Dois barões do setor de combustível no país, Mohamad Mourad (à direita na foto em destaque) e Ricardo Magro (à esquerda) foram alvos de diferentes operações policiais que indicam a atuação de ambos em esquemas semelhantes que envolvem sonegação fiscal, lavagem de dinheiro por meio de fintechs e fundos de investimentos da Faria Lima e elos com o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Mourad foi o principal alvo das operações Carbono Oculto, do Ministério Público de São Paulo (MPSP), e Tank, da Polícia Federal (PF), deflagradas na semana passada contra fraudes bilionárias no setor. Apontado como “epicentro” do esquema, ele está por trás da formuladora Copape e da distribuidora Aster, alvo das investigações, e escapou de um mandado de prisão — é considerado foragido.
Principal rival de Mourad no mercado de combustíveis, Ricardo Magro é o controlador do grupo da Refit (antiga refinaria de Manguinhos). Segundo o MPSP, ele teria substituído a Copape no esquema criminoso por meio da Rodopetro, o que Magro nega. Os dois grupos passaram a dominar nos últimos anos o setor de postos de bandeira branca, que não têm vínculo com grandes distribuidoras e estão frequentemente na mira das autoridades por adulteração de combustível e conexões criminosas.
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Operação Carbono Oculto
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Operação Carbono Oculto
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Megaoperação cumpre mandados contra esquema em postos de combustíveis e fintechs controlados pelo PCC
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Megaoperação cumpre mandados contra esquema em postos de combustíveis e fintechs controlados pelo PCC
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Cerca de 1 mil postos movimentaram R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024
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A megaoperação descobriu que pelo menos 40 fundos de investimentos foram utilizados como estruturas para ocultação de patrimônio
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São cumpridos cerca de 350 mandados de busca e apreensão a pessoas físicas e jurídicas em oito estados pelo país
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Operações financeiras por meio de fintechs dificultavam o rastreamento dos valores que eram transacionados
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Foram sonegados mais de R$ 7,6 bilhões em impostos, segundo a megaoperação
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Proprietários dos postos de combustíveis venderam seus estabelecimentos ao grupo criminoso e eram ameaçados de morte caso fizessem alguma cobrança
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Há indícios de que lojas de conveniência e padarias também parcipavam do esquema
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Operação contra Magro
Em dezembro de 2024, Magro já era investigado pela Polícia Civil paulista por suspeita de sonegar ICMS em São Paulo, em um esquema que incluía trazer combustível mais barato de outros estados, além de lavar dinheiro e blindar patrimônio contra confisco judicial. Controlado por ele, o grupo Refit é o líder do ranking de devedores do estado de São Paulo — são R$ 8,5 bilhões em dívidas. Para cometer crimes fiscais, segundo a apuração, o grupo de Magro usaria 188 empresas de fachada.
Inicialmente, o empresário não era alvo da apuração, que começou a partir da apreensão de um caminhão carregado de cocaína pertencente a uma transportadora da Bahia. Pessoas ligadas à empresa responsável faziam depósitos frequentes na conta de um frentista de posto na Marginal Tietê, em nome de um empresário próximo de Vinicius Gritzbach, o delator do PCC que acabou assassinado no Aeroporto de Guarulhos, no fim de 2024. No estabelecimento, a polícia encontrou balões coloridos espalhados, prática que, segundo investigadores, é usada para identificar postos controlados pela facção criminosa.
O que colocou Magro na mira da polícia foi a apreensão de notas fiscais emitidas pela Fera Lubrificantes, empresa que seria ligada a Magro, segundo a polícia. Em uma nova etapa da apuração, diversos endereços ligados ao empresário foram alvos de mandados de busca e apreensão. A investigação apontou ainda que as financeiras Yield e Alpha Financial recebiam pagamentos que deveriam ser destinados à Fera, funcionando como intermediárias do esquema.
Na ocasião, Magro negou a sonegação e disse que “é de se estranhar também os interesses comerciais de concorrentes que agora dizem abastecer investigações supostamente isentas”. Na mais recente operação do MPSP, a Refit não é alvo.
Outro caminhão parado
A operação Carbono Oculto, que mirou o grupo de Mourad e detectou 40 fundos de investimentos controlados pelo PCC, teve início com a interceptação de um caminhão-pipa. Em 14 de maio de 2023, em Guarulhos, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) apreendeu um carregamento de metanol, álcool industrial usado na produção química e de biodiesel. O produto deveria seguir para empresas em Mato Grosso, mas era desviado para postos da Grande São Paulo, onde era usado na adulteração de combustíveis.
A investigação revelou um complexo esquema que envolvia toda a cadeia: da importação, produção e distribuição até a lavagem de dinheiro, feita por meio de fintechs e fundos de investimento. Segundo a Receita Federal, uma rede de 1.200 postos movimentou R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024, mas recolheu apenas R$ 90 milhões em impostos — 0,17% do valor. Para disfarçar o dinheiro ilícito, o grupo teria usado 40 fundos, com patrimônio de R$ 30 bilhões, geridos por operadores da Faria Lima.
Diversos alvos da operação são apontados como suspeitos de ligações com o PCC, além de um grupo de postos de gasolina: a rede Boxter. Além de Mourad, outro alvo da operação foi Roberto Augusto Leme da Silva, o “Beto Louco”, também ligado à Aster e à Copape. A reportagem não localizou a defesa de Mohamad e de Roberto Augusto. O espaço segue aberto para manifestação.
Sucessão
Embora não seja investigada no caso, o grupo Refit também foi citado na investigação. Segundo o MPSP, quando a formuladora Copape e a distribuidora Aster tiveram suas licenças cassadas pelas Agência Nacional de Petróleo (ANP), em julho de 2024, a Rodopetro “sucedeu as atividades” do grupo de Mourad e “se tornou o epicentro da nova dinâmica de distribuição de combustíveis”.
“A Rodopetro praticamente dobrou suas aquisições para englobar as operações do grupo Aster/Copape. A substituição do Grupo Copape/Aster pelo Grupo Manguinhos [Refit], com a Rodopetro centralizando a distribuição, é vista como uma nova camada de ocultação para burlar as proibições impostas à Copape e à Aster”, afirma o MPSP no pedido de buscas e apreensões contra o grupo de Mourad. A Refit não foi alvo da operação.
Por meio de nota, a Refit afirma que “não tem qualquer vínculo com os investigados” e que “as acusações de que a companhia teria ocupado o espaço da Copape não se sustentam”.