O impacto de prejuízo aos cofres do Governo do Acre poderia chegar à casa dos R$ 20 milhões. Dinheiro que, por lei, deveria ser utilizado regularmente para a compra de alimento aos alunos da rede pública estadual de ensino dos 22 municípios acreanos. Comida que representa, para muitas crianças carentes, a única refeição do dia.

Se na primeira reportagem da série “Máfia da Merenda Escolar”, você leu que servidores do setor de refeições fraudaram documentos para tentar enganar os fiscais da Controladoria Geral do Estado (CGE) e as equipes a Polícia Civil, nesta segunda reportagem serão reveladas as orientações que a ex-chefe do setor dava aos servidores temendo ser descoberta na prática dos crimes.

Em meio às licitações dispensadas, com valores milionários, à época assinados pelo ex-secretário adjunto da SEE, Márcio Mourão [exonerado na última semana sem justificativa pública], os empresários e servidores teriam forjado documentos de controle de entrada e saída das mercadorias, possibilitando pagamentos de produtos jamais distribuídos.

O portal Notícias da Hora teve acesso com exclusividade ao inquérito policial e à denúncia feita ao Poder Judiciário e ao Ministério Público, para tentar derrubar o suposto esquema que estaria causado prejuízo milionário ao Governo do Acre. As informações da polícia são didáticas e remontam a metodologia que teria sido adotada pelo grupo criminoso.

A investigação foi coordenada pelos delegados Alcino Júnior e Pedro Paulo Buzolin, da Delegacia Especializada em Combate à Corrupção (Decor) e contou com o auxílio técnico da Controladoria Geral do Estado – CGE, que já havia percebido os problemas na documentação do Departamento de Merenda Escolar e informado isso às autoridades competentes.

Segundo a termo de depoimento de uma das testemunhas, na reportagem identificada como I.S.P.N., que atuava como assistente administrativo, subordinada diretamente à gerente de merenda escolar, A.C.S.A., entregou à polícia mensagens em que a gestora do setor orientava como os subordinados a ela deveriam responder questionamentos que seriam feitos pela CGE.

A postura de A.C.S.A., segundo a polícia, demonstra que a servidora pública tinha conhecimento das práticas prejudiciais aos cofres o públicos, e juntamente com O.A.T., então coordenador de armazém, portanto chefes diretos de I.S.P.N., a testemunha. Na mensagem, datada do dia 9 de fevereiro, a gerente mandou mensagem circular aos subordinados, e para isso, utilizou o whatsapp, com o nome de cada um deles.

“No dia 09 de fevereiro de 2020, A. mandou uma mensagem pelo aplicativo whatsapp informando que a CGE estaria iniciando, no dia seguinte uma vistoria no armazém. Que A. afirmou que não precisaria se horrorizar e que, caso fizessem perguntas sobre permuta de produtos, podia responder que sim. Afirmou ainda que não havia licitação de pão e verduras para Rio Branco e Alto e baixo Acre”, falou a ex-gerente do setor.

A mensagem, que deixou os servidores do setor intimidades e temerosos com a visita anunciada dos auditores da CGE, levanta outra questão: Como a ex-gerente sabia que os auditores da controladoria iriam até o setor para fazer levantamento sobre os contratos e métodos de entrada e saída dos produtos que eram contratados e pagos com dinheiro público.

“Dentre outras informações, A. afirmou que: “as empresas que nos ajudaram de antemão foram: MM Silva e C Silva. Mas teve tbm Abreu, Alan, Fricarnes, a S Melo, Coperfarinha, Camprucsul, MJ, FP Menegassi”, lembrou ao completar: “qualquer pergunta que porventura vcs não saibam responder, joguem pra mim”, escreveu a investigada pela polícia.

As mensagens da ex-gestora do setor de merenda escolar, contudo, deixam claro que pessoas do “alto escalão” da Secretaria de Educação, Cultura e Esportes do Acre teriam conhecimento das práticas irregulares e criminosas executadas dentro do departamento, e que, nas entrelinhas, eles poderiam ficar tranquilos, pois, nada aconteceria. “Tínhamos autoriza p fazer qq transação”, alega.

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Mensagens registradas pela testemunha mostram, com todas as palavras, que a ex-gerente agia para manipular as informações que a polícia e os auditores viriam mais a frente a ouvir dos servidores do departamento

As mensagens da ex-gestora do setor de merenda escolar, contudo, deixam claro que pessoas do “alto escalão” da Secretaria de Educação, Cultura e Esportes do Acre teriam conhecimento das práticas irregulares e criminosas executadas dentro do departamento, e que, nas entrelinhas, eles poderiam ficar tranquilos, pois, nada aconteceria. “Tínhamos autoriza p fazer qq transação”, alega.

Diante do pedido de A.C.S.A., que foi realizado em um domingo, a polícia descobriu que dois assessores da ex-gerente correram em produzir documentos falsos para tentar convencer os auditores de que tudo era feito corretamente, dentro da lei. O investigado M.S.S.L. foi até a testemunha e pediu as pastas dos fornecedores com o intuito de colocar nela documentos frios.

“Ainda no dia 04 de fevereiro de 2020, o nacional M.S. foi até a depoente e pegou as pastas dos fornecedores e levou consigo. Que M.S. levou para impressora e começou a tirar cópias, justificando que iria fazer cópias para CGE (…) que a depoente tinha confeccionado os documentos de pedido e recibo de fornecedores específicos”, a mando da então chefe do setor.

Ainda de acordo com a denúncia feita pela polícia, a mando de A., “a depoente não produziu os documentos [referente a] produtos perecíveis”, e que o investigado M.S., assessor de direto da ex-gerente, “chegou a colocar vários recibos dentro das pastas de fornecedores deste tipo de gênero”, justamente as pastas que seriam verificadas pelos auditores da Controladoria.