O terreiro de candomblé Abassá Oxum e Oxóssi, localizado no bairro Cangaíba, zona leste da capital paulista, recebeu uma determinação de reintegração de posse pelo Fórum Regional VI da Penha, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) nessa terça-feira (25/11). Em processo de tombamento pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp), o terreiro ocupa o mesmo endereço desde 8 de julho de 1966, há mais de 59 anos.
“Como já deixei muito claro em decisões anteriores, este juízo foi por demasiado tolerante com a ré no sentido de postergar o cumprimento da tutela de urgência com vistas a uma solução amigável”, afirmou o juiz Sinval Ribeiro de Souza, da 2ª Vara Cível do TJSP.
O magistrado determinou a “reintegração de posse, desde já deferido concurso policial, ordem de arrombamento e o que mais for necessário para a completa desocupação da coisa”.
Cadeira da sacerdotisa do Abassá Oxum e Oxóssi
Material cedido ao Metrópoles
Salão do Abassá Oxum e Oxóssi
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Representantes do terreiro de candomblé Abassá Oxum e Oxóssi
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Jogo de búzios
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Terreiro foi fundado em 8 de julho de 1966 e está em processo de ser tombado como patrimônio histórico e imaterial de São Paulo
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Terreiro foi fundado em 8 de julho de 1966 e está em processo de ser tombado como patrimônio histórico e imaterial de São Paulo
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Mam’etu Kutala Diamuganga, líder religiosa do Abassá Oxum e Óxossi
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Terreiro de candomblé alvo de disputa judicial
A disputa judicial envolvendo o Abassá começou após a morte de Carlita Reis Gomes, a Mãe Caçulinha D’Oxum. Ela, que era sacerdote do candomblé e fundou a casa, faleceu em 2016. Desde então, Kátia Luciana Sampaio, neta de Carlita e herdeira espiritual dela, tomou a frente do terreiro enquanto mãe de santo.
Filhos e netos sanguíneos de Carlita, além de tios e primos de Kátia, acionaram a Justiça em 2022 pedindo a desocupação do espaço ou o pagamento de aluguel. Eles alegaram que o terreiro estaria inativo, mas as atividades nunca cessaram permanentemente, com exceção do período da pandemia de Covid-19, e retornaram logo após o falecimento de Caçulinha, afirmam os representantes do terreiro.
Em julho de 2017, pouco menos de um ano e meio após a morte de Carlita, a Mam’etu Kutala Diamuganga, Mãe Kátia foi entronizada e aclamada herdeira do Abassá, assumindo as funções de sacerdotisa. O rito atendeu ao último pedido de Caçulinha em vida, que desejava que o terreiro continuasse em funcionamento e que o imóvel não fosse vendido.
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Ainda em julho daquele ano, Mãe Kátia passou a morar no local onde funciona o terreiro, zelando pelo espaço e atendendo ao pedido da avó, após receber de forma voluntária as chaves do local por uma de suas tias. Ela permaneceu morando no Abassá até 2021, mas desde então visita o terreiro diariamente para manter as atividades sagradas.
E, em julho de 2022, após notificações pelo não pagamento do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) do imóvel, os filhos de Carlita pressionaram a saída de Kátia, exigindo as chaves e instalando placas de venda no portão. Meses depois, em dezembro, impetraram uma ação no TJSP.
No ano seguinte, em 9 de outubro de 2023, houve uma primeira tentativa de reintegração de posse, suspensa pela Justiça.
Proteção do terreiro
Em resposta às cobranças do IPTU, o Abassá argumenta que tem imunidade tributária por determinação constitucional, como estabelece a Emenda Constitucional nº 116/22. Falta, no entanto, o reconhecimento formal do direito pela Prefeitura de São Paulo.
Também está a cargo da administração municipal o tombamento do terreiro. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) chegou a abrir um processo para preservar o Abassá Oxum Oxóssi, mas a ação não seguiu em frente.
Um processo paralelo corre na administração municipal, através do Conpresp. Em nota, o órgão afirmou que já houve deliberação favorável do colegiado à abertura de processo de tombamento em reunião de junho de 2024, “de modo que o Terreiro de Candomblé Abassá Oxum Oxóssi conta com proteção cautelar pela Resolução nº 08/Conpresp/2024”.
A resolução é uma medida provisória e urgente que busca proteger um bem cultural ou imóvel com o risco de ser descaracterizado ou perdido enquanto seu processo de tombamento está em análise. A medida, então, protegeria o terreiro da reintegração de posse.
Para ser oficializada, a reintegração deve ser pautada em reunião do Conpresp. Em julho deste ano, uma publicação no Diário Oficial do munícipio notificou os herdeiros de Carlita sobre a medida. Desde então, a comunidade Abassá Oxum Oxóssi espera que o conselho discuta o tema para oficializar a preservação do terreiro.
Além do processo de tombamento, o terreiro está sob análise para possivelmente ser acrescentada às Zonas Especiais de Preservação Cultural e Área de Proteção Cultural (Zepec-APC). As APCs têm como objetivo proteger a continuidade do uso cultural de espaços referenciais para a cidade, segundo a Prefeitura de São Paulo.
“O instrumento pode ser aplicado a atividades que acontecem, por exemplo, em teatros, cinemas de rua, circos e centros culturais. Além desses espaços de produção artística, podem ser protegidos, também, locais de significado simbólico, religioso ou afetivo para a comunidade, onde essas atividades acontecem há, pelo menos, sete anos”, noticiou a gestão do município.
