A popularização da melatonina como solução rápida para dormir melhor reacendeu um debate importante sobre segurança e uso responsável. Embora o hormônio — produzido naturalmente pelo organismo — seja amplamente estudado e considerado seguro em doses baixas e por períodos curtos, novas pesquisas levantaram dúvidas sobre o impacto do uso prolongado no sistema cardiovascular.
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Um estudo apresentado no Scientific Sessions 2025, da American Heart Association (AHA), analisou dados de mais de 130 mil pessoas com insônia e observou que aquelas que usavam melatonina diariamente há mais de um ano apresentaram maior incidência de insuficiência cardíaca, hospitalizações e mortalidade geral em comparação aos que não utilizavam o hormônio.
Os números chamam atenção: risco 90% maior de desenvolver insuficiência cardíaca em cinco anos e até 3,5 vezes mais hospitalizações.
A análise, porém, não estabelece relação de causa e efeito, e os próprios autores destacam que os resultados ainda são preliminares. Especialistas independentes também alertam para possíveis “falsas associações”, já que pessoas com insônia crônica possuem risco cardiovascular naturalmente mais elevado.

Contexto científico
Para a farmacêutica Paula Molari Abdo, o estudo deve ser lido dentro de um contexto mais amplo.
“A melatonina é um hormônio que o próprio organismo produz todas as noites e, em muitos estudos, ela aparece como protetora do coração, reduzindo estresse oxidativo, inflamação e até danos associados ao infarto. Em doses usuais, por períodos curtos ou intermitentes, não há evidência sólida de que ela cause problemas cardíacos.”
Abdo explica que a melatonina pode provocar uma discreta queda da pressão arterial durante a noite, que pode ser benéfico para alguns hipertensos. Mas, reforça que essa interação exige acompanhamento, especialmente em pessoas em tratamento para pressão alta ou com pressão naturalmente baixa.
Ela afirma que o ponto crítico não é o suplemento em si, mas o uso diário, prolongado e sem orientação, já que a melatonina participa de mecanismos metabólicos e cardiovasculares ainda não totalmente compreendidos em cenários de uso contínuo.
No Brasil, doses até 0,21 mg são vendidas como suplemento alimentar. Acima de 0,25 mg, há exigência de prescrição — um indicativo, segundo Abdo, de que doses mais altas e uso frequente devem ser monitorados, principalmente em pacientes com hipertensão, diabetes, doença coronariana ou insônia persistente.
É importante realizar a higiene do sono
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Mulheres e homens têm diferentes sintomas relacionados ao coração
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Pacientes com comorbidades não devem tomar melatonina sem acompanhamento médico
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Insônia é uma condição que aumenta o risco cardíaco
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É necessário manter os exames em dia
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Hipóteses
A farmacêutica Silmara Spinelli, responsável técnica do Empório Magistral, também destaca que o estudo não deve ser encarado como um alerta de risco generalizado:
“Quando a melatonina é utilizada em doses baixas, de forma não contínua e com acompanhamento adequado, ela não apresenta problemas para a maior parte das pessoas. Pelo contrário: diversos estudos já demonstram que ela pode auxiliar na qualidade do sono e, indiretamente, contribuir para a melhora da pressão arterial e de parâmetros cardiológicos, já que noites mal dormidas têm impacto direto no sistema cardiovascular.”
Spinelli reforça que o estudo recente levanta hipóteses sobre possível agravamento de insuficiência cardíaca apenas em pessoas com doenças cardíacas específicas, em uso de doses elevadas por longos períodos — e mesmo assim, sem caráter conclusivo.
“Não configura uma recomendação geral. Se houver necessidade de usar melatonina, que seja com indicação e acompanhamento médico. Pessoas com fatores de risco cardíaco devem manter sua avaliação cardiológica em dia”, afirma a profissional.
Sinais de alerta
Para usuários de longo prazo, alguns sintomas merecem atenção, segundo Paula Molari Abdo:
- Tontura
- Cansaço excessivo
- Falta de ar
- Inchaço nas pernas
- Palpitações
Esses sinais raramente são causados diretamente pela melatonina, mas podem indicar doenças cardiovasculares silenciosas que precisam ser investigadas.
Paula Molari Abdo
O verdadeiro problema pode não ser a melatonina
As especialistas lembram que a melatonina, muitas vezes, vira uma solução rápida para questões que exigem avaliação mais profunda.
“Muitas vezes o problema não é falta de melatonina, mas apneia do sono, ansiedade, jetlag social ou hábitos inadequados à noite”, afirma Abdo. “Antes de tomar o suplemento por longos períodos, o ideal é entender a origem da dificuldade de dormir.”
Silmara Spinelli complementa reforçando a importância da higiene do sono, como ambiente escuro e silencioso, evitar telas antes de deitar, limitar dispositivos perto da cama e manter horários regulares.
A melatonina continua sendo considerada segura e eficaz em baixas doses, por períodos limitados e com orientação profissional. O estudo recente abre espaço para novas investigações, mas não muda a recomendação central: uso responsável, acompanhamento médico para quem tem fatores de risco e prioridade para um sono natural e saudável.
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