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    Estudo diz que afastamento de diretores em SP não usa critério válido

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    Um estudo feito pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu) e o Grupo Escola Pública e Democracia (Gepud) afirma que a Secretaria da Educação de São Paulo (Seduc-SP) afastou 225 diretores escolares entre 2024 e 2025 sem um “critério objetivo válido”.

    Segundo o levantamento, o principal critério para o afastamento dos diretores teve como base uma oscilação de 0,2 ponto, em uma escala de 0 a 10, nos resultados do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) e do Provão Paulista entre 2024 e 2025 – valor menor do que a própria margem de erro da avaliação para a imensa maioria das escolas da rede estadual.

    O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o secretário da Educação, Renato Feder, têm cobrado que os diretores alcancem as metas estipuladas pela gestão para serem mantidos no cargo.

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    Uma resolução publicada pelo governo em janeiro de 2025 determinou que diretores que não conseguissem atingir o mínimo de 50% da chamada Meta Ouro, indicador que estipula notas esperadas nas avaliações de ensino para cada escola, teriam o desempenho classificado como insatisfatório. Nesses casos, o diretor poderia ser transferido para outra unidade, designado para outra função ou submetido a um curso de capacitação.

    A análise dos pesquisadores da Repu mostrou que, na prática, essa meta significava conseguir um aumento mínimo de 0,2 ponto entre as notas das escolas nas avaliações de aprendizagem entre um ano e outro. O levantamento mostrou, contudo, que 50,3% das 4.988 escolas analisadas não superaram esse limiar de 0,2 ponto.

    “O que significa dizer que, caso a regra de afastamento de diretores fosse aplicada rigorosamente pela Seduc-SP, 2.509 escolas estariam sob risco de intervenção. Dessa forma, os 225 afastamentos de gestores escolares identificados na pesquisa não se fundamentam em um critério objetivo válido”, afirma o estudo.

    Os pesquisadores alegam que há falta de transparência nos critérios para os afastamentos. Além disso, criticam uma mudança feita pelo governo Tarcísio que substituiu, para as turmas do ensino médio, o uso do Saresp pelo Provão Paulista como avaliação para monitorar o desempenho dos estudantes.

    A substituição aconteceu a partir de 2023 e interrompeu uma série histórica de monitoramento do ensino público no estado que era feita por meio do Saresp. Com isso, não é mais possível comparar os indicadores de aprendizagem de anos anteriores com os que foram gerados pela gestão Tarcísio. O estudo afirma ainda que os exames do Provão Paulista entre um ano e outro não são comparáveis entre si por causa da metodologia que utilizam.

    Diferenças entre Saresp e Provão Paulista

    • Criado em 1996, o Saresp é uma avaliação feita pelos estudantes da rede estadual paulista e usado há mais de duas décadas como instrumento para avaliar o ensino nas escolas do estado.
    • Para isso, o Saresp usa uma metodologia chamada Teoria de Resposta ao Item (TRI), que permite comparar provas ao longo do tempo.
    • “A TRI utiliza, por exemplo, as chamadas questões âncora, que se repetem em provas diferentes, permitindo equalizar e comparar os resultados, de maneira a avaliar a evolução da aprendizagem dos alunos”, explica o professor Leonardo Crochik, um dos autores do estudo.
    • Já a metodologia utilizada no Provão, que funciona essencialmente como um vestibular para acessar universidades estaduais paulistas, é a Teoria Clássica dos Testes (TCT).
    • Os pesquisadores dizem que a TCT não permite comparar provas aplicadas em anos diferentes porque as questões sempre diferentes de um ano para o outro e tendem a ser mais difíceis do que o esperado para o nível dos alunos.

    O grupo analisou os resultados obtidos pelas escolas no Provão Paulista e no Saresp e como os estudantes respondem a cada uma das provas. Os dados coletados indicam que o Provão Paulista apresenta níveis de acerto muito baixos — com médias próximas a 2,0 — em várias disciplinas, com padrões de resposta semelhantes a um padrão aleatório — como se os alunos tivessem “chutado” a maior parte das respostas.

    Já no Saresp, a análise das respostas mostrou que há uma taxa menor de “chutes” e indica que o perfil da prova consegue diagnosticar melhor a aprendizagem dos estudantes, segundo a pesquisa. Os especialistas argumentam que o Provão “definitivamente não serve para avaliar o sistema de ensino”.

    A análise se baseou nos microdados do Saresp e do Provão Paulista de 2023 e 2024, em relatórios técnicos do Saresp e em dados sobre o afastamento de diretores escolares obtidos junto às 91 Diretorias de Ensino da rede estadual via Lei de Acesso à Informação.

    Recomendações do estudo

    Na conclusão do estudo, os pesquisadores recomendam a reversão dos afastamentos de diretores escolares feitos com base na resolução que obriga o atingimento de no mínimo 50% da Meta Ouro, e recomendam também que o Provão Paulista não seja utilizado como avaliação de sistema de ensino. Em nota, a Seduc afirmou que “nenhum diretor é afastado com base exclusivamente em avaliações externas”.

    Apesar da resolução da própria pasta dizer que os diretores terão seu desempenho considerado insatisfatório caso não alcancem 50% da Meta Ouro – o que os deixaria sujeitos ao afastamento, segundo as regras da secretaria -, a gestão diz que “não há qualquer resolução da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo que preveja o afastamento de diretores escolares por variação de 0,2 ponto em avaliações” e diz que a interpretação não tem “fundamento técnico nem respaldo normativo”.

    “O desempenho das escolas é analisado a partir de um conjunto amplo de critérios, que inclui: frequência de alunos e professores, participação em formações, presença e acompanhamento pedagógico nas unidades, resultados do Saresp/Provão Paulista e indicadores de ajuste de desigualdade, que consideram o contexto e a realidade de cada escola”, diz a secretaria.

    Segundo a pasta, o descumprimento da resolução não assegura o desligamento do diretor. “Os profissionais que não atingem o nível mínimo dos critérios passam por uma avaliação da Unidade Regional de Ensino, que analisa a atuação da direção escolar com base em critérios técnicos e objetivos. Esses fatores são avaliados de forma integrada, a fim de garantir um processo justo, técnico e transparente, sempre voltado à melhoria da gestão e da qualidade do ensino na rede estadual”, termina a nota.