Um projeto de lei que vai mudar as regras para o licenciamento de obras na capital paulista pode ser aprovado em breve na Câmara Municipal. É o PL 1446/2025, que quer liberar alvarás para pequenas construções na cidade sem que elas passem pela análise da Prefeitura — o chamado “licenciamento autodeclaratório” ou “autolicenciamento”.
Enviado pela gestão Ricardo Nunes (MDB) à Câmara, o projeto prevê liberar alvarás de forma automática, assim que os responsáveis pelas obras enviarem as documentações para o sistema da Prefeitura. Na prática, basta que a construtora declare que cumprirá as exigências da lei ao construir e pague as taxas para que o sistema dê o aval para a obra.
A iniciativa foi aprovada em primeira votação pelos vereadores na última quarta-feira (26/11) e há expectativa de que o texto passe pela segunda votação nos próximos dias, antes do recesso parlamentar.
O que diz o projeto
- Se for aprovado pela Câmara, o autolicenciamento valerá tanto para construções novas quanto para reformas de lugares já existentes.
- A medida será limitada a imóveis com área total máxima de até 1.500 m² — o que poderia incluir, por exemplo, prédios com três ou quatro andares em alguns bairros.
- No caso de reformas, o PL autoriza o aumento de até 50% da área construída desde que o limite total de 1.500 m² não seja ultrapassado.
- A iniciativa prevê ainda possibilidade da autodeclaração para instalação de gruas e tapumes, para a movimentação de terra, e a criação de estandes de vendas, entre outros.
- Edifícios tombados e terrenos em áreas de preservação entram na lista de exceções onde a nova regra não poderá ser aplicada.
Em setembro, Nunes já havia defendido o modelo autodeclaratório, inclusive para habitações de interesse social (HIS), sob o argumento de “desburocratizar” o licenciamento na cidade.
Atualmente, o processo de liberação de alvarás na cidade passa pela análise dos técnicos da prefeitura, que têm 120 dias para avaliar se o projeto da obra cumpre aquilo que está previsto por lei, como necessidade de recuo em relação à rua, acessibilidade, entre outros, e liberar a execução de uma obra, por exemplo.
O setor da construção diz, no entanto, que a liberação leva bem mais tempo em alguns casos.
“Um alvará de movimentação de terra pode levar mais de um ano e o alvará de avanço de tapume mais de seis meses”, diz Roberta Simeoni, diretora adjunta de Imobiliário e Licenciamento do Sindicato das Empresas da Construção Civil em São Paulo (Sinduscon-SP).
Ela defende que a mudança na lei dará mais agilidade às obras na cidade e deixará os técnicos da prefeitura concentrados na análise de projetos “de alto impacto na cidade”.
“Um técnico que está analisando, por exemplo, um alvará de movimentação de terra, poderia estar analisando um projeto de mil unidades residenciais que tenha 500 vagas de garagem, por exemplo.”
Para o professor da FGV Direito, Carlos Ari Sundfeld, o projeto pode facilitar que construções pequenas feitas sem alvará “saiam da clandestinidade” em São Paulo.
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“A maior parte das reformas em São Paulo hoje e as construções de tamanho pequeno e médio são clandestinas”, diz o advogado, especialista em administração pública. Ele afirma que a demora no processo atual, aliada a fatores como custos e complexidade dos projetos, faz com parte dos moradores deixem de solicitar os alvarás.
Para o vereador Nabil Bonduki (PT), o projeto, no entanto, tem questões que precisam ser olhadas com mais atenção em uma segunda votação na Câmara. Ele cita, por exemplo, o tamanho das construções beneficiadas. “Poderia ter isso para um tamanho menor, uma casa pequena, e não 1.500m²”, diz ele.
Outro ponto é a fiscalização para avaliar se as construções cumprirão com o previsto em lei depois da emissão automática dos alvarás.
“Vamos dizer que a pessoa apresenta um projeto numa região que pode ter um limite de gabarito [altura] de 10 metros, mas ela faz o projeto com 15 metros. A prefeitura não vai olhar. Se construir, quando estiver na quarta laje, o vizinho pode reclamar. Só que já tá em construção.”
O PL prevê que seja feitas fiscalizações “por amostragem” para identificar possíveis violações às normas, e diz que a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) poderá determinar, a qualquer momento, a “reanálise integral do projeto”.
Em casos de irregularidades, o projeto fala em suspender os alvarás emitidos, com possível anulação ou cassação dos documentos após análise, além da aplicação de multas.
O Metrópoles questionou a Prefeitura de São Paulo, que afirmou, em nota, ter reforçado nos últimos anos o quadro de fiscais de posturas municipais, atualmente com 501 profissionais, resultado de um concurso público realizado pela atual gestão em 2023, depois 21 anos na cidade.
“Desde então, 251 novos fiscais assumiram suas atividades após passarem por capacitação. O prazo de análise dos processos de alvará contemplados pelo projeto varia conforme a complexidade de cada proposta e a forma de auditoria desses processos será regulamentada após a aprovação da lei.”
