Nos primeiros seis meses deste ano, 55 mulheres quase tiveram suas vidas interrompidas por motivo de gênero no Distrito Federal. Cerca de 47,3% já havia procurado ajuda antes, registrando ocorrências contra os agressores. Segundo o Estudo dos Feminicídios Tentados no DF, da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), cada vítima fez, em média, três denúncias de violência doméstica antes de sofrer uma tentativa de feminicídio.
Do total de vítimas de feminicídio tentado, 25 dessas mulheres registraram uma soma de 67 ocorrências de violência doméstica praticadas anteriormente pelos mesmos autores na capital do país. Uma delas chegou a denunciar oito vezes o seu agressor.

De acordo com o estudo da SSP-DF, 96,2% das vítimas que registraram ocorrência requereram medidas protetivas de urgência antes de sofrerem a tentativa de feminicídio. Todavia, no momento do crime, em apenas 61% dos casos elas estavam vigentes.
Considerando o total de vítimas de tentativa de feminicídio, mesmo aquelas que não registraram ocorrências anteriores ao fato, 60% delas sofreram violência doméstica.
Em relação as mulheres analisadas, o estudo também aponta que em 36% dos casos, o feminicídio não foi consumado devido a intervenção de terceiros, seguido por 24% por conta da eficiência do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Tatyane Mendes, pesquisadora em gênero, violência e saúde mental das mulheres, pondera que a engrenagem estatal é marcada por burocracia, falta de articulação intersetorial e ausência de uma escuta qualificada, o que faz com que muitas vezes a denúncia não se traduza em proteção real para as vítimas.
“O Estado ainda trata essas denúncias como conflitos domésticos, e não como crimes estruturais de ódio e controle. É herança de um passado em que ainda se acreditava na máxima de ’em briga de marido e mulher, não se mete a colher”, aponta.
Segundo a pesquisadora, falta articulação entre polícia, Judiciário, Ministério Público e assistência social. “Cada órgão atua de modo isolado, o que leva à revitimização e à perda de informações fundamentais para prevenir o agravamento dos casos”, argumenta.
A especialista também alerta sobre a urgência de investir em educação de gênero nas escolas, autonomia econômica das mulheres, formação contínua de agentes públicos e responsabilização efetiva dos agressores.
“No Distrito Federal, assim como em todo o país, a violência de gênero revela as contradições de um Estado que reconhece formalmente alguns direitos para as mulheres, mas não os efetiva materialmente, deixando brechas entre a lei e a vida concreta. Romper com isso exige não apenas mais leis, mas uma mudança cultural, social e institucional profunda, que coloque o cuidado e a vida das mulheres no centro das prioridades das políticas públicas”, analisa.
Relação entre vítimas e autores
Em 85,2% dos casos, vítima e autor mantinham ou já tiveram relacionamento amoroso. Dos agressores, 35 deles eram ex-companheiros da mulheres.
Na maioria dos crimes registrados (70%), o casal estava em processo de separação. Segundo o levantamento, 57% das tentativas de feminicídio foram motivadas por ciúmes/posse e não aceitação do término.
A última atualização do estudo também indicou que 72% desses autores respondiam ao processo presos.
Ferimento com “garrafa”
Um homem, de 27 anos, foi preso pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) por tentativa de feminicídio, em Santa Maria. O crime ocorreu na madrugada dessa terça-feira (28/10), quando o suspeito desferiu golpes de faca em sua companheira.
A corporação foi acionada após o Hospital Regional de Santa Maria informar a entrada da mulher ferida, com lesões aparentes provocadas por arma branca. No local, os profissionais que prestaram socorro relataram a suspeita de agressão aos policiais.
No hospital, a vítima, que estava acompanhada do suspeito, confirmou aos militares que foi esfaqueada por ele durante uma discussão. Já o homem alegou que ela havia caído sobre uma garrafa quebrada.
Entretanto, após ser confrontado, o homem confessou crime e revelou que a faca utilizada estava coberta por um cobertor em cima da cama.
Espancamento
A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) prendeu em flagrante, no domingo (26/10), um homem de 42 anos acusado de espancar a companheira, deixá-la com o rosto desfigurado e divulgar vídeos íntimos da vítima nas redes sociais. O crime ocorreu na DF-065, na altura do Caub I, região do Riacho Fundo II.
O agressor, identificado como Nilton Imaculado Ribeiro, buscou a mulher nas primeiras horas da manhã e iniciou uma discussão dentro do carro, motivada por ciúmes.
Durante o trajeto, passou a agredi-la violentamente com socos no rosto. Para escapar, a vítima se jogou do veículo em movimento e foi socorrida por populares em estado grave.
Mesmo após o ataque, o suspeito utilizou o celular da companheira para divulgar vídeos íntimos da mulher em redes sociais e grupos de WhatsApp, além de postar as imagens no status do próprio número da vítima, acompanhadas de mensagens ofensivas. Ele também teria ameaçado familiares da mulher para impedir que o caso fosse denunciado.
Durante as diligências, a PCDF descobriu que o homem estava em liberdade temporária (“saídão”) e cumpria pena no Centro de Progressão Penitenciária (CPP).
Golpes com picareta
Um homem identificado como Agnaldo Nunes da Mota foi preso em flagrante após agredir brutalmente sua companheira, Camila Rejaine de Araújo Cavalcante, com golpes de picareta na cabeça. O feminicídio ocorreu em Sobradinho II, na sexta-feira (24/10).
O crime foi cometido na residência do casal, e o autor ainda tentou arrastar a vítima até uma cachoeira próxima, com a intenção de se desfazer do corpo.
De acordo com o policial que conduziu a ocorrência, a equipe foi acionada para atender a uma denúncia de violência doméstica. Ao chegarem ao local, os policiais encontraram o agressor arrastando a mulher para fora do portão da casa.
Uma testemunha afirmou que, na noite anterior (23/10), Agnaldo já havia dito que mataria a companheira após uma discussão.
Em outubro do ano passado, Agnaldo já havia desferido um golpe de facão no tórax de Camila. Ele chegou a ser preso, em março de 2025, mas acabou solto. Nessa sexta, o agressor atacou novamente a vítima, desta vez fatalmente.
