Investigada pela Polícia Civil do DF (PCDF) por sonegar R$ 15 milhões, uma drogaria da rede Sayonara recebeu mais de R$ 1,3 milhão do Ministério da Saúde de 2014 a 2025, recurso proveniente do programa Farmácia Popular, onde o Governo Federal paga drogarias credenciadas para fornecerem medicamentos de graça ou de baixo custo à população.
Entre janeiro e novembro deste ano, valores foram pagos em 10 parcelas, entre R$ 4 mil e R$ 7 mil a uma das farmácias da rede Sayonara, totalizando mais de R$ 50 mil. O último repasse foi no último dia 4 de novembro, no valor de R$ 7.087,28.
A rede Sayonara é uma das maiores do ramo de padarias e farmácias que funcionam em sua maioria na região administrativa do Gama (DF), e é investigada pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) na Operação Bethlehem, deflagrada na última quarta-feira (19/11), que aponta sonegação de impostos de mais de R$ 15 milhões entre os anos de 2017 e 2022.
Uma das drogarias da rede investigada com a razão social no nome de Drogaria Saraiva Ltda tem o nome fantasia de Drogaria Sayonara e os sócios são Wanderson Lima Freitas de Abreu, 44 anos, e João Mendes Saraiva, de idade não informada. O estabelecimento está aberto desde setembro de 2009 e funciona no Setor Central do Gama.
Em agosto deste ano, o grupo Sayonara anunciou nas redes sociais que todas as farmácias da rede se tornaram Drogafarma Vasconcelos, mas seguem operando no mesmo endereço. Apesar de apontarem três sedes, constam 4 empresas do ramo de farmácias da rede Sayonara em endereços diferentes no Gama (DF), somando no total um capital social de mais de R$ 280 mil.
Em agosto de 2022, um dos proprietários, Wanderson Freitas de Abreu Lima, foi preso pela PCDF em flagrante por furto de energia. A Operação Massa Fresca visava combater o furto de energia elétrica em todo o Distrito Federal. Durante a ação, duas padarias e uma pizzaria, todas localizadas no Gama, foram flagradas com irregularidades na medição consumida e mensurada pelos medidores.
À época, o empresário passou por audiência de custódia e teve a liberdade provisória concedida pela Justiça do DF. Em 2023, Wanderson foi beneficiado pelo acordo de não persecução penal.
Empresas investigadas
De acordo com a PCDF, os empresários criaram uma empresa fantasma registrada em nome de dois “laranjas”: um sobrinho e um funcionário do contador responsável pela contabilidade da rede. Em nome dessa empresa, eram habilitadas máquinas de cartão de crédito e débito, utilizadas para registrar vendas que não apareciam nos balanços oficiais das padarias e farmácias. Assim, o faturamento das empresas era artificialmente reduzido e os tributos, sonegados.
O delegado do Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Decor) Gabriel Eduardo confirmou que até o momento envolvimento de 8 pessoas até agora, mas o número pode ser maior. “Há indícios de lavagem de dinheiro a serem investigados”, contou.
O Metrópoles apurou que existem mais de 20 empresas do ramo de farmácias e padarias, sendo 12 com o nome da rede Sayonara. A Decor informou que há a suspeita da existência de outras empresas com outros nomes envolvidas no esquema.
Em relação aos recursos recebidos do programa Farmácia Popular, o delegado Gabriel Eduardo informou que não há nenhuma irregularidade constatada envolvendo recursos públicos do Governo Federal.
Para aprofundar as provas, a polícia cumpriu 10 mandados de busca e apreensão em endereços no Gama, Santa Maria, Ceilândia e Valparaíso de Goiás (GO).
A rede de padarias é acusada de sonegar mais de R$ 15 milhões entre 2015 e 2022
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Fachada da rede de padarias
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Rede de padarias Sayonara foi alvo de operação da PCDF
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Veículos e mais de R$ 100 mil foram apreendidos na operação desta quarta-feira (19/11)
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A Justiça determinou apreensão de bens para ressarcimento do prejuízo público
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A investigação aponta que o prejuízo ao erário é foi de R$ 15 milhões
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Além disso, a Justiça determinou o sequestro de bens e valores equivalentes ao montante da dívida, cerca de R$ 15,5 milhões, como forma de ressarcir os cofres públicos e enfraquecer financeiramente o grupo criminoso. Durante a operação foram apreendidos R$ 107 mil em espécie e 6 carros.
Os investigados podem responder por sonegação fiscal, falsidade ideológica, associação criminosa e lavagem de dinheiro. Somadas, as penas podem chegar a 24 anos de prisão
Farmácia Popular
Relançado em 2023 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Farmácia Popular é um dos principais programas do Governo Federal para garantir à população brasileiro acesso integral à saúde, como distribuição de medicamentos, fraldas geriátricas e absorventes, gratuitamente ou com desconto. A política é fruto de uma parceria entre Ministério da Saúde, farmácias e drogarias, além das Unidades Básicas de Saúde, que disponibilizam os remédios.
Os brasileiros que têm diabetes, asma, hipertensão e osteoporose podem ter acesso a medicamentos gratuitos. E, desde 2023, também para osteoporose e anticoncepcionais. Também no ano passado, foram incorporados remédios novos para pessoas com HIV ou Aids, doenças infecciosas e raras.
Para 2025, o valor previsto de investimento no Farmácia Popular no Projeto de Lei Orçamentário Anual (PLOA) é de R$ 4,2 bilhões, um aumento de 69% comparado ao ano de 2022, sendo maior orçamento da história.
A drogaria Sayonara, agora Drogafarma Vasconcelos, anuncia na fachada da drogaria que é credenciada do programa do Ministério da Saúde, além de publicações nas redes sociais, onde ensina os clientes a adquirirem os remédios com desconto ou de graça.
O outro lado
O Ministério da Saúde foi acionado para se manifestar a respeito dos repasses para a farmácia investigada e respondeu por meio de nota. Leia abaixo, na íntegra:
O Ministério da Saúde suspendeu de forma preventiva os repasses federais e as atividades da farmácia mencionada no programa Farmácia Popular. Também determinou apuração interna sobre a situação do estabelecimento. Não há, até o momento, nenhuma relação entre os fatos investigados e o programa. Em 2025, mais de 9 mil farmácias foram descredenciadas do Programa Farmácia Popular em ação do Ministério da Saúde para coibir fraudes. Foram realizadas também inspeções em 21 estados do país para verificar a regularidade da distribuição dos medicamento nos estabelecimentos. As medidas são realizadas de forma integrada com a CGU como parte do fortalecimento do controle adotado pela atual gestão do Ministério da Saúde.
A defesa da rede Sayonara também foi procurada, mas não deu retorno ao contato.
Anteriormente, a rede disse ter recebido com surpresa a operação e refutou as suspeitas de práticas ilícitas vinculados ao grupo e explicou estar colaborando com as autoridades. “A empresa pauta suas atividades pela estrita legalidade e transparência, mantendo um histórico de rigoroso cumprimento de suas obrigações fiscais e regulatórias”, disse a rede de padarias.
As padarias e farmácias seguem funcionando normalmente, apesar dos bens sequestrados e apreendidos pela PCDF e as investigações seguem em andamento para descobrir possíveis irregularidades.
