MAIS

    “Insuportável”: moradores cobram ação contra mau cheiro na Billings

    Por

    Moradores da zona sul de São Paulo fizeram um abaixo-assinado cobrando a ação de autoridades para resolver o problema do mau cheiro na Represa Billings. O grupo relata que o “odor de esgoto” tem impactado a saúde e a qualidade de vida de quem mora e trabalha próximo à Billings.

    “Na noite passada eu não consegui dormir por causa do cheiro ruim”, conta Mayara Torres, de 30 anos. Moradora do bairro de Pedreira, a advogada é fundadora do projeto Direito Nosso, organização que atua na defesa dos direitos das populações periféricas, e foi uma das responsáveis pelo abaixo-assinado.

    Mais de 3,6 mil pessoas de bairros como Pedreira, Interlagos e IV Centenário já colocaram seus nomes no documento, desde o dia 6 de dezembro. Os moradores reivindicam que a Prefeitura de São Paulo e o governo estadual façam um plano urgente para acabar com o mau cheiro, e cobram mais fiscalização, limpeza e tratamento de esgoto na região da represa.

    Leia também

    Enjoos, náuseas e tonturas

    Nos comentários da plataforma que recolhe as assinaturas, pessoas contam que têm passado mal por causa do cheiro.

    “Vivemos com janelas e portas fechadas nesse calor e, mesmo assim, temos ânsia ao fazer refeições”, comentou Sandra Ferreira. “Passo o dia enjoada, não consigo comer e nem posso receber visitas. Esta situação tem que ser resolvida”, disse outra usuária, que se identificou como Camila.

    A auxiliar de logística Yasmim Souza, de 25 anos, mora próximo ao Autódromo de Interlagos há seis anos e diz que a situação nunca esteve tão ruim quanto agora. “Nunca vi esse cheiro do jeito que está. Sempre no final do ano fica ruim, mas agora tá muito pior”, afirma ao Metrópoles.

    Ela conta que não tem conseguido comer em casa por causa do problema. “A gente não tem nem apetite para comer”, diz, comentando que até os cachorros da família estão se alimentando menos neste fim de ano.

    A jovem relata ainda que tem sofrido com crises de tontura sempre que fica muito tempo em casa.

    A professora Iula Marques, de 42 anos, contou que a situação tem afetado alunos e funcionários na escola onde trabalha, no Parque Residencial Cocaia, no Grajaú.

    “Chega a ser insuportável. A princípio, a gente achou que era um problema da escola, mas, quando começamos a pesquisar, vimos que era da represa, estava em toda a região. É um cheiro que não dá para aguentar, é muito forte”, afirma.

    Iula diz que o fedor fica pior em dias de sol e quando chove depois de muitos dias secos. Nessas ocasiões, ela conta que chega a passar mal, com tontura e enjoo.

    “Insuportável”: moradores cobram ação contra mau cheiro na Billings - destaque galeria7 imagensRepresa Billings na altura da Avenida Mar PaulistaRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São PauloRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São PauloRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São PauloRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São PauloFechar modal.MetrópolesRepresa Billings na altura da Avenida Mar Paulista1 de 7

    Represa Billings na altura da Avenida Mar Paulista

    William Cardoso/MetrópolesRepresa Billings na altura da Avenida Mar Paulista2 de 7

    Represa Billings na altura da Avenida Mar Paulista

    William Cardoso/MetrópolesRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo3 de 7

    Represa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo

    William Cardoso/MetrópolesRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo4 de 7

    Represa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo

    William Cardoso/MetrópolesRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo5 de 7

    Represa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo

    William Cardoso/MetrópolesRepresa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo6 de 7

    Represa Billings na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, zona sul de São Paulo

    William Cardoso/MetrópolesAquático, na Represa Billings, na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, na zona sul de São Paulo7 de 7

    Aquático, na Represa Billings, na região do Cantinho do Céu, no Grajaú, na zona sul de São Paulo

    William Cardoso/Metrópoles

    De onde vem o cheiro

    Coordenadora do Laboratório de Análise Ambiental do Projeto Índice de Poluentes Hídricos (IPH) da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), a bióloga Marta Marcondes diz que o forte odor é resultado da ação de microrganismos em meio à poluição da represa.

    “Esses microrganismos são o que a gente chama de cianobactérias. Quando você começa a sentir esse cheiro, significa que há um aumento exacerbado desses microrganismos”, afirma a pesquisadora, que há anos estuda a qualidade das águas da represa.

    Até 2024, a gestora da represa era a Empresa Metropolitana de Águas e Energia (Emae), que foi comprada pela Sabesp no mesmo ano. A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) é a agência ambiental paulista responsável pelo desenvolvimento de ações de controle, licenciamento, fiscalização e monitoramento das atividades potencialmente poluidoras.

    Esgoto e eutrofização

    • Marta afirma que o esgoto não tratado jogado na Billings, assim como a reversão do Rio Pinheiros, que leva a água do rio para a represa em dias de chuva, tem colaborado para acelerar um fenômeno conhecido como eutrofização.
    • “A eutrofização é quando você joga muita matéria orgânica dentro de um corpo hídrico e esse corpo hídrico reage. Quem decompõe aquela matéria orgânica são microrganismos, que usam o oxigênio para decompor. Quando eu jogo muita matéria orgânica, os microrganismos vão usando todo o oxigênio que tem lá.”
    • O fenômeno provoca a coloração turva da água e também a morte de peixes. Segundo a bióloga, conforme o oxigênio diminui, entram em cena microrganismos que, para fazer a decomposição, liberam compostos responsáveis pelo cheiro ruim, como metano, sulfeto e sulfato.
    • A pesquisadora diz que é preciso investir na limpeza e na oxigenação das águas para melhorar o cenário.

    MPSP acionado

    Mayara diz que os odores têm impactado também comércios e serviços da região. A advogada conta que funcionários de uma academia da Estrada do Alvarenga têm usado sprays para tentar aliviar o cheiro da represa para seus clientes. Há relatos, ainda, de restaurantes com vendas prejudicadas por causa do problema.

    Por meio do projeto Direito Nosso, ela acionou o Ministério Público de São Paulo e pediu a instauração de um inquérito e uma ação civil pública para investigar a responsabilidade pelos danos ambientais e sanitários decorrentes do mau cheiro.

    O grupo também enviou um ofício à Secretaria do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística solicitando uma reunião com a Sabesp, a Cetesb e a Emae para discutir uma solução para o caso.

    “As pessoas só querem viver bem, descansar depois de um dia de trabalho. É muito frustrante ver que a gente precisa se esforçar para conseguir o mínimo”, diz Mayara.

    “Insuportável”: moradores cobram ação contra mau cheiro na Billings - destaque galeria4 imagensRepresa Billings vista do bairro Jardim ApuráLoteamento clandestino nas margens da Represa BillingsRepresa BillingsFechar modal.MetrópolesLixo nas margens da represa Billings1 de 4

    Lixo nas margens da represa Billings

    Jessica Bernardo / MetrópolesRepresa Billings vista do bairro Jardim Apurá2 de 4

    Represa Billings vista do bairro Jardim Apurá

    Jessica Bernardo / MetrópolesLoteamento clandestino nas margens da Represa Billings3 de 4

    Loteamento clandestino nas margens da Represa Billings

    Jessica Bernardo / MetrópolesRepresa Billings4 de 4

    Represa Billings

    Jessica Bernardo / Metrópoles

    Outro lado

    A Prefeitura de São Paulo afirma que realiza periodicamente a limpeza de aproximadamente 10 córregos que deságuam na Represa Billings, removendo cerca de 37 toneladas de resíduos por mês. Além disso, promove a coleta dos resíduos comuns, recicláveis e de saúde em toda região.

    De acordo com a administração municipal, na atual gestão, o Programa Mananciais já transformou a vida de mais de 40 mil famílias que vivem no entorno das represas Billings e Guarapiranga com a entrega de 1.689 novas unidades habitacionais entre 2021 e 2004, além de parques, áreas de lazer e projetos de urbanização, totalizando mais de R$ 3,77 bilhões em investimentos.

    “Não há registros consolidados, até o momento, que confirmem uma relação direta entre as queixas de náuseas, tonturas ou dor de cabeça e o odor proveniente da Represa Billings. As equipes da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) seguem orientadas a avaliar todos os pacientes. Como medida preventiva, a população deve manter os ambientes ventilados, evitar exposição prolongada ao odor sempre que possível e procurar a unidade de saúde de referência em casos de sintomas persistentes ou agravamento do quadro clínico”, completa a nota da prefeitura.

    Procuradas, a Sabesp, Emae e Cetesb não responderam à reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.