Na linha de frente de combate aos crimes cibernéticos, a delegada Lisandrea Salvariego, chefe do Núcleo de Operações e Articulações Digitais (Noad) da Polícia Civil de São Paulo, recebe cada vez mais ameaças por conta do trabalho que exerce. A cada caso que repercute, o tom dos intimidadores sobe.
Em uma ameaça recente, um suspeito afirmou que iria “matar e fazer necrofilia” com a delegada. Em outra, feita após a prisão de um jovem de 18 anos que estimulava automutilação pela internet e teria feito cerca de 30 vítimas, entre crianças e adolescentes, um usuário do Instagram comentou em uma publicação: “Lis vai morrer”.
O mesmo perfil, que não tem nome ou foto para não ser identificado, disse ainda que iria “pessoalmente na casa dela matar e degolar essa puta [sic]”. “E vocês não podem fazer nada”, acrescentou o usuário.
Lisandrea compartilhou com o Metrópoles algumas das ameaças que recebe. Ela também encaminhou exemplos de como esses intimidadores conversam com as vítimas em aplicativos de mensagem. Veja na galeria abaixo:



Ameaça direcionada à delegada Lisandrea Salvariego, chefe do Noad, da Polícia Civil de São Paulo
Material cedido ao Metrópoles
Ameaça direcionada à delegada Lisandrea Salvariego, chefe do Noad, da Polícia Civil de São Paulo
Material cedido ao Metrópoles
Conversa entre “mentor” de automutilação e vítima
Material cedido ao Metrópoles
Conversa entre “mentor” de automutilação e vítima
Material cedido ao Metrópoles
Conversa entre “mentor” de automutilação e vítima
Material cedido ao Metrópoles
Jovem preso mandou vítima mutilar nome de delegada no corpo
Luiz Fernando Souza, jovem, de 18 anos, preso no interior de Santa Catarina, na manhã dessa segunda-feira (15/12), e que fez cerca de 30 vítimas de automutilação, obrigou uma menina a escrever “Lisa”, com uma navalha, no próprio braço.
O “recado” seria destinado a Lisandrea em tom de ameaça. Luiz chegou a publicar a foto em uma rede social com a legenda: “presentinho pra Lisa kkkkk [sic]”.
Para a delegada, o sentimento despertado ao ver a imagem foi “péssimo”. “Acho que é o pior sentimento que há. Mas é isso que dá força para a gente prosseguir, a gente não pode parar”, declarou.
Ameaças são frequentes, mas motivam
Lisandrea afirma que as ameaças que recebe são frequentes, mas causam um efeito “motivacional”. As intimidações, segundo ela, iniciaram assim que a delegada assumiu a chefia do Noad, em novembro do ano passado, quando surgiu o núcleo. “Desde que começamos a investigar as lideranças de servidores tidos como mais violentos”, detalhou.
Questionada se é um alvo de constantes ameaças por ser mulher, Lisandrea confirma que sim, mas acrescenta outro motivo: o fato de as vítimas criarem proximidade e afeto por ela.
E não é apenas a autoridade que sofre perseguições e ameaças, mas também a família de Lisandrea. A policial relatou que o irmão teve o WhatsApp da clínica onde trabalha “travado”. “Ele é geriatra e ficou duas semanas sem atender, praticamente. Tentam clonar cartões, habilitar IMEIs no meu celular. Um inferno”, desabafou.
Apesar disso, a delegada diz que não vê a necessidade de proteção, como escolta oferecida a autoridades que sofrem ameaças do crime organizado, ao menos “por hora” – principalmente porque os ataques à ela e à família são virtuais. “Eu tomo alguns cuidados”, garantiu.
Ameaçada junto com o delegado-geral de São Paulo, Artur Dian, Lisandrea demonstra força pela posição que ocupa.
“A mesma coisa que eles fazem com as vítimas, eles fazem com a gente. Só que a gente tem discernimento. Nós somos autoridades, a gente consegue investigar e chegar neles, e as vítimas ficam com medo”, destacou.
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Conheça o Noad
O Noad foi implantado pela Secretaria da Segurança Pública (SSP), em novembro de 2024, como o primeiro núcleo do país especializado no combate a crimes virtuais contra crianças e adolescentes.
Vinculado à Polícia Civil de São Paulo, o departamento realiza investigações que se desdobram em diferentes estados do Brasil, como Santa Catarina, Rio de Janeiro e Pernambuco.
Criado há pouco mais de um ano, o núcleo conta com policiais civis atuando infiltrados 24 horas por dia em comunidades e grupos da internet para detectar atividades criminosas. Também compõem a equipe policiais militares e peritos.
Para Lisandrea, é importante que os pais monitorem as plataformas às quais os filhos têm acesso. “É fácil julgá-los e dizer que o pai não está prestando atenção, o pai está omisso, sendo que eles nem sabem que isso está acontecendo. Então, eu acho que [precisamos] difundir informação e alertá-los sobre o que está acontecendo nas redes”, disse.
Ela orienta os pais e responsáveis a observarem as crianças e os adolescentes. Se virem algo errado, como uma automutilação ou comportamento estranho, é indicado registrar um boletim de ocorrência (BO).
“Pega o nick [nome de usuário] do agressor, ID e plataforma onde tudo isso aconteceu, e faça um boletim de ocorrência. Porque não é só aquela vítima, né? O agressor faz ao mesmo tempo inúmeras vítimas ao mesmo tempo”, reforçou a delegada.



