A terra, ao contrário do que pregam alguns devotos do ex-capitão, não é plana. Ela capota. E em uma dessas voltas caprichosas da política, o velho bordão “bandido bom é bandido morto” foi devidamente sepultado pelos seus próprios criadores.
No Congresso, a retórica mudou. A bancada que construiu carreiras exigindo o fim das “mordomias” para detentos e o endurecimento penal, agora clama por dignidade, amplo direito de defesa e humanismo. O motivo é cristalino: a clientela do sistema penal mudou.
Em discurso na Câmara, a deputada Erika Hilton (PSOL-SP) batizou o novo momento da legenda de Valdemar Costa Neto com uma precisão cirúrgica:
“Aqueles e aquelas que não respeitarem a democracia irão fazer jus ao nome deste partido PL, que é o ‘Partido da Papuda Lotada’. É Ramagem, é Bolsonaro, Augusto Heleno, é Anderson Torres… agora o próximo é Eduardo Bolsonaro, Carla Zambelli que fugiu.”
A fala escancara a crise de identidade da extrema-direita. O grupo que se autodenominava “bastião da moralidade” vê seus quadros principais migrarem do plenário para o banco dos réus.
É o retrato final da falência do discurso do “cidadão de bem”. Os “senhores da família”, quando têm seus partidos revirados, revelam entranhas que não diferem daquilo que juraram combater.
É fascinante — e trágico — observar a metamorfose. O punitivismo feroz deu lugar a um garantismo de ocasião.
Quando a lei bate à porta e a tornozeleira eletrônica apita – ou é violada por uma solda – no tornozelo de um aliado, o discurso de ódio aos Direitos Humanos evapora. Descobriram, pela força das circunstâncias, que a Constituição e as garantias fundamentais existem para proteger a todos — inclusive aqueles que passaram quatro anos tentando destruí-las.
O “Partido da Papuda Lotada” segue de portas abertas. E a única coerência que resta é o silêncio constrangedor de quem percebeu que a cela que desejavam para os adversários acabou servindo para eles mesmos.
Dói? Dói. Mas a realidade, tal qual a lei, é dura.
