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    Briga de senador com vizinhos em SP tem ameaça e denúncia sobre gastos

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    Dono de lotes no Residencial Fazenda São Silvano, um condomínio de chácaras de alto padrão em Morungaba, no interior de São Paulo, o senador Alexandre Giordano (MDB-SP) se envolveu em uma briga com vizinhos que virou caso de polícia após relatos de ameaças,  acusações de falsidade ideológica e suspeita de favorecimento ao filho dele em um contrato para abastecimento de água.

    Loteado em 2006, o residencial é uma parte da Fazenda São Silvano e conta com 63 lotes, com metragens entre 1 mil e 3 mil m². Na área comum, há restaurante, vila hípica e chalés para visitantes. Entre os proprietários estão dirigentes de bancos, executivos de multinacionais, políticos, promotor de Justiça e até o ex-jogador Amoroso, que se destacou no São Paulo e autou pela Seleção Brasileira.

    5 imagensPortaria do Residencial Fazenda São Silvano, em Morungaba (SP).Estrada dentro do Residencial Fazenda São Silvano, em Morungaba, no interior de São Paulo.O Residencial Fazenda São Silvano tem 63 lotes de chácaras, no interior de SP.Mansão do senador foi construída ao lado dos lotes do Residencial São Silvano.Fechar modal.1 de 5

    A foto aérea mostra a Fazenda São Silvano, incluindo o Residencial, a casa do Senador Giordano, em terreno ao lado do loteamento, e o Hotel Fazenda.

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    Portaria do Residencial Fazenda São Silvano, em Morungaba (SP).

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    Estrada dentro do Residencial Fazenda São Silvano, em Morungaba, no interior de São Paulo.

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    O Residencial Fazenda São Silvano tem 63 lotes de chácaras, no interior de SP.

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    Mansão do senador foi construída ao lado dos lotes do Residencial São Silvano.

    Reprodução/Metrópoles

     

    Água seletiva

    O fornecimento de água no residencial é uma lacuna do Estado. Por se tratar de zona rural, distante de municípios desenvolvidos, o serviço da Sabesp não chega ao local. Em um processo que a associação move contra o iordano, há um pedido de danos morais no qual o advogado alega que, desde o segundo semestre de 2023, o senador fornece água e energia “de forma seletiva” aos vizinhos.

    “No caso concreto resta estampada a agressão injusta a moral da requerente que se vê desde 8 de setembro de 2023 usurpada, por não dispor de regular administração da diretoria eleita, com escassez de energia elétrica e água, de forma seletiva, em razão do descumprimento da determinação de Assembleia por parte do requerido”, escreveu o representante legal da associação.

    Segundo relatos de moradores, que não quiseram se identificar temendo represálias, no início, os lotes eram abastecidos por uma Estação de Tratamento de Água (ETA). Após o mandato de Giordano à frente da associação – o senador foi presidente entre 2020 e 2024 –, a fonte de água secou. Recentemente, o parlamentar do MDB acertou uma permuta com o condomínio.

    “Acho que o condomínio inteiro paga R$ 1 mil, R$ 900 [de água]. O condomínio inteiro, entendeu? Nem me interessa isso. Já falei para eles que não me interessa. Eu corto a água, eles compram a água de fora, nem me interessa. Eu tô fazendo um favor para eles”, disse o senador ao Metrópoles. “Na minha vida, não vai mudar nada. A deles vai mudar. Porque eles dependem da minha estrutura familiar e a gente não depende deles”, acrescentou.

    Em um e-mail anexado a processos judiciais, Breno Corrêa, que é ex-contador da gestão do senador à frente da associação do residencial, contesta a compra de caixas d’água e serviço de perfuração de poço artesiano pelo condomínio, sem aprovação em assembleia.

    Vizinhos alegam que não têm acesso à fonte de água. Giordano é dono das áreas ao redor do loteamento, onde construiu uma mansão e tem um Hotel Fazenda, cujo acesso foi beneficiado com emenda de R$ 3 milhões do senador, como revelou o Metrópoles. A associação aguarda licença da prefeitura para perfurar um poço que abasteça as casas.

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    Caso de polícia

    Os desentendimentos entre Giordano e um grupo de vizinhos virou um inquérito policial. No último dia 22/7, Breno Corrêa prestou depoimento à Polícia Civil em Campinas, no interior paulista.

    O procedimento apura crime de falsidade ideológica, a partir de uma denúncia feita por Giordano. A sede do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), que conduz a investigação, fica a menos de dois quilômetros do escritório político do senador, localizado em frente a um complexo policial.

    Breno foi tesoureiro durante a presidência de Giordano na associação e cumpriu um mandato-tampão depois de uma suposta renúncia do senador no condomínio. Há uma guerra de versões em que o senador diz que não renunciou, e usa como prova uma ata registrada no cartório de Itatiba, cidade ao lado de Morungaba. Breno apresentou outra ata, contestada pelo senador.

    “Eles montaram uma associação fake e se autotitularam uma nova associação”, disse o parlamentar ao Metrópoles.

    Em depoimento, Breno disse que “não exerceu a gestão por violento ato obstativo do Sr. Alexandre Giordano”. Ele teria sido eleito em 8 de setembro de 2023, em uma assembleia que ocorreu em uma pizzaria, fora das dependências do loteamento, e não contou com a presença de Giordano. Antes da eleição, o contador foi ao cartório em Campinas registrar e-mails e áudios que, segundo ele, provam a renúncia.

    Essa não foi a primeira contenda com Giordano no condomínio que foi parar na polícia. Em 2020, Giordano solicitou, em uma assembleia de moradores, a compra de uma área de uso comum do residencial, que contava com uma vila hípica, um restaurante e chalés para acomodar visitantes. O presidente da associação à época recusou a demanda por falta de quórum. Segundo vizinhos, Giordano se revoltou e tentou intimidá-lo — ele registrou um boletim de ocorrência contra o parlamentar.

    Depois do episódio, Giordano comprou terrenos de herdeiros do empresário que fez o loteamento e aumentou seu poder de voto. Com isso, conseguiu comprar a área comum por R$ 750 mil, em 20 parcelas, sem que antes tenha havido uma avaliação profissional do preço — estima-se que a área valia milhões.

    O preço pago por Giordano foi baseado numa atualização do valor cobrado pelo fundador do loteamento à associação. Segundo relatos, porém, o valor seria uma “camaradagem” dele.

    Contas questionadas e empresa do filho

    Com votos dos herdeiros, Giordano se tornou presidente da associação. O senador só deixou a gestão em meio a questionamentos sobre as contas do condomínio. Os vizinhos contrataram auditorias de 2022, que está anexa em processos na Justiça, e de 2023. Nenhuma conta da gestão foi aprovada.

    Um dos questionamentos é sobre os gastos em um posto de gasolina, onde o senador já usou R$ 212 mil da verba parlamentar. Uma auditoria de 2022 diz que Giordano gastou R$ 56 mil no ano no estabelecimento — em alguns dias, há compras de centenas de litros.

    A frota abastecida seria um gol e uma moto, que faziam rondas de segurança no condomínio. O senador contraria a auditoria e diz que eram seis motos, além de vários equipamentos de jardinagem que funcionam a combustível.

    Outra reclamação é a respeito de um caminhão-pipa. O condomínio pagava cerca de R$ 15 mil para a contratar a empresa do filho de Giordano e alugar o veículo que regava as plantas e lavava as ruas do residencial. Os moradores pressionaram Giordano para mostrar os contratos, mas nunca eram apresentados.

    Dias antes dele perder o mandato, a associação assinou o contrato com a empresa de seu filho, que hoje processa o residencial e cobra multa de R$ 60 mil por não pagar o aluguel do caminhão.

    “A empresa do meu filho fez [o serviço] por 15 mil porque eu pedi pra ele fazer um valor barato que o condomínio não tinha condições de pagar. Fui eu que fiz, fui eu que pedi pro meu filho”, disse o senador ao Metrópoles.

    A atual diretora da associação é alta executiva de uma montadora multinacional. Em 28 de abril do ano passado, quatro meses antes de suceder Giordano, ela confrontou o senador e questionou a necessidade do caminhão-pipa e de três lavagens por semana – algo que não precisava ser feito, por exemplo, no condomínio de alto padrão em que morava, em Alphaville, em Barueri (SP).

    Lá, ela participou de uma auditoria do condomínio e teria tantas árvores quanto o residencial em Morungaba. “Senhora, aqui é um condomínio que tem muita folha”, respondeu Giordano, segundo a ata de uma das reuniões.