessoas fizeram uso de vapes nos últimos 30 dias em São Paulo.
Em uma simulação realizada pelos pesquisadores, foi constatado que o estado de São Paulo deixa de arrecadar mais de R$ 3 bilhões em impostos estaduais e federais por cigarros eletrônicos no ano. Os dispositivos são provenientes do Paraguai e vendidos ilegalmente por lojas físicas, vendedores ambulantes, sites e outros meios.
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Para Leandro Piquet, coordenador da pesquisa e especialista em segurança pública e mercados ilícitos, o regime de proibição não elimina os produtos do mercado, mas transfere o controle ao crime organizado, que se beneficia de uma fonte lucrativa e estratégica de financiamento.
“O comércio ilícito de bens e serviços está sujeito a uma lógica econômica simples: se existe qualquer tipo de demanda, sempre haverá alguém, ou alguma organização, dedicada a atender essa demanda. O regime de proibição, em vez de eliminar os mercados de bens e serviços ilegais, acaba por transferi-los para a esfera do crime organizado, que se estrutura como agente econômico racional, em busca de lucro, controle territorial e corrupção sistêmica”, conta Piquet.
O que torna o vape tão perigoso?
Apesar de ser vendido como uma alternativa “menos nociva” ao cigarro tradicional, o cigarro eletrônico não é inofensivo. Os riscos aumentam de acordo com o tempo de uso, a frequência das tragadas e a composição dos líquidos vaporizados — muitos deles não regulamentados e com fórmulas desconhecidas. Entre os ingredientes, o diacetil aparece como um dos principais vilões.
Estudos mais recentes apontam para um número crescente de problemas de saúde entre jovens usuários de vape. O fator preocupante é que doenças podem se desenvolver de forma silenciosa, sem sinais evidentes nos estágios iniciais.
Um dos perigos mais graves ligados ao uso frequente dos vapes é a bronquiolite obliterante — uma doença inflamatória grave, progressiva e sem cura, que atinge as vias aéreas mais finas dos pulmões. Conhecida como “pulmão de pipoca”, a condição compromete severamente a respiração e pode deixar sequelas irreversíveis.
Essa doença ganhou notoriedade no início dos anos 2000, após casos entre trabalhadores de fábricas de pipoca para micro-ondas expostos ao diacetil — um aromatizante artificial de sabor amanteigado. O composto, banido de vários produtos alimentícios nos EUA, voltou ao centro das atenções por estar presente em muitos líquidos usados nos vapes.
Cenário nacional
No âmbito nacional, o estudo estima que um em cada 21 brasileiros tenha usado vapes ou sachês de nicotina nos últimos três meses — cerca de dez milhões de pessoas. O material também detalha dados sobre o perfil e as motivações dos consumidores.
Entre as razões para o consumo, destacam-se os 29,49% dos entrevistados que fazem uso por curiosidade e os 10,71% que consomem por influência de amigos/conhecidos. O mercado ilegal desses produtos movimenta R$ 7,81 bilhões por ano no país e não gera nenhum recolhimento de tributos. Em uma simulação, o setor poderia render R$ 13,7 bilhões anuais aos cofres públicos se fosse regulamentado.
