O policial civil acusado de participar de um esquema de agiotagem no interior de São Paulo, que teve a condenação revertida por decisão da 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do estado, fazia ameaças de morte às vítimas do esquema, por meio de mensagens de WhatsApp. Os prints dos diálogos foram apresentados pelos promotores do Gaeco de Franca na denúncia e citados na decisão de primeira instância que condenou o grupo.
“Vai se fuder, seu gordo maldito. Vou catar vc. Seu capeta dos infernos, vc vai ver como funciona, seu filha da puta. Vou atrás da sua família tbm seu”, disse o policial em uma das mensagens.
“Devolve tudo o dinheiro. Se não eu vou te quebrar no meio, seu filha da puta. Te avisei pra não atrasar essa desgraça”, afirma o agente público a outro alvo.
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Print mostra ameaça feita por policial a vítima
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De acordo com as investigações, o grupo atuou, pelo menos, desde 2020 na região, cobrando taxas abusivas por empréstimos e exigindo o pagamento por meio da violência. Evanderson Lopes Guimarães, apontado como líder, contava, segundo os promotores, com uma rede de empresas e comparsas para atrair “clientes” e exigir o pagamento pelos empréstimos.
O policial que supostamente atuava para o grupo também foi citado em interceptações telefônicas entre investigados, como o próprio Evanderson. No diálogo, eles afirmam que o policial pretendia “pôr um dinheiro”.
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“O [nome] quer falar um negócio lá, quer pôr um dinheiro comigo, o cara falou assim, que é melhor eles se unirem, se estruturarem”, afirma Evanderson a um investigado, em conversa interceptada. “Mas cê já tá ligado a tocada do cara, já te deu três paulada na sua coluna”, responde o interlocutor, em provável referência ao policial.
Ao defender a anulação das condenações, o desembargador Marco Antônio Pinheiro Machado Cogan se limitou a comentar sobre a presença do nome do policial em planilhas encontradas com investigados acusados de extorsão, como se essa fosse a única prova da corrupção. Em uma delas, o nome do policial aparece ao lado de uma anotação com o valor de R$ 341 mil, referente a uma quantia que seria transferida por ELG.
Anulação de condenações
A sentença de primeira instância estipulava penas que, juntas, somavam mais de 143 anos, distribuídas entre sete investigados. Na decisão que anulou as condenações, o desembargador Marco Antônio Pinheiro Machado Cogan, relator do caso, ignorou provas e disse não haver elementos para afirmar que os acusados formavam uma organização criminosa.
A argumentação do magistrado usou como base uma doutrina de 2007, anterior à Lei das Organizações Criminosas (12850/2013), que delimitou o tipo penal. De acordo com o magistrado, uma organização criminosa precisaria ter, por exemplo, “níveis de atuação entre seus integrantes”, “estrutura hierárquica piramidal” e a existência de um “QG específico” — o que, para ele, não está configurado.
As condenações mantidas foram relacionadas ao crime de usura, atribuído ao suposto líder do grupo e outros dois investigados. Com as penas reduzidas, no entanto, eles foram soltos.
Ameaças
Vítimas das extorsões ouvidas pela reportagem afirmam que, mesmo quando os integrantes do grupo estavam presos, as ameaças não pararam. Eles usavam vários números de telefone para enviar mensagens, prometendo represálias violentas caso os valores não fossem pagos.
“Vira uma bola de neve, você pega de um para pagar o outro, e vai cada vez mais se afundando. Eu tive que mudar da minha casa, passar para outro endereço para poder me organizar. Mesmo assim continuam as cobranças ainda”, diz uma vítima ao Metrópoles.
“Quando eles estavam presos ainda, eram outras pessoas que cobravam. Aqueles lá que estavam presos cobravam bem pior que esses de agora. Quando eles estavam na rua as cobranças eram mais intensas. Como que solta uns caras desses, como tem cabimento um negócio desses. Não existe isso aí”, complementa.
Outra vítima que conversou com a reportagem diz viver há anos com medo de morrer. Sem dinheiro, ela passou a morar de favor na casa de um familiar.
“Eu não sei o que vai acontecer agora com esse povo solto. Eu tenho medo mesmo. Essa decisão não tem nada a ver. Hoje eu tô trabalhando para pagar os juros”, diz.
