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Morador da zona sul fica entre ônibus ruim e “roleta-russa” na moto

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Morador da zona sul fica entre ônibus ruim e “roleta-russa” na moto

Moradores do Grajaú, na zona sul de São Paulo, têm enfrentado há anos o dilema entre se locomover por meio de um transporte público ruim, com ônibus lotados, ou encarar o trânsito nas motos, com alto risco de acidentes e sequelas que, muitas vezes, podem incapacitar o cidadão, quando não o levam à morte.

A escolha entre essas alternativas, algo que faz parte do dia a dia de quem vive no bairro de quase 400 mil habitantes, é um exemplo dos problemas da mobilidade urbana na capital paulista, algo que pode se acentuar, principalmente na periferia, com a entrada em circulação dos mototáxis por aplicativo (motoapps, segundo as empresas), a partir de 11 de dezembro.

Especialistas ouvidos pelo Metrópoles afirmam que, sem uma reestruturação que dê prioridade a um transporte público de qualidade, a tendência é que ocorra perda contínua de passageiros para as motos e, consequentemente, menos recursos para investir em melhorias, em um círculo vicioso. Ou seja, a prefeitura precisa agir nas causas da debandada.

Pagar para andar sobre mototáxis não é novidade no Grajaú. O serviço, considerado clandestino pela administração municipal, sem regulamentação, funciona há mais de década na região, com placa de preços ao lado do terminal e demanda garantida pela ineficiência do transporte público.

Para entender as opções disponíveis e as escolhas dos moradores, é preciso compreender o cenário. A Avenida Dona Belmira Marin é a principal do Grajaú, com seus mais de 7 km de extensão, um gargalo que “escoa” o fluxo ainda no fim da madrugada, e o recebe de volta no início da noite. Pelo segundo ponto de ônibus, na altura do número 1.020, por exemplo, passam em direção ao interior do bairro 25 linhas, que transportam mais de 120 mil passageiros diariamente.

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Ônibus na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Socorro a motociclista na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Motos na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, em São Paulo

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Socorro a motociclista na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Socorro a motociclista na Avenida Dona Belmira Marin, no Grajaú, na zona sul de SP

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Tabela de preços do mototáxi no Terminal Grajaú, na zona sul de São Paulo

William Cardoso/Metrópoles

Mesmo duplicada em 2014, a Belmira Marin ainda é bastante estreita. Tem uma faixa para ônibus e outra para demais veículos em cada sentido de direção, sem espaço razoável para a circulação de motos nos “corredores”. Não por acaso, entre janeiro e outubro deste ano, foram registrados 109 acidentes envolvendo motocicletas no local. A via aparece sempre entre aquelas com maior quantidade de sinistros dessa natureza na cidade.

Amontoados nos ônibus ou espremidos no trânsito, os moradores do Grajaú se estressam na ida e na volta de suas atividades diárias. Na última quarta-feira (19/11), no fim da tarde, a reportagem esteve na Belmira Marin e flagrou desde acidente com moto até o inferno para se embarcar em um coletivo, algo que já havia sido registrado pelo Metrópoles há exatamente um ano.

Moto no chão

A viatura do resgate, do Corpo de Bombeiros, estava atravessada na Belmira Marin e Kaíque Gustavo, de 22 anos, sentia as dores no chão. Ele tinha acabado de sofrer um acidente na volta do trabalho, em uma empresa fora do bairro. Uma colisão com um carro o fez voar da moto e quebrar a perna em dois lugares.

Pai do rapaz, o motorista de aplicativo José Roberto Paiva da Silva, 45 anos, foi até o local para acompanhar o socorro. “Mais um acidente, como acontece todo dia. Como trabalho com aplicativo de carro, sempre vejo. Dessa vez, com meu filho”, afirmou.

Silva contou que Kaíque optou pela moto como forma de ter mais agilidade no deslocamento para o trabalho. “O transporte é muito precário mesmo, então quis ter agilidade para ir e vir, algo que todo o cidadão tenta. Porém, fica na balança. Ganha tempo ou perde, quando acontece uma coisa como essa”, disse.

Sobre a liberação de mototáxi (ou motoapp, como dizem as empresas) no Grajaú, o motorista disse que é inviável. “Não tem espaço para moto. São duas faixas, uma para ônibus, outra para carro. A moto trabalha entre os dois cantos. Não vale a pena”, afirmou.

A vendedora Ana Rita Oliveira, 23 anos, observava o resgate do rapaz enquanto conversou com a reportagem. Ela contou que também comprou uma moto para fugir do trânsito e das dificuldades do transporte público, mas também se machucou.

“Estava demorando três a quatro horas para chegar em casa, por causa [do trânsito] da avenida. Só que sofri um acidente, porque tentaram me assaltar e eu reagi”, disse. “Acabou que fiquei com um braço torto, porque não deixei levarem a moto, meu único meio de transporte, porque depender do transporte público na Belmira não dá”, afirmou.

A vendedora afirma que o pobre depende do transporte público, mas que, se não tem uma moto, não consegue chegar a tempo no trabalho.

“Vai acontecer bastante acidente, porque moto é muito perigoso. Porém, as pessoas vão se locomover melhor, ter mais liberdade”, disse. “A moto é o meio mais rápido e, para o pobre, é essencial.”

Ônibus lotado

Em 19 de novembro de 2024, o Metrópoles esteve na Belmira Marin para mostrar como os passageiros sofriam para conseguir embarcar nos ônibus na volta para casa.

Exatamente um ano depois, na última quarta (19/11), os problemas se repetiram, com corre-corre nos pontos, gente amontoada e muitas queixas de quem vê o coletivo ir embora sem ter a chance de entrar.

A auxiliar-administrativo Tatiane Ribeiro, 40 anos, tentava retornar do trabalho quando conversou com a reportagem. “Todo dia tem ônibus lotado. Quando não consegue pegar dentro do Terminal Grajaú, a gente vem aqui para fora”, disse, citando o primeiro ponto da avenida.

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Tatiane chegou a afirmar que a situação ainda estava boa na quarta, pouco antes de ter que correr para alcançar o ônibus, fora do ponto, e se espremer em meio aos outros passageiros. O motorista mal conseguiu fechar a porta.

Questionada sobre as motos, a auxiliar disse que não pega, porque tem medo. “Mas o pessoal acaba pegando mototáxi ali perto do terminal.”, disse, citando que viu muitos acidentes.

O que diz a Prefeitura de São Paulo

A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana e Transporte (SMT) e da SPTrans, afirma que o sistema municipal de ônibus é o principal vetor da mobilidade urbana do Grajaú, responsável por 43% das cerca de 600 mil viagens diárias.

A administração municipal também diz que a frota local tem idade média de 5,6 anos, oferece veículos 100% acessíveis e com mais de 90% de itens como ar-condicionado, Wi-Fi e tomadas USB. “Além disso, o Grajaú detém a maior cobertura de pontos de ônibus da capital, garantindo que seus 383 mil habitantes estejam a menos de 300 metros de uma parada, e as linhas operam com alta eficiência mesmo em horários de pico”, afirma.

A prefeitura diz que a SPTrans também trabalha na implantação do novo Terminal Cocaia, que fará integração com o Aquático-SP (barco que liga o Cantinho do Céu ao Mar Paulista).

A Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) monitora a Avenida Dona Belmira Marin por meio de rotas diárias, realizando ajustes nos semáforos e utilizando reforço de agentes para garantir a fluidez e a segurança do tráfego, segundo a prefeitura.

No âmbito da segurança viária, a prefeitura cita implantação da Faixa Azul, que soma 232,7 km em 46 vias e contribuiu para uma queda de 47,2% nas mortes de motociclistas nos trechos sinalizados entre 2023 e 2024. A CET também reforçou o monitoramento 24h em vias com maior número de ocorrências e ampliou as faixas com mensagens educativas.

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