MAIS

    Cortes de água já afetavam bairros antes de Sabesp reduzir pressão

    Por

    Givanildo Santos, 43 anos, cortava o cabelo de clientes em sua barbearia, na última sexta-feira (22/8), quando as torneiras do estabelecimento ficaram secas. Era mais um dia de falta d’água na Brasilândia, zona norte de São Paulo.

    “Eu tenho que ficar caçando água nos vizinhos com baldes”, conta ele, sobre como mantém o salão aberto quando episódios como aquele acontecem.

    Morador da região há 17 anos, Givanildo diz que os cortes no fornecimento de água no bairro são recorrentes, e acontecem tanto durante o dia quanto à noite. “[Por volta de] 17h30, 18h, começa a faltar [água] e só volta no dia seguinte.”

    A situação, que se repete também em outros bairros, é anterior à redução de pressão na água iniciada nesta terça-feira (29/8) pela Sabesp — e que tem como objetivo promover uma economia por causa do baixo nível nos reservatórios da região metropolitana.

    Para moradores que já enfrentam cortes de água há anos, no entanto, a redução de agora é motivo de mais preocupação.

    “Se com esse ‘fornecimento normal’ a gente já tem problema, provavelmente a gente vai passar alguns perrengues aí, futuramente”, conta o motorista escolar Gabriel Lima, de 30 anos.

    4 imagensSistema Cantareira, responsável por abastecer a Grande SPSistema Cantareira, responsável por abastecer a Grande SPSistema Cantareira abastece cerca de 7,3 milhões de pessoas por dia. Fechar modal.1 de 4

    Sistema do Cantareira

    Divulgação/Sabesp2 de 4

    Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Grande SP

    Divulgação/Sabesp3 de 4

    Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Grande SP

    Divulgação/Alesp4 de 4

    Sistema Cantareira abastece cerca de 7,3 milhões de pessoas por dia.

    Divulgação/Sabesp

    Morador do bairro Jardim Apurá, na zona sul de São Paulo, ele diz que sofre com cortes de água há pelo menos uma década. Para conseguir dar descarga à noite, Gabriel conta que improvisou uma solução. “No meu banheiro, a gente costuma deixar um balde com água ou um galão, porque, se a água acabar tem, pelo menos, como dar descarga.”

    Com uma filha de 4 anos, ele diz que o banho acaba sendo um problema nos dias em que as torneiras ficam secas “Já tive, várias vezes, que levar minha filha na casa da minha mãe porque a gente não tinha água”.

    Adriana Amorim, de 71 anos, conta que a família também tem dificuldade quando precisa tomar banho à noite. Na casa dela, no Brooklin, zona sul, todos entram no chuveiro antes das 20h para não correr o risco de sair com sabão no cabelo. Depois desse horário, segundo a aposentada, já não há mais garantia de água.

    Leia também

    “Às vezes, você passa o dia inteiro trabalhando, fazendo alguma coisa, e na hora de deitar quer tomar um banho, mas não pode. No máximo, [utiliza] lencinho umedecido”, afirma.

    Ela diz que, quando a água volta a ter pressão, o relógio de medição gira rapidamente, enquanto nas torneiras só sai ar. “Ontem, ficamos totalmente sem água à noite e hoje, quando abrimos a torneira, saiu uma enxurrada de ar”, conta ela, que diz acreditar que o problema também gera aumento na conta de água.

    6 imagensEstação da SabesbTorneira pingandoFalta de água potável é problema globalTestes com fumaça e corante buscam irregularidades nos esgotos da Baixada SantistaFechar modal.1 de 6

    Tarcísio de Freitas na B3

    Reprodução/ Governo de SP2 de 6

    Estação da Sabesb

    Governo do Estado de São Paulo3 de 6

    Sabesp/Divulgação4 de 6

    Torneira pingando

    Felipe Menezes/ Metrópoles5 de 6

    Falta de água potável é problema global

    Manish Kumar/DW6 de 6

    Testes com fumaça e corante buscam irregularidades nos esgotos da Baixada Santista

    Divulgação/Governo de SP

    Desde que começou a redução de pressão anunciada pela Sabesp, nesta semana, Adriana afirma o corte no fornecimento de água começou mais cedo.

    Na zona norte, o aposentado Roberto Gomes, 65, diz que a falta de água é uma realidade na Vila Guarani há décadas. Ele, que viu o bairro crescer, conta que o problema é recorrente em períodos de calor.

    “Sempre foi desse jeito. [Para durante a noite e] só vem água de madrugada.” O aposentado diz que a geografia da região, situada em uma área alta da cidade, dificulta o abastecimento em tempos de redução de pressão.

    “Eles falam que têm que diminuir a pressão da água porque está com problema hídrico, as represas estão baixas, o nível tá muito baixo. Agora, se diminui, a pressão só chega em lugar baixo. Em lugar alto, a água não tem força para chegar.”

    Multa Arsesp

    Em 2024, Gabriel e Adriana acionaram o gabinete da deputada federal Tabata Amaral (PSB), que levou as denúncias sobre o problema à Agência Reguladora de Serviços Públicos de São Paulo (Arsesp). Depois disso, ambos receberam uma visita de técnicos da agência que instalaram um equipamento para verificar a pressão da água no local.

    O relatório elaborado pela Arsesp, ao qual o Metrópoles teve acesso, mostrou que, nos dois casos, houve registro de pressão nula durante algum momento da medição, confirmando os relatos dos moradores.

    No início deste ano, a Arsesp publicou um documento estabelecendo diretrizes para o cumprimento do fornecimento de água em São Paulo e os procedimentos mínimos para o atendimento das reclamações de consumidores. Nos casos em que fique comprovada a existência de problemas no abastecimento, pode haver multa à companhia de água.

    Ao Metrópoles, a agência afirmou, por meio de nota, que multou a Sabesp em aproximadamente R$ 2,5 milhões em razão da intermitência no abastecimento no mês de janeiro. “As análises relativas aos meses seguintes estão em processamento e poderão resultar em novas multas, caso sejam identificadas irregularidades”, disse a nota.

    A Arsesp explicou ainda que a Sabesp passou a ser obrigada a enviar mensalmente os resultados de monitoramento à agência reguladora. Até janeiro, não havia regulamentação específica sobre o tema.

    O que diz a Sabesp

    O Metrópoles questionou a Sabesp sobre os problemas citados pelos entrevistados.

    Em nota, a Sabesp informa que a redução da pressão da água no período noturno é preventiva e temporária e atende a uma deliberação da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo), com o objetivo de reduzir perdas e evitar vazamentos, preservando, assim, os reservatórios que abastecem a região.

    Moradores que possuem caixa-d’água ou algum dispositivo de reserva devem notar menos os impactos. Residências sem caixa-d’água podem perceber essa redução no período da operação.

    “A Companhia vai monitorar e analisar a distribuição de água em toda a Região Metropolitana de São Paulo. Uma das ferramentas de registro será um formulário enviado para os clientes que entrarem em contato para fazer uma consulta ou reclamação de falta d’água. Nele, os moradores poderão informar quantas pessoas tem no domicílio, se existe caixa-d’água ou não, e qual o volume do dispositivo. Desta forma, a Companhia poderá monitorar e entender como a ação está afetando a cidade”, diz parte do comunicado.

    Ainda segundo a empresa, o caso dos endereços das ruas Santa Cruz da Conceição (Brasilândia), Ulisses Virgílio Ferrari (Jardim Apurá), Araberi (Brooklin) e Vila Guarani, os imóveis receberam visita da equipe da Sabesp na tarde desta sexta-feira (29/8), que constatou abastecimento normal.

    Já em relação à autuação aplicada pela Arsesp, o processo encontra-se em etapa de recurso administrativo. Segundo a Sabesp, “a Companhia segue dialogando com a agência para prestar os esclarecimentos necessários.”