O governo financiou o filme “Ainda Estou Aqui”, do bilionário Walter Salles! Usa bilhões de dinheiro público para artistas ao invés de construir hospitais! Para a direita, nutrida por uma campanha de mentiras que há décadas fustiga a lei, a Rouanet é um mecanismo para a classe artística ficar milionária tentando destruir a família, a moral e os bons costumes. Entretanto, um estudo mostra que a desigualdade de distribuição de recursos é um dos verdadeiros motivos para criticar o incentivo fiscal.
Antes de falar do levantamento, convém lembrar como a Lei nº 8.313/1991 funciona. É um instrumento que permite a empresas e pessoas físicas destinarem parte do Imposto de Renda a projetos culturais aprovados pelo Ministério da Cultura. Em outras palavras, um grupo de teatro envia o projeto para a pasta com um valor para a captação, 1 milhão de reais por exemplo. Captação autorizada, o grupo sai em busca de empresas para patrocinar o projeto.
Pois bem. A pesquisa realizada pelo Observatório Ibira 30 e pela Universidade Federal do ABC, aponta que quase 90% dos recursos da Lei Rouanet foram destinados para os bairros de Pinheiros, Bela Vista, Vila Mariana e Moema entre 2014 e 2023. No mesmo período, 21 distritos das periferias de São Paulo não receberam um centavo para projetos aprovados pela lei. Os bairros periféricos, ficaram com 1,38% dos recursos captados.
Somente o bairro de Pinheiros teve uma arrecadação 13 vezes maior do que as periferias. O bairro da zona oeste da capital paulista teve uma captação per capita de R$ 18.694. Bela Vista teve R$ 9.260, e Bom Retiro, R$ 7.478. Bairros como Cidade Tiradentes obtiveram R$ 63 e o Capão Redondo R$ 12. E mais: somente Pinheiros captou mais pela Lei Rouanet do que as regiões Norte e Nordeste somadas.
A lógica da desigualdade se explica pela lógica do mercado. Quais projetos as empresas preferem apoiar: iniciativas com artistas consagrados e com muita visibilidade ou grupos periféricos que fomentam a cultura local? Onde você acha que estão os profissionais mais experientes para elaborar o projeto para o edital ou para acessar as empresas em busca de recursos?
A pesquisa foi realizada pelo Observatório Ibira 30 e pela Universidade Federal do ABC. O observatório é ligado ao Bloco do Beco, associação cultural no Jardim Ibirapuera, sul da periferia da cidade. O trabalho sugere maior transparência e monitoramento dos dados, a revisão do modelo atual de financiamento e o fortalecimento de iniciativas culturais locais.
Esse deveria ser o debate, prevalece, porém, a desinformação, sobretudo no universo conservador. O principal tipo de fake news é sobre a destinação de verbas. Uma delas: o governo Lula destina R$ 15 bilhões em 2025 para projetos financiados pela Lei Rouanet nem 2 bi para o agro (são R$ 2,9 bilhões para a lei em 2025; só em isenções fiscais o setor recebeu R$ 158 bilhões). Ou que a Pabllo Vittar ganhou milhões para um show em uma cidade que não tem hospital.
Os conservadores, como sempre, atacam a cultura com sua pauta de costumes. Ao mesmo tempo, ignoram as muitas suspeitas de desvios nos contratos milionários de shows de artistas do sertanejo em pequenas cidades (muitas vezes pagos com emendas parlamentares). Parte da esquerda, essa festiva e rica que vive em Pinheiros, silencia e não defende mudanças na lei.