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    Desenho de orixá: PM vai investigar ação de agentes armados em escola

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    A Polícia Militar (PM) vai investigar a ação dos agentes armados que atenderam uma ocorrência na última quarta-feira (12/11) dentro da Escola Municipal de Ensino Infantil (Emei) Antônio Bento, no Caxingui, zona oeste de São Paulo, após um pai descobrir que a filha de 4 anos desenhou um orixá Iansã em uma atividade do colégio. A apuração só foi aberta após a repercussão do caso, revelada pelo Metrópoles no domingo (16/11).

    6 imagensNo livro, a autora traz desenhos e informações sobre dez orixásDesenho da orixá Iansã que motivou pai de aluna de escola infantil de São Paulo a chamar a políciaDesenhos de alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, em atividade intitulada "Ciranda de Aruanda"Desenhos que alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, fizeram em atividade sobre religiões de matriz africanaLiu Olivina, autora de livro que inspirou atividade denunciada à PMFechar modal.1 de 6

    Capa do livro “Ciranda em Aruanda”, de Liu Olivina, publicado pela Editora Quatro Cantos

    Reprodução/Liu Olivina/Editora Quatro Cantos2 de 6

    No livro, a autora traz desenhos e informações sobre dez orixás

    Reprodução/Liu Olivina/Editora Quatro Cantos3 de 6

    Desenho da orixá Iansã que motivou pai de aluna de escola infantil de São Paulo a chamar a polícia

    Material cedido ao Metrópoles4 de 6

    Desenhos de alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, em atividade intitulada “Ciranda de Aruanda”

    Material cedido ao Metrópoles5 de 6

    Desenhos que alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, fizeram em atividade sobre religiões de matriz africana

    Material cedido ao Metrópoles6 de 6

    Liu Olivina, autora de livro que inspirou atividade denunciada à PM

    Acervo Pessoal

    Em nota à reportagem, a PM informou que vai apurar a conduta da equipe com “análise das imagens das câmeras corporais”. No dia anterior ao caso, o pai da aluna já havia demonstrado insatisfação com a atividade escolar, que é baseada em um currículo antirracista da rede municipal de ensino. Ele chegou a rasgar um mural com desenhos de outros alunos que estava exposto na escola, segundo a mãe de uma estudante.

    PM armado com metralhadora

    Depois do incidente, a direção da escola indicou que o homem participasse de uma reunião do Conselho da Escola, mas ele não compareceu e acionou a PM. Por volta das 16h, quatro agentes armados, um deles com uma metralhadora, entraram no colégio, informando que receberam uma denúncia de que uma estudante estava sendo “obrigada a ter aula de religião africana”.

    Os agentes teriam dito para a direção do colégio que a atividade escolar configurava “ensino religioso” e destacaram que a criança estava sendo obrigada a ter acesso ao conteúdo de uma religião que não é a de sua família. A abordagem foi considerada hostil por testemunhas. Em resposta aos policiais, a escola enfatizou que o desenho fazia parte de uma atividade com o livro infantil “Ciranda em Aruanda”, que está no acervo oficial da rede municipal de São Paulo.

    A direção da Emei citou as leis nº 10.639/03 e nº 11.645/08, que tornam obrigatório em todo o território nacional o ensino de história e cultura afro-brasileira, e explicou que a atividade não tinha caráter doutrinário. As crianças teriam apenas ouvido a história do livro e fizeram um desenho na sequência.

    Autora se pronuncia

    A obra em questão, “Ciranda de Aruanda”, é de autoria de Liu Oliveira, trazendo ilustrações de dez Orixás e textos curtos sobre as características das divindades. Em entrevista ao Metrópoles, a autora lamentou a atitude do pai e destacou os possíveis traumas gerados à criança com esse tipo de atitude.

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    “Fiquei muito triste. Pensei nas artes que foram destruídas pelo pai e nos educadores da escola. Mas o que mais me pegou foi a criança que ele reprimiu, porque isso gera traumas. Ela fez uma arte e isso fez o pai dela chamar a polícia. É muito absurdo”, comentou.

    Moradores fazem abaixo-assinado

    • Moradores dos bairros Caxingui e Instituto de Previdência, na zona oeste de São Paulo, fizeram um abaixo-assinado cobrando a atuação da Corregedoria da Polícia Militar contra os policiais que entraram na Emei.
    • O abaixo-assinado, aberto na noite desse domingo (17/11), havia reunido cerca de 800 assinaturas até a manhã de segunda-feira (17/11) em defesa da escola e contra a postura dos policiais e do pai que chamou os agentes.
    • A advogada Beatriz Branco, de 34 anos, conta que teve a ideia de fazer o abaixo-assinado depois de ler a reportagem do Metrópoles sobre o caso. “Todo mundo ficou muito estarrecido com o que aconteceu”, conta ela.
    • A moradora diz que os vizinhos têm uma relação muito próxima com a escola, considerada referência na região, e quiseram demonstrar apoio ao trabalho dos profissionais da unidade. Para ela, o episódio mostra a importância de trabalhar temas antirracistas na educação.
    • Os moradores reivindicam que a conduta dos PMs seja investigada para apurar “eventual abuso de autoridade e violação dos direitos das crianças”, e pedem que a Corregedoria da Polícia “tome as medidas cabíveis de punição”.

    O que diz a Prefeitura

    A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Educação (SME), informou que o pai da aluna recebeu esclarecimentos sobre o trabalho da filha, que integra uma produção coletiva de grupo.

    “A atividade faz parte de propostas pedagógicas da escola, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena dentro do Currículo da Cidade de São Paulo”, reforçou a gestão municipal.