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    Vídeo: vice em Marituba (PA) é filmada ao receber suposta propina

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    Uma investigação da Polícia Federal (PF) que apura desvios que chegam a quase R$ 200 milhões das áreas da Saúde e Educação no Pará apontam para o suposto envolvimento da vice-prefeita de Marituba (PA), Bárbara Bessa Marques (MDB), no esquema.

    Segundo a PF, “há fortes indícios de que Bárbara Bessa Marques, vice-prefeita de Marituba/PA, tenha recebido valores em espécie acondicionados em uma sacola”. Ela foi alvo de um decreto de prisão preventiva.

    As suspeitas são reforçadas por gravações obtidas pela PF de câmeras de segurança da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) e de uma agência bancária dentro do órgão, no âmbito da operação Expertise, cuja segunda fase foi deflagrada pela PF na última quinta-feira (9/10). Veja:

    Como mostrou a coluna, ao longo das apurações, a PF chegou a monitorar a movimentação de saque e a suposta entrega de valores em órgãos públicos do Pará. Um dos envolvidos nesses trâmites era Jacélio Faria da Igreja, sócio da Líder Engenharia, uma das empresas sob suspeita.

    As gravações às quais a PF teve acesso mostraram a movimentação de Jacélio dentro do órgão e em suas proximidades, inclusive em uma agência do banco Sicoob que fica no subsolo do prédio, no dia 20 de agosto de 2025.

    Uma dessas gravações capturou Jacélio entrando na agência bancária, onde uma funcionária do banco entregou ao empresário uma sacola vazia, supostamente com o objetivo de acomodar os pacotes de dinheiro retirados no caixa.

    Em seguida, Jacélio colocou a sacola no porta-malas de um Toyota SW4 -veículo com o qual ele chegou na Alepa por volta das 16h do dia 20 de agosto.

    Logo depois, diz a PF, Bárbara Marques, a vice-prefeita, encontrava-se dentro de um Toyota Corolla e teria ingressado no carro de Jacélio, onde permaneceu por aproximadamente cinco minutos. Durante esse intervalo, Jacéio retirou a sacola do porta-malas e retornou ao interior do veículo.

    Na sequência, Bárbara aparece nas gravações saindo do veículo segurando a sacola, e retornando ao Corolla. O veículo, segundo a PF, está em nome de sua irmã, Beatriz Marques.

    Imagem captada em câmera de segurança da Alepa e obtida pela PF na operação ExpertiseImagem captada em câmera de segurança da Alepa e obtida pela PF na operação Expertise

    “Todo o episódio evidenciou uma entrega disfarçada de valores ilícitos à referida agente pública, imediatamente após o saque bancário”, afirma a corporação.

    Beatriz Marques, irmã de Bárbara, é servidora pública de Marituba, tendo ocupado cargo comissionado de assessora especial no município na Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas). A decisão da Justiça Federal que autorizou as ações da PF na semana passada determinou a suspensão do exercício de função pública de Beatriz.

    A hipótese dos investigadores, levando em conta que logo depois de Bárbara sair do carro, o veículo é manobrado, quem estaria dirigindo seria Beatriz.

    “Considerando que Bárbara Marques desceu do carro e logo em seguida o veículo foi manobrado e que ele está em nome de sua irmã Beatriz Marques, partiu-se do pressuposto que Beatriz Marques conduzia o veículo”, afirma a corporação em relatório sobre o caso.

    Já Bárbara, além de ser vice-prefeita de Marituba, segundo a PF, ela também exercia cargo de Secretária Municipal de Educação (Semed), cujas atribuições incluem “gerir o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb)” -área sob suspeita na investigação. Ela foi exonerada do cargo na última quinta-feira (9/10).

    A apuração aponta, por exemplo, que a Prefeitura de Marituba, por meio da Secretaria de Educação, celebrou contratos públicos “suspeitos e potencialmente fraudulentos, custeados com recursos federais da educação (Fundeb)”.

    Dentre os contratos, está um firmado com a Líder Engenharia, de Jacélio Igreja, resultado de uma adesão considerada pela PF como “irregular” a uma ata de registro de preços de outro órgão. O valor contratado foi de cerca de R$ 20 milhões, dos quais pelo menos R$ 13 milhões já foram pagos com verbas do Fundeb.

    “Este e outros contratos municipais (inclusive na saúde e em obras) apresentaram indícios veementes de fraude licitatória e execução simulada: a Controladoria-Geral da União apontou que a contratação foi montada com irregularidades […] e que não houve comprovação real da execução dos serviços contratados, embora os pagamentos tenham sido realizados integralmente. Em outras palavras, formalidades foram orquestradas apenas para dar aparente legalidade a pagamentos ilícitos por serviços não prestados – uma fraude que desvia recursos públicos sob a aparência de contratos legítimos”, afirma a PF.

    Operação Expertise

    A operação, batizada de Expertise, apura a atuação de uma organização criminosa voltada ao cometimento de crimes contra a administração pública e a lavagem de dinheiro, mediante a contratação fraudulenta de empresas por diversos órgãos públicos estaduais e municipais do Pará, por meio da utilização de recursos federais oriundos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB) e do Fundo Nacional de Saúde (FNS).

    Segundo a PF, as investigações mostram a existência de um “modus operandi” que envolve empresários, servidores públicos e empresas de fachada.

    O esquema também inclui o direcionamento de licitações, adesões irregulares a atas de registro de preços, simulação ou execução parcial de contratos administrativos, repasses de vultosos valores públicos e, posteriormente, o saque em espécie e redistribuição desses recursos entre os agentes integrantes da organização.

    Segundo a investigação do caso, o primeiro passo do esquema se dava a partir do firmamento de contratos milionários fraudulentos entre as empresas investigadas e órgãos vinculados ao governo do estado do Pará, tais como os citados Detran e Polícia Científica, ou a Alepa.

    Segundo a decisão que autorizou as ações da PF na primeira fase da operação, em setembro, processos licitatórios eram autorizados, montados e realizados por funcionários ocupantes de cargos chave de órgãos públicos participantes no esquema, havendo suspeita de direcionamento a determinadas empresas.

    Em seguida, diz o documento, eram realizados os pagamentos de valores milionários às empresas participantes do esquema, mesmo sem a realização do objeto do contrato.

    Na última etapa, eram realizados saques de valores em espécie de contas vinculadas às empresas investigadas ou de pessoas físicas e jurídicas a elas associadas. Em seguida, tais valores são entregues em mãos a autoridades públicas corruptas vinculadas aos entes estatais.

    “Há também a transferência direta entre contas vinculadas a empresas investigadas e autoridades públicas”, diz o juiz que assina a decisão.

    Defesa

    Em nota, a prefeitura de Marituba (PA) afirmou que está colaborando integralmente com as investigações conduzidas pela Justiça e pelos órgãos competentes. “Todas as medidas administrativas necessárias foram adotadas para garantir a transparência e contribuir com o pleno andamento das investigações”.

    Já a Assembleia Legislativa afirmou que não figura como parte no inquérito, e só tomou conhecimento da investigação no momento do cumprimento dos mandados de busca e apreensão, realizados em 2 de setembro de 2025, nas dependências utilizadas servidores.

    “Ressalte-se que não foi identificada ou está sendo investigada qualquer irregularidade no âmbito da gestão administrativa da Alepa, sendo os elementos da apuração direcionados a outras entidades alheias à estrutura da Casa Legislativa. O controle de acesso às áreas internas e ao estacionamento da instituição encontra-se em fase de implementação, como parte de medidas administrativas voltadas ao aperfeiçoamento da segurança e da gestão de fluxos internos”, afirma.

    No que se refere à presença do empresário Jacélio Igreja nas dependências do órgão no dia 20 de agosto de 2025, a Alepa diz que “não há qualquer registro formal de entrada em nome do referido indivíduo na referida data e ressalta que o prédio-sede da Assembleia abriga agências bancárias com atendimento ao público externo, “o que justifica a circulação de visitantes no local”.

    A coluna entrou em contato com as defesas de Bárbara e Jacélio desde domingo (12/10), mas não houve retorno até a publicação da reportagem.