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    Maior predador do RS: força-tarefa foi montada para ouvir vítimas

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    Desde que Ramiro Gonzaga Barros (foto em destaque), de 36 anos, considerado o maior predador sexual do Rio Grande do Sul (RS), foi preso, em janeiro deste ano, o número de vítimas violentadas não para de subir. Segundo Valeriano Garcia Neto, delegado à frente das investigações, já está comprovado que ele vitimou ao menos 217 mulheres.

    O número extenso de vítimas e a amplitude do caso fizeram com que urgisse a necessidade de montar uma força-tarefa para realizar as oitivas. Em entrevista à coluna, a escrivã de polícia Iane Colpo, que participou da linha de frente das investigações, detalhou a angústia de estar cara a cara com as vítimas —  em sua maioria adolescentes e crianças.

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    Segundo ela, a complexidade foi constatada antes mesmo do início dos depoimentos, uma vez que foi verificado que muitos dos responsáveis pelas vítimas não faziam ideia de que elas haviam sido acessadas pelo predador sexual.

    Como as vítimas foram identificadas?

    Iane explica que, ao ser preso, Ramiro também foi alvo de mandado de busca e apreensão e teve seus equipamentos eletrônicos recolhidos. “Depois que ocorreu a prisão desse indivíduo, a gente passou a fazer a análise pericial no sentido de identificar as vítimas encontradas por meio das imagens.”

    De acordo com a escrivã, o modus operandi do predador sexual facilitou os trabalhos da polícia. Ramiro mantinha em seu computador pastas organizadas com o nome de cada vítima. “Apesar disso, nem todas tinham o nome completo, então a gente se debruçou nesse trabalho de identificação e, a partir disso, as vítimas foram sendo chamadas para a delegacia”, detalha.

    A investigação, que inicialmente parecia apenas mais uma, tomou proporções inesperadas. Foram encontradas mais de 750 pastas nos eletrônicos de Ramiro.

    Diante do número alarmante, uma força-tarefa teve de ser montada para acolher e ouvir as vítimas.

    Uma equipe de mulheres

    “É importante ressaltar que todas as vítimas ou os responsáveis, são ouvidos por policiais mulheres. Inicialmente, apenas eu estava fazendo esse trabalho, e depois, devido à demanda e o número de vítimas identificadas, foi montada uma força-tarefa”, detalha.

    A delegacia de Taquara, município do RS onde o predador vivia, recebeu reforço. Dezenas de policiais mulheres foram acionadas para ir até a unidade policial, com o intuito de ter contato direto com as vítimas e familiares.

    “No caso das vítimas maiores de idade, a gente fazia contato direto com elas e tínhamos uma conversa franca. Quando eram menores, a gente tinha que falar com os pais e, muitas vezes, o contato era uma surpresa para eles, que sequer sabiam da violência”, detalha.

    A escrivã explica que a escolha por policiais mulheres partiu do princípio de que se tratava de crimes íntimos, em que elas já haviam sofrido violência, e não podiam ter suas intimidades expostas outras vez.

    “É um conteúdo sensível e, para não expor nem revitimizá-las, tivemos essa grande preocupação, porque trata-se de um assunto muito complicado e que acaba invadindo a intimidade e a privacidade, sim.”

    O trabalho tornou-se ainda mais denso porque a delegacia optou por criar um inquérito policial para cada uma das vítimas. “Cada uma representa um inquérito que está sendo feito e remetido ao Judiciário. É um trabalho complexo”, explica Iane.

    Com a colaboração das policiais, as vítimas e os responsáveis foram ouvidos pouco a pouco. A escrivã ressalta que quem esteve em contato direto com as mulheres percebe as marcas eternas que as violências causaram.

    “São danos irreversíveis para a vida delas. É muito difícil ver, em cada oitiva que a gente faz, o sofrimento que isso causou na vida de cada uma, tanto para a vítima, quanto para os familiares. Esse é um dos casos mais difíceis em que eu trabalhei, com toda certeza.”

    Busca ativa

    Ao acessar as pastas do predador sexual e descobrir a existência de mais de 700 possíveis vítimas, o Ministério Público do RS (MPRS) O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) implementou uma busca ativa para acolher e prestar apoio psicológico às vítimas já identificadas.

    As crianças e adolescentes, assim como seus responsáveis, passaram a ser procurados pelo projeto das Centrais de Atendimento às Vítimas e Familiares de Vítimas de Crimes e Atos Infracionais do Ministério Público gaúcho, que oferece espaços de acolhimento e apoio psicológico em Promotorias de Justiça de sete municípios. O atendimento ocorre à medida que os expedientes forem encaminhados ao MPRS.

    “Esse trabalho é essencial porque ressignifica o papel das vítimas no processo penal, assegurando que seus direitos sejam plenamente respeitados e que elas possam participar ativamente da busca por justiça”, explicou, à época,  a coordenadora do Centro de Apoio Operacional Criminal e de Acolhimento às Vítimas, Alessandra Moura Bastian da Cunha.