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    “Homeschoolling”: a pandemia revela contradições

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    “Homeschoolling” ou educação domiciliar é o termo que denomina o tipo de educação formal desenvolvido em ambiente doméstico, onde os responsáveis pela criança ou professores particulares assumem a incumbência de ensinar os conteúdos curriculares de forma individualizada ou em pequenos grupos de pessoas da mesma família. Embora em muitos países essa seja uma prática comum, regulamentada e acompanhada com seriedade pelo governo, no Brasil, a busca pela adesão a tal modelo tem se fundamentado principalmente na justificativa da inadequação das escolas públicas para a educação moral das crianças. 

    Desde que se intensificou, a partir de 2015, discursos contra a escola pública e seus professores, muito se ouviu falar de pais que exigiam o direito de ensinar em casa, para que seus filhos não fossem contaminados por uma dita doutrinação política e ideológica, noção pregada principalmente por um movimento chamado “Escola Sem Partido”. Não se faz necessário dizer o quanto é absurda a ideia de que os professores, em cinquenta ou sessenta minutos de aula, tenham possibilidade de ensinar o conteúdo cobrado pelo currículo da escola, ao mesmo tempo em que cuidam do comportamento da turma e fazem propaganda de seu partido político, mas é imperioso lembrarmos que estes discursos não representam a classe trabalhadora. 

    Poderíamos dizer que de alguma forma, estamos experimentando, por força da pandemia da COVID-19 e sem muito sucesso, a educação domiciliar. Não somente em razão dos memes que circulam na internet sobre a impaciência dos pais ao ensinar seus filhos em casa, uma coisa devemos admitir: a escola faz falta. Os mesmos pais que esbravejavam a ideia de que professores recebiam salários maiores do que mereciam e não trabalhavam, e os mesmos que acreditavam que o trabalho docente era fácil, consestindo em apenas passar conteúdo enquanto seus filhos ouviam atentos e quietos, se veem incapazes de ao menos monitorar a feitura dos trabalhos que as escolas se empenham para fazer chegar aos alunos. 

    Agora, grande parte dos pais percebe que a escola não só era capaz de ensinar, como cumpria a brilhante missão de deixá-los “livres” dos filhos boa parte do dia. Agora somos capazes de enxergar que a escola pública e os professores, sempre tão atacados, são os instrumentos de que as populações menos favorecidas dispõem para buscar mudanças na estrutura social e que a maior parte da população não tem qualquer condição de abdicar da educação escolar e presencial. 

    Além disso, a falta da escola não afeta somente a paciência dos pais, mas também acirra as desigualdades, excluindo dos processos efetivos de aprendizagem aqueles que não dispõem de internet e outras ferramentas de auxílio ao acesso de aulas à distância, sem mencionar as demandas de sociabilidade não explicitadas no currículo formal e não supridas por videoaula. 

    Fiquemos em casa e lembremos da importância da escola pública e presencial. 

    Por:  Maria José Correia (formada em História – UFAC e mestranda em Educação – UFAC)

    02 de junho de 2020