Em uma semana atípica e com pouco movimento no Congresso, a CPI do Crime Organizado teve uma estreia discreta no Senado. O início coincidiu com o feriado prolongado, agendas simultâneas e uma pauta política dominada pelo avanço do PL Antifacção na Câmara, fatores que reduziram o ritmo das primeiras reuniões e dividiram a atenção dos parlamentares. Integrantes avaliam, no entanto, que o cenário deve mudar nas próximas semanas e que o tema tende a ganhar força em 2026, ano em que a segurança pública deverá ocupar espaço central no debate eleitoral.
A CPI foi instalada no início deste mês, na esteira da megaoperação realizada no Rio de Janeiro que mirou o Comando Vermelho e evidenciou a disputa por controle territorial no estado. A operação deu fôlego ao pedido de criação da comissão e ampliou a pressão para que o Senado se dedicasse ao tema.
Um dos pontos citados por integrantes para um início mais tímido da CPI foi que a primeira sessão com oitivas ocorreu no mesmo horário da CPMI do INSS. O feriado prolongado também esvaziou o Congresso, assim como a votação do PL Antifacção, que concentrou boa parte das articulações na terça-feira (18/11).
O projeto chegou a ser tratado na própria CPI. Durante a oitiva com o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, o texto foi citado diversas vezes por parlamentares, inclusive por causa da discussão – agora descartada – de enquadrar organizações criminosas como terroristas. Ele chamou de “equívoco” essa comparação, afirmando que a distinção entre terrorismo e crime organizado é fundamental para a atuação dos órgãos de segurança.
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Andrei Rodrigues na CPI do Crime Organizado
TV Senado/Reprodução
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Senador Fabiano Contarato, presidente da CPI do Crime Organizado
Andressa Anholete/Agência Senado
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CPI do Crime Organizado
Reprodução/TV Senado
Futuro da CPI do Crime Organizado
Apesar da semana esvaziada, a avaliação de alguns integrantes é de que o colegiado deve ganhar tração, conforme o calendário eleitoral se aproxima e a segurança pública volta a pautar discussões no Senado.
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirma que o tema estará no centro da corrida eleitoral e defende que “a pauta do combate à violência vai ser uma agenda central do ano que vem”. “Acho que a CPI ainda tem muito resultado”, completou.
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Daqui para frente, senadores têm leituras amplas sobre o foco da CPI nas próximas etapas. Uma parte defende que a comissão avance para casos concretos e convoque personagens diretamente ligados ao crime organizado, levando as discussões mais para “a vida real”.
Uma das iniciativas para isso veio do relator da comissão, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que propôs ouvir TH Joias, o ex-deputado estadual do Rio de Janeiro Thiego Santos, investigado pela PF por supostos vínculos com facção.
“É fundamental que a gente tenha contato com esse senhor para que ele possa verbalizar a participação. E faço um registro a mais: a denúncia do Ministério Público Federal contra esse senhor traz outros 14 indivíduos. Dentre eles, assessores parlamentares, policiais militares do Rio de Janeiro e um policial federal. É dessa forma que o crime organizado atua. Não é uma coisa pontual, isolada, é sempre uma atuação integrada e com integração no poder público”, afirmou o senador.
Outros também consideram que o ritmo inicial é adequado. Para esses parlamentares, as primeiras reuniões ajudam a estruturar o funcionamento da CPI e a definir o plano de trabalho. Um deles classificou essa etapa como uma forma de “colocar a bola no chão” antes de avançar para fases mais complexas.
Antônio Glautter de Azevedo Morais, Diretor de Inteligência Penal da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), ouvido pela CPI do Crime Organizado nessa quarta-feira (19/11)
Primeiras oitivas
Além do debate sobre o PL Antifacção, a oitiva de Andrei Rodrigues tratou de operações recentes da PF e do desafio de diferenciar fenômenos criminosos que, segundo ele, exigem respostas específicas. O diretor apresentou ainda dados sobre investigações em andamento e explicou a estratégia da polícia para desarticular estruturas financeiras das facções.
Nessa quarta, a CPI ouviu o diretor de Inteligência Penal da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), Antônio Glautter, que detalhou o panorama do sistema prisional brasileiro e citou um déficit carcerário estimado em 40%.
Senadores aproveitaram a sessão para cobrar dados mais completos sobre população prisional, reincidência, presença de facções e ocupação das unidades — temas considerados essenciais para o avanço das investigações.
Para as próximas semanas, integrantes afirmam que a CPI deve entrar em uma fase mais movimentada. A previsão é que governadores comecem a ser ouvidos já na primeira semana de dezembro, ampliando o alcance político da comissão e trazendo diagnósticos regionais sobre o avanço das facções e a pressão sobre as polícias estaduais.
