P – O ministro Aldo Rebelo disse que a crise é um problema de um partido, o PT, e não do governo. Essa justificativa convence?
COLLOR – No momento em que ele disse isso, a afirmação era completamente verdadeira. É uma coisa lógica. O alvo da acusação não é membro do governo, é membro de um partido. Mas no momento seguinte pode-se chegar à conclusão de que essa pessoa é de um partido que tem 19 ministérios.
P – Assim como o senhor, o presidente Lula tem um vice mineiro. Numa crise como a atual, o vice joga com ou contra o presidente?
COLLOR – Eu tenho uma regra em relação a vices, que deixo como sugestão. É melhor não sê-lo, não tê-lo e se possível nem vê-lo. Agora, no caso do Lula, ele tem sorte. Embora nossos dois vices sejam mineiros, eles se diferenciam no caráter. Não acredito que o José Alencar seja capaz de participar de um golpe como fez o Itamar Franco.
P – Como assim?
COLLOR – O plano inicial das pessoas que articularam o meu impeachment era colocar o Ulysses Guimarães no poder. Os parlamentares achavam que o Itamar também renunciaria. Como ele não renunciou, o plano fracassou.
P – Como o senhor avalia a declaração do candidato Anthony Garotinho, que disse que “Collor caiu por menos”?
COLLOR – Não concordo nem discordo. Isso é opinião dele.
P – E quanto à declaração do governador Aécio Neves, que disse que “Lula não é Collor”?
COLLOR – Ele devia estar em êxtase, depois do seu habitual proselitismo lisérgico.
P – Que lições o Brasil tira desse episódio?
COLLOR – O cenário político atual suscita uma nova discussão, que é a absoluta necessidade de uma reforma política. Quando nós decidirmos realizar uma reforma de fundo, esses problemas deixarão de existir.
P – Como seria essa reforma?
COLLOR – O Brasil precisa de um parlamentarismo, de uma melhor representação popular pela via do voto distrital, da fidelidade partidária e de uma burocracia profissionalizada, que não venha a ser mexida em cada mudança de governo.
P – O governo dispõe de 20 mil cargos para distribuir.
COLLOR – Isso é um absurdo e é uma das raízes da crise.
P – A questão dos cargos não irá afetar o Sílvio Pereira, do PT, e o ministro José Dirceu?
COLLOR – Não importa o Sílvio Pereira, o José Dirceu, o Zé dos Grudes ou o Manoel da Granja. Eles estão apenas dando consequências às regras estabelecidas, que foram consensualmente aceitas por esse nosso sistema de governo anacrônico. Os cargos estão aí para serem distribuídos. E eles estão fazendo o que as regras do jogo determinam. As regras são erradas. A corrupção só acaba quando você fecha as torneiras por onde a corrupção pode vazar.
(Publicado aqui em 18 de setembro de 2005. Collor, hoje, vinte anos depois, condenado por corrupção pelo Supremo Tribunal Federal, cumpre pena em prisão domiciliar.)